Semeando o Evangelho

Semear a Verdade e o Amor de Deus
quarta-feira, 5 de abril de 2017
REGENERAÇÃO
Por Flávio Santos
1 Pedro 1.3-5
Deus deve ser adorado e louvado pelo fato de ter regenerado o homem. Bendito seja o Pai que entregou o Filho para morrer. Bendito seja o Deus que entregou o Cristo para cumprir sua missão messiânica na cruz do calvário. Essa doxologia acontece quando o homem entende que foi regenerado na morte do Deus Filho. Glória ao Pai, ao Filho e ao Espírito Santo que operaram a nossa regeneração.
A Regeneração ou novo nascimento acontece segundo a misericórdia de Deus. Grande misericórdia. Dentro dos atributos do ser de Deus, a misericórdia é um dos aspectos da bondade de Deus. Quando Deus enxerga o homem afastado da glória Dele, sabe que precisa de socorro divino. Esse socorro acontece pela misericórdia. Como o homem está no pecado e precisando nascer de novo, a misericórdia é concedida independente dos méritos humanos.
O propósito da regeneração é uma esperança viva. Ou seja, como Cristo Jesus ressuscitou dentre os mortos com um corpo de glória. Sendo Ele as primícias. Os que nasceram de novo devem manter a esperança viva, pois ressuscitarão no último dia com o corpo glorificado. Semelhantes ao de Jesus. Quando somos regenerados nos tornamos semelhantes ao Jesus terreno. Quando ressuscitados seremos semelhantes ao Jesus glorificado.
Quando a herança viva se tornar realidade, o regenerado vai receber uma herança que não perece, macula-se ou perde o valor. Ela é assim porque não é terrena. É um tesouro do céu. A eternidade deixa as coisas mais valiosas e verdadeiras. A expectativa do regenerado o faz ser um herdeiro de Deus e co-herdeiro com Cristo Jesus para as bem-aventuranças da eternidade.
Duas coisas acontecem quando o Espírito Santo gera novo nascimento no coração do pecador. Arrependimento e fé. O homem se arrepende dos seus pecados e pela fé se apropria dos benefícios da cruz. Segundo Pedro, a fé, também, é o meio pelo qual o regenerado é preservado pelo poder de Deus. É protegido até a revelação da salvação. Esta verdade traz segurança ao regenerado. Sua salvação não está baseada no poder dos homens, mas no poder de Deus. Aquele que Deus protege pelo seu poder não perde a sua regeneração. Vai perseverar e ser preservado por Deus até o fim.
Portanto, a regeneração é um chamado para a adoração a Deus, para a expectativa do céu e para a segurança da salvação. Com isso, o regenerado, é um cidadão dos céus, disperso na terra. Está disperso para servir a Deus e ao mundo. Anunciando ao mundo que os homens precisam de regeneração. Devemos trabalhar então à nossa regeneração com temor e tremor.
1 Pedro 1.3-5
Deus deve ser adorado e louvado pelo fato de ter regenerado o homem. Bendito seja o Pai que entregou o Filho para morrer. Bendito seja o Deus que entregou o Cristo para cumprir sua missão messiânica na cruz do calvário. Essa doxologia acontece quando o homem entende que foi regenerado na morte do Deus Filho. Glória ao Pai, ao Filho e ao Espírito Santo que operaram a nossa regeneração.
A Regeneração ou novo nascimento acontece segundo a misericórdia de Deus. Grande misericórdia. Dentro dos atributos do ser de Deus, a misericórdia é um dos aspectos da bondade de Deus. Quando Deus enxerga o homem afastado da glória Dele, sabe que precisa de socorro divino. Esse socorro acontece pela misericórdia. Como o homem está no pecado e precisando nascer de novo, a misericórdia é concedida independente dos méritos humanos.
O propósito da regeneração é uma esperança viva. Ou seja, como Cristo Jesus ressuscitou dentre os mortos com um corpo de glória. Sendo Ele as primícias. Os que nasceram de novo devem manter a esperança viva, pois ressuscitarão no último dia com o corpo glorificado. Semelhantes ao de Jesus. Quando somos regenerados nos tornamos semelhantes ao Jesus terreno. Quando ressuscitados seremos semelhantes ao Jesus glorificado.
Quando a herança viva se tornar realidade, o regenerado vai receber uma herança que não perece, macula-se ou perde o valor. Ela é assim porque não é terrena. É um tesouro do céu. A eternidade deixa as coisas mais valiosas e verdadeiras. A expectativa do regenerado o faz ser um herdeiro de Deus e co-herdeiro com Cristo Jesus para as bem-aventuranças da eternidade.
Duas coisas acontecem quando o Espírito Santo gera novo nascimento no coração do pecador. Arrependimento e fé. O homem se arrepende dos seus pecados e pela fé se apropria dos benefícios da cruz. Segundo Pedro, a fé, também, é o meio pelo qual o regenerado é preservado pelo poder de Deus. É protegido até a revelação da salvação. Esta verdade traz segurança ao regenerado. Sua salvação não está baseada no poder dos homens, mas no poder de Deus. Aquele que Deus protege pelo seu poder não perde a sua regeneração. Vai perseverar e ser preservado por Deus até o fim.
Portanto, a regeneração é um chamado para a adoração a Deus, para a expectativa do céu e para a segurança da salvação. Com isso, o regenerado, é um cidadão dos céus, disperso na terra. Está disperso para servir a Deus e ao mundo. Anunciando ao mundo que os homens precisam de regeneração. Devemos trabalhar então à nossa regeneração com temor e tremor.
GRAÇA QUE ENSINA
O “legalismo” se tornou para todos os fins uma réplica evangélica a qualquer menção de santidade, obediência, ou boas obras. Eu não quero ser um legalista. Eu odeio o legalismo. Odeio cada expressão de legalismo. O legalismo, conforme definido em Gálatas 5:1, é o erro de abandonar nossa liberdade em Cristo, a fim de assumir um jugo de escravidão legal. Para o legalista, as boas obras são necessárias para ganhar o favor de Deus. (Ainda que Deus requeira e se agrade da prática das boas obras, realmente não é por meio delas que obtivemos ou continuaremos obtendo o seu favor, senão por causa exclusivamente de Jesus Cristo e de tudo o que fez por nós, para a nossa expiação, aceitação, reconciliação, justificação, redenção, santificação e glorificação – como poderíamos receber estas realidades espirituais por meio de nossas obras? – nota do tradutor.)
Eu não tenho qualquer simpatia pela ideia de que aqueles que acreditam que a pessoa com a consciência mais sincera (ou a escola bíblica com as regras mais rigorosas) deveriam definir para nós o que seja a santidade. Estou muito feliz de deixar a Escritura definir os parâmetros da santificação. E onde a Bíblia é silenciosa, eu acho que deveria ser, também.
Então, eu deploro a cada pitada de legalismo, e quero deixar isso claro.
Mas, também enfaticamente desprezo a tendência evangélica comum de considerar como “legalista” todas as chamadas para a obediência e para cada convocação à santidade. Como se a graça fosse uma punição por causa de desobediência e imoralidade. Como se o evangelho nos desse licença para “Permaneceremos no pecado, para que a graça aumente.” Ele nunca pode ser isto! Como morreríamos para o pecado ainda vivendo nele?”
Agora, a linha de demarcação entre o Evangelho e a lei é absolutamente vital, e você nunca vai me ouvir dizer o contrário. Um dos grandes avanços da Reforma Protestante veio na forma como Martinho Lutero salientou a distinção entre lei e evangelho. A lei não é evangelho e vice-versa. Eu aprecio os que trabalham para diferenciar entre os dois. Não há praticamente nenhuma distinção teológica mais importante.
E deixe-me dizer isto mais uma vez, com ênfase: Confundir a lei e o evangelho não é um pequeno erro. É um erro fácil de se cometer, e vamos ser francos: parece haver algo no coração humano caído que nos torna propensos a esse erro. É o erro que está no cerne de todo o tipo de legalismo. Eu acho que há uma tendência de cada mente humana caída para o padrão para o legalismo, e é certo que devemos resistir a essa tendência. Não há nenhum erro mais mortal em toda a teologia. Algumas das palavras mais fortes de condenação em qualquer lugar do Novo Testamento foram destinadas a quem suplantou as promessas do evangelho com exigências legais (Gálatas 1:6-9).
Então estamos claros sobre isso? Eu odeio o legalismo com uma paixão santa.
No entanto, é um erro grave (também condenado em termos muito fortes pelo apóstolo Paulo) imaginar que o evangelho não concorda com o padrão moral estabelecido pela lei; que a justificação pela fé, elimina a necessidade de obediência, ou que a liberdade perfeita da graça de Deus dá a licença para uma vida não santa. As boas obras, obediência aos mandamentos de Cristo, e encorajamentos e admoestações para sermos santos são aspectos necessários da vida cristã. Não necessariamente (na forma como o legalista sugere) para ganhar o favor de Deus. Na verdade, nossas obras são inúteis, totalmente impotentes, para esse fim. Mas a obediência é uma expressão natural e inevitável e essencial do amor a Cristo e gratidão por Sua graça. Esta é a lição prática principal que podemos aprender com o princípio da graça: a graça nos compele ao amor e às boas obras. A graça nos constrange a renunciar ao pecado e a buscar a justiça.
Veja: O evangelho é mais excelente do que a lei, mas os dois não discordam. O evangelho nos liberta da condenação da lei, mas não nos dispensa do padrão moral estabelecido pela lei. Ou, para dizer de outra forma: o princípio da sola fide – justificação somente pela fé – não é hostil às boas obras. O evangelho coloca as boas obras no seu devido lugar, mas se entendermos corretamente o princípio da sola fide, seremos zelosos de boas obras; em busca sincera da santidade, e ansiosos para obedecer aos mandamentos de nosso Senhor. Não precisamos ser nem um pouco hesitantes em “estimularmos um ao outro ao amor e às boas obras.”
E isso é o que vamos ver na passagem que estamos meditando nesta hora – Tito 2:11-15. Lendo este texto, que lições podemos aprender com uma compreensão bíblica do princípio da graça? Qual é a graça afirmada que deve nos ensinar? Em toda a nossa conversa sobre ser saturado de graça, com foco no evangelho, o ministério centrado em Cristo, será que realmente temos entendido a “graça” corretamente, ou temos inadvertidamente caído no mesmo passo de “homens ímpios, que transformam a graça de nosso Deus em libertinagem?” E se nós, como pastores, temos feito um bom trabalho em instruir o nosso povo nas verdadeiras lições da graça?
Agora, aqui está a nossa passagem (Tito 2:11-15):
11 Porquanto a graça de Deus se manifestou salvadora a todos os homens,
12 educando-nos para que, renegadas a impiedade e as paixões mundanas, vivamos, no presente século, sensata, justa e piedosamente,
13 aguardando a bendita esperança e a manifestação da glória do nosso grande Deus e Salvador Cristo Jesus,
14 o qual a si mesmo se deu por nós, a fim de remir-nos de toda iniqüidade e purificar, para si mesmo, um povo exclusivamente seu, zeloso de boas obras.
15 Dize estas coisas; exorta e repreende também com toda a autoridade. Ninguém te despreze.
Vamos começar com uma palavra sobre o contexto e as circunstâncias que levaram a esta epístola. Paulo está escrevendo a Tito, a quem ele “deixou… em Creta, para que Tito colocasse em ordem o que ainda era necessário e constituísse presbíteros em cada cidade” (1:5). Então Tito está treinando e designando líderes para as igrejas em Creta. E Paulo envia a Tito uma pequena lista de qualificações para os homens que ele deveria nomear anciãos nas igrejas. É essencialmente idêntica à lista dada em 1 Timóteo 3. O princípio central, certamente, é o de que os líderes da igreja são “mordomos de Deus” e, portanto, devem ser moralmente e de reputação “irrepreensível”. Paulo reitera a mesma expressão duas vezes, no início de sua lista, em 1:6 e novamente no versículo 7.
Ele segue com uma lista de especificações que definem o significado de ser “irrepreensível”. Notem que exceto para a habilidade de ensinar (que é um dom que é absolutamente necessário para cumprir o chamado de um ancião) os requisitos apresentados por Paulo não se referem a habilidades e talentos. Eles são qualidades de caráter. E todos eles têm a ver com a maturidade, domínio próprio e retidão moral.
Este é o tipo de homem que está qualificado para liderar a igreja. Ele não é um palhaço ou um comediante. Não é alguém com potencial para ser uma celebridade, um futurista, um inovador, e palestrante motivacional. O tipo de pessoa que Tito deveria nomear para a liderança não era alguém com um enorme ego e um dom para ser simplista. Não há nada aqui sobre capacidade artística, graus de aprendizagem, exatidão política, visão de negócios, estilo de roupa, inteligência e criatividade, ou o seu conhecimento da cultura popular Nenhuma das coisas que as igrejas de hoje tendem a pesar quando à procura de um pastor.
Mas os anciãos que Tito deveria treinar e ordenar simplesmente precisavam ser, santos, homens disciplinados, maduros, capazes de lidar com a Palavra de Deus com precisão e ensinar suas verdades para os outros. Não jovens, e culturalmente esclarecidos, mas homens de Deus que são totalmente maduros e firmes.
Se você entender o que Paulo está dizendo aqui e compará-lo com a cultura evangélica do século 21, isto deveria causar um pouco de dissonância cognitiva. A estratégia que Paulo está dizendo a Timóteo para usar no trabalho de plantação de igrejas nada tem a ver como as organizações de plantação de igrejas de hoje dizem ser necessário.
Eu não posso imaginar que Tito leu esta carta e levou Paulo a dizer que ele precisava para começar a dar aulas de contextualização, patrocinando seminários sobre sexo, gerindo simpósios sobre inovação e marketing da igreja, ou oferecendo cursos sobre liderança valendo-se das obras mais recentes escritas sobre o assunto por autores renomados, que vão na contramão de tudo o que o apóstolo ensinou.
E (eu sei que isso é um pouco de digressão, mas) eu quero dizer isto claramente: As maiores ameaças para o evangelho de hoje não são as políticas do governo que prejudicam os nossos valores, e nem crenças seculares que atacam nossas confissões de fé, nem mesmo ateus que negam nosso Deus. Os maiores inimigos do evangelho de hoje são igrejas mundanas e pastores mercenários que banalizam o Cristianismo.
E isso não é um problema novo. Isto era verdade mesmo nos tempos apostólicos – em muitas igrejas primitivas. Em Filipenses 3:18-19, o apóstolo Paulo escreveu: “Porque muitos há, dos quais muitas vezes eu vos disse, e agora vos digo até chorando, que são inimigos da cruz de Cristo.” Uma das principais características que Paulo destacou desses inimigos da cruz – inimigos da autêntica graça, era que eles “tinham suas mentes nas coisas terrenas.” Eles “pervertiam a graça de nosso Deus em sensualidade.” Eles misturaram a ideia de liberdade cristã com uma oportunidade para satisfazer a carne. Eles “usaram a liberdade como um disfarce (cobertura) para o mal.” No processo, eles banalizaram a cruz, corromperam a idéia da graça, e perverteram o evangelho.
E aqui no nosso texto, Paulo emprega o princípio da própria graça para refutar tal banalizada, mundana, noção de uma religião sem lei. Ele diz que as verdadeiras lições que aprendemos com a graça haviam fugido em face de tudo o que é superficial e mundano, injusto, desobediente.
Por uma questão de fato, Paulo está advertindo Tito a não ceder às tendências da cultura cretense secular. Capítulo 1, versículo 12: “Os cretenses são sempre mentirosos, bestas ruins, ventres preguiçosos.” Isso provavelmente não era uma coisa politicamente correta para ser dita, mas mesmo assim, Paulo acrescenta enfaticamente: “Este testemunho é verdadeiro. Portanto, repreende-os severamente, para que sejam sãos na fé.” Ele estava dizendo a Tito que a igreja deve ser contra-cultural, resistente aos males e falhas de caráter da sociedade secular. Os líderes da Igreja não devem ser obcecados com ganhar elogios e admiração do mundo.
Em vez disso, Paulo diz (2:1): “ensina o que está de acordo com a sã doutrina,” e ele passa a dar uma série de mandamentos para categorias específicas de pessoas na igreja: “anciãos” (v. 2). “As mulheres mais velhas da mesma maneira” (v. 3). “As mulheres jovens” (v. 4). “Os homens mais jovens” (v. 6). “Escravos” (v. 9). E a Tito como o pastor missionário de plantação de igrejas é dada uma diretriz em particular: “Em todos os aspectos … seja um modelo de boas obras” (v. 7), especialmente por causa dos jovens que representam os futuros líderes na igreja .
Agora, observe que o versículo 1 fala de “o que está de acordo com a sã doutrina”, e, em seguida, Paulo passa a relacionar uma pequena lista de coisas que nós provavelmente rotulamos de “deveres práticos” mais do que os tipos de coisas que deveríamos designar como “verdades doutrinárias”. Veja, um dos principais pontos de Paulo aqui é que ele não quer que Tito gaste todo o seu tempo ensinando doutrina como teoria, concentrando-se apenas no conteúdo objetivo bíblico, histórico e teológico à custa de exortar a igreja à obediência e à santidade prática. E vamos ser honestos: isso é uma falha peculiar em algumas de nossas igrejas reformadas e calvinistas. Adotamos uma abordagem didática que é pesada em material relativo à verdade e à doutrina objetiva – algumas vezes, sem nunca abordar qualquer tipo de exortação prática.
O ponto de Paulo é que os deveres práticos vitais de santidade e obediência estão em perfeito “acordo com a sã doutrina.” As chamadas para a obediência e exortações à virtude não são incompatíveis com as doutrinas da graça, e muito menos estão em oposição à graça. Nas palavras do versículo 10, o que Paulo definiu neste capítulo são as ações e qualidades de caráter que “adornam a doutrina de Deus, nosso Salvador “.
Em outras palavras (se você me permite citar a versão bíblica NIV), estas são coisas que “vão tornar o ensino sobre Deus, nosso Salvador atraente”, e não” atraente” no sentido de que elas tornariam a mensagem numa estória que agrade o mundo. O evangelho ainda é “um escândalo para os judeus e loucura para os gentios.” Cristo ainda é “uma pedra de tropeço e rocha de escândalo”. Sua advertência em João 15:18-20 ainda é válida: “Se o mundo vos odeia, sabei que antes odiou a mim. Se vós fôsseis do mundo, o mundo amaria o que era seu, mas porque não sois do mundo, porque eu vos escolhi do mundo, por isso o mundo vos odeia. Um servo não é maior do que seu senhor. Se eles me perseguiram, também vos perseguirão a vós.” Assim também, nas palavras de 1 João 3:13: “Não se surpreendam irmãos, que o mundo vos odeie.” Você não pode mudar isso e ser fiel. Pare de tanto se esforçar para ganhar a afeição do mundo.
E, no entanto, a virtude autêntica é atraente no sentido de que capta a atenção do mundo e dá à nossa mensagem uma medida de inegável credibilidade. Nesse sentido, o cultivo da virtude básica é mil vezes mais atraente do que qualquer marca atualmente popular do evangelismo elegante, da moderna religião, ou da contextualização pós-moderna.
Essa é a estratégia do apóstolo Paulo para se chegar a uma cultura hostil. E o que me intriga é como ele usa o princípio da graça para fazer seu ponto. Em contraste com aqueles que transformam a graça em libertinagem, Paulo diz que o princípio bíblico da graça nos ensina algo completamente diferente.
Na verdade, eu vejo três lições distintas que Paulo afirma que podemos aprender com a graça. Todas elas têm a ver com a forma como vivemos (em outras palavras, elas são práticas, não lições teóricas). Todas as três lições nos dão instruções e incentivos para a vida reta e obediência ao senhorio de Cristo. Isso, diz Paulo, é o que a graça deve produzir, não uma atitude negligente sobre a virtude e o vício, não uma aceitação casual dos valores mundanos, mas exatamente o oposto. O fruto verdadeiro da graça divina é uma vida santa.
A graça nos ensina três lições nos versículos 12 e 13, mas antes de nos concentrarmos nesses dois versos, preste atenção na estrutura da passagem maior, começando no versículo 11. Você notou as duas ocorrências da palavra “aparecer”? Versículo 11: “Porque a graça de Deus se manifestou.” Versículo 13: Nós estamos “esperando … o aparecimento de … Jesus Cristo.” É o mesmo texto básico no original grego. A palavra no versículo 11 é a forma verbal (para aparecer) e a palavra no versículo 13 é a forma substantiva (aparência); e a palavra grega tem a conotação de brilho (literalmente, “brilhar” ou “ser trazido à luz”).
E essas duas palavras apontam para os dois adventos de Jesus Cristo.
Versículo 11: “a graça de Deus se manifestou.” Como, especificamente? Na encarnação e ministério de Cristo. “Porque a lei foi dada por meio de Moisés, a graça e a verdade vieram por Jesus Cristo.”, João 1:7 , e eu acho que é importante ressaltar o que João quis dizer quando escreveu isso. Ele não estava sugerindo, é claro, que a Velha Aliança era desprovida de graça. Ele não estava dizendo que a graça é algo novo que Cristo introduziu no seu primeiro advento. Ele simplesmente quer dizer que Cristo é a própria encarnação da graça divina. Moisés, por um lado, foi o legislador, Jesus, por outro lado, é a fonte e o representante vivo da graça de Deus. A lei foi a característica dominante da aliança mosaica, a graça e a verdade são as características dominantes da Nova Aliança. João 1:14: “E o Verbo se fez carne e habitou entre nós, e vimos a sua glória, glória como do unigênito Filho do Pai, cheio de graça e de verdade.” (João 1:14). Moisés era o representante e instrumento através do qual a lei foi escrita em tábuas de pedra. Cristo é a pessoa em quem a graça e a verdade estão encarnados. Mas Moisés e Cristo não são adversários. Muito pelo contrário. Cristo veio como o cumprimento de tudo o que Moisés jamais escreveu.
E isso inclui a lei. A graça cumpre a lei, não a derruba. O próprio Jesus disse isso no início de Seu Sermão da Montanha (Mateus 5:17): “Não penseis que vim revogar a Lei ou os profetas: não vim revogar, mas cumprir.”
Assim a graça “apareceu” de uma forma única e definitiva através da encarnação e obra expiatória de Cristo. Paulo se refere a isso novamente em Tito 3:4-5: “Quando, porém, se manifestou a benignidade de Deus, nosso Salvador, e o seu amor para com todos, não por obras de justiça praticadas por nós, mas segundo sua misericórdia, ele nos salvou mediante o lavar regenerador e renovador do Espírito Santo,”.
A palavra “aparecer” – manifestação – em Tito 2:13, certamente, é uma referência à segunda vinda de Cristo: “aguardando a bendita esperança e a manifestação da glória do nosso grande Deus e Salvador Cristo Jesus,”. Agora, nós não temos tempo para entrar em detalhes sobre isso, mas a maneira como Paulo emprega as palavras nesta declaração é instrutiva. Esta é uma referência a uma pessoa, não duas. “Nosso grande Deus e Salvador, Cristo Jesus”. É uma afirmação da divindade de Cristo, e é um paralelo exato com a expressão encontrada no final do versículo 10: “Deus, nosso Salvador.” Jesus Cristo é o nosso Deus e nosso Salvador. É Sua manifestação em glória que esperamos.
Enquanto isso, vivemos entre esses dois adventos – as duas “aparições”. No final do versículo 12, Paulo se refere ao período de tempo entre as duas aparições como “o presente século”. Assim, ele nos aponta para o passado, quando “a graça de Deus … apareceu.” Ele quer que vivamos “no século atual” – exemplificando as virtudes da graça no aqui e agora. E ele quer que a gente fique de olho na expectativa sobre o futuro, à medida que ” aguardando a bendita esperança “, o retorno de Deus, nosso Salvador, em Seu esplendor completo – que será a culminação final tanto da graça quanto da glória.
Em outras palavras, existem dimensões passadas, presentes e futuras da graça, e a presente dimensão é o foco principal de nosso texto. Enquanto vivemos entre estes dois adventos, a graça nos leva para a escola. Este “presente século” é a escola da graça. E eu vejo três lições principais que a graça nos ensina. Elas todas são lições difíceis, porque são contrárias às tendências naturais da nossa carne caída, e nós temos que guardar e reaprender essas lições diariamente. Mas aqui estão elas. Lição número 1. A graça nos ensina:
1. A repudiar as obras da carne
Versos 11-12: “Porquanto a graça de Deus se manifestou salvadora a todos os homens, educando-nos para que, renegadas a impiedade e as paixões mundanas, vivamos, no presente século, sensata, justa e piedosamente,”. Agora, eu preciso comentar o versículo 11, mas nós não podemos permanecer lá. Obviamente, este texto não está dizendo que a graça traz a salvação para todas as pessoas, porque Jesus ensinou repetida e expressamente que “larga é a porta e espaçoso o caminho que conduz à perdição, e aqueles que entram por ela são muitos.” (Mateus 7:13). Descrições do julgamento final de Jesus sempre incluem avisos urgentes que muitos naquele dia ouvirão: “Apartai-vos de mim, malditos, para o fogo eterno, preparado para o diabo e seus anjos.”
Então Tito 2:11 , não está ensinando uma doutrina de salvação universal. Observe a conjunção “Para” no início do verso. Vincula a declaração a que a precedeu – e isto é uma longa lista de categorias de pessoas – “Os homens mais velhos … mulheres mais velhas … mulheres jovens … homens mais jovens … e escravos.” “Porque a graça de Deus se manifestou, trazendo salvação para todos os tipos de pessoas, todas as pessoas: homens velhos, mulheres velhas, jovens, homens mais jovens, e escravos, nos ensinando a todos, a renunciar à impiedade e às paixões mundanas . “
Essa é a primeira lição que aprendemos debaixo da graça como nosso instrutor: “dizer não às paixões mundanas e à impiedade”. O verbo grego é arneomai, que significa “negar” ou “recusar”, ou “repudiar”.
É uma palavra forte, repudiar, mas não tão forte, talvez, como a palavra que Paulo ocasionalmente usa em outro lugar: “mortificar”, Romanos 8:13: “mortificar as obras da carne”. Colossenses 3:5: “Ponha à morte … o que é da terra em você”. Gálatas 5:24: “Crucifique a carne com as suas paixões e concupiscências”. O sentido, porém, é exatamente o mesmo. “Repudiar a impiedade e as paixões mundanas.” Quão fortemente devemos repudiar tais coisas? Basta seguir em frente e colocá-las à morte. Exterminá-las.
Essa é a primeira lição que a graça nos ensina. É no que consiste o arrependimento: a total, renúncia incondicional e negação das obras carnais e desejos mundanos.
Agora, isto não é opcional. Há uma ideia de que todas as exigências para a obediência e todo apelo à santidade são, por definição, pietistas, legalistas e moralistas, e, portanto, essas coisas devem ser evitadas, como se fossem uma ameaça séria para o evangelho e o princípio da graça.
Se você acha que cada apelo à santidade soa como legalismo, você tem um problema. Por outro lado, se você acha que o remédio real para a derrota na vida cristã é dobrar os joelhos e trabalhar duro para alcançar a santidade, você tem um problema, também. Acima de tudo, você tem uma visão distorcida da graça se você acha que a graça elimina qualquer necessidade de santidade. Você tem uma visão distorcida da graça se você acha que graça simplesmente derruba a justiça em favor do livre e fácil perdão. Se você pensa que a marca da chamada “livre graça” soa perigosa ou você acha que isso soa divertido, se você acha que graça torna discutível todo tipo de dever moral, você não entende a graça adequadamente.
Os evangélicos contemporâneos são perigosamente suscetíveis tanto ao legalismo quanto ao liberalismo, porque os evangélicos têm ficado satisfeitos com uma compreensão superficial da graça por gerações. O problema remonta, eu acho, a mais do que um século.
A graça foi degradada pela primeira vez no inferno. Em seguida, ela foi retratada como um meio de realização pessoal. Hoje em dia é geralmente entendida como um princípio que anula a necessidade de ser ou agir corretamente. Talvez alguns de vocês pensem que a graça é um princípio que anula a necessidade de ser ou agir corretamente. Mas isto é uma mentira que é enfaticamente refutada pelo apóstolo Paulo aqui: “a graça de Deus nos ensina a renunciar à impiedade.”
Note que esta primeira lição sozinha faz um forte contraste com a noção convencional de graça. A graça não é um sentimento meloso que nos faz sempre passivos e positivos. A graça em si é dinâmica. É a expressão ativa do favor de Deus. É favor imerecido. Mais do que isso, é exatamente o oposto daquilo que nós merecemos. Mas é uma força potente, poderosa. Pela graça Deus se apodera de pecadores indignos, e os une espiritualmente a Cristo, os veste com Sua justiça, desperta suas almas mortas, remove os seus corações de pedra e dá-lhes a vida, um coração terno de carne, e os abençoa, com todas as bênçãos espirituais.
E a primeira resposta mesma da graça que advém do coração regenerado é uma confissão negativa: nós “renunciamos à impiedade e às paixões mundanas.” Em outras palavras, o primeiro movimento de nosso arrependimento é um dom de Deus, uma obra da graça. Cada aspecto do arrependimento autêntico é motivado e operado pela graça. A pessoa que não se arrependeu não recebeu de fato a graça.
Falamos de “graça irresistível”. Gosto dessa expressão, porque transmite a sensação de que a graça é dinâmica, não passiva. Mas também é sujeita a mal-entendidos. Quando dizemos que a graça é “irresistível”, não queremos dizer Deus emprega coerção para nos conduzir a Cristo. A graça é irresistível no mesmo sentido que eu acho a minha mulher irresistível. Não que ela me ameace ou me obrigue a fazer a sua vontade, mas que eu estou cativado de uma forma muito positiva por seu apelo inerente.
De um modo semelhante, mas ainda mais profundo, a graça divina nos leva a Cristo pela atração, não por constrangimento. E se você foi atraído a Cristo pela graça, se você realmente o ama, você vai odiar tudo o que se opõe a ele. É assim que a graça que nos atrai a Cristo nos ensina “a renunciar à impiedade e às paixões mundanas.” Isso, eu acho, é a mesma verdade que Paulo tem em mente em Romanos 2:4 quando diz que “a bondade de Deus é quem nos conduz ao arrependimento”.
Nas famosas palavras de Martinho Lutero, de suas 95 teses, “Quando o nosso Senhor e Mestre, Jesus Cristo, disse “Arrependei-vos,” Ele chamou toda a vida dos fiéis para ser de arrependimento.” Nós “renunciamos à impiedade e às paixões mundanas” num fundamento diário, que é a graça, adequadamente compreendida, que nos instrui a nos arrependermos no início de nossa vida cristã, e em seguida, solicita e opera arrependimentos diários desde então.” Essa é a lição número um que podemos aprender com a graça: repudiar as obras da carne. Aqui está uma segunda lição. A graça nos ensina:
2. A cultivar o fruto do Espírito
A segunda metade do versículo 12. A graça nos ensina para que “vivamos, no presente século, sensata, justa e piedosamente,”. Observe o enfoque triplo na sobriedade, justiça e piedade. O primeiro termo é de uma palavra grega que, literalmente, se refere a solidez de mente. Sua conotação é auto-controle, moderação. A versão King James diz: “sóbria”, e a Bíblia New American Standard diz: “sensata”. Todas essas ideias são inerentes à palavra no original grego. A ideia não é apenas de temperança e moderação, mas de sabedoria, prudência, circunspecção – clareza de mente. Ele está descrevendo uma virtude cujo benefício principal reverte para o próprio indivíduo. A graça nos ensina a ser lúcidos e a exercer domínio próprio cauteloso.
O segundo termo descreve uma virtude que descreve as nossas relações com os outros: A graça nos capacita a “viver … com justiça.” A ESV e a NIV usam a palavra “reto”. Para citar o grande teólogo batista John Gill, isso fala da vida “justa” entre os homens, dando a cada um o que lhe é devido, e lidar com tudo de acordo com as regras de equidade e justiça, por termos sido feitos novos homens, criados para a justiça e santidade verdadeiras, e como mortos para o pecado, através da morte de Cristo, e assim vivemos para a justiça, ou de uma forma justa, e como sendo justificados pela justiça de Cristo, revelada no Evangelho.” Isto abrange todas as dimensões da justiça – prática e forense. Mas como o contexto é claramente sobre o modo como vivemos nossas vidas, eu acho que o enfoque aqui é sobre as nossas relações com os outros seres humanos. Viver “de modo justo” é fruto do ensino da graça.
E então o terceiro termo, “piedoso”.
Esta terceira palavra “piedoso” é um adjetivo que no grego é etimologicamente o oposto exato da palavra traduzida por “impiedade” no início do verso. “Impiedade” é asebeia. “Piedade” é eusebos. Elas são formas positivas e negativas de uma mesma raiz. A graça nos ensina a evitar a impiedade e a viver piedosamente. Isso tudo é muito simples e direto. Paulo não está dando a Tito uma ideia complexa e misteriosa. É muito simples: A graça (a autêntica graça bíblica, não o substituto pobre moderno evangélico, mas a graça do Senhor Jesus Cristo) nos ensina a repudiar as obras da carne e a cultivar o fruto do Espírito.
Paulo ensina esta mesma ideia em Gálatas 5, onde ele contrasta as obras da carne com o fruto do Espírito. Gálatas 5:18-24:
Mas, se sois guiados pelo Espírito, não estais debaixo da lei. É claro que os crentes são não estão sob a lei, mas debaixo da graça. Então, o que Paulo está fazendo nesta passagem é um claro contraste entre o que produz a carne sob o jugo da lei, contra o que o Espírito Santo produz em nós através da liberdade da graça. Ouça o contraste. E note que a única coisa que a nossa carne caída pode produzir são obras corruptas. Mas a obra do Espírito em nós é chamada de “fruto”, e isto é inteiramente virtuoso:
Gál 5:19 Ora, as obras da carne são conhecidas e são: prostituição, impureza, lascívia,
Gál 5:20 idolatria, feitiçarias, inimizades, porfias, ciúmes, iras, discórdias, dissensões, facções,
Gál 5:21 invejas, bebedices, glutonarias e coisas semelhantes a estas, a respeito das quais eu vos declaro, como já, outrora, vos preveni, que não herdarão o reino de Deus os que tais coisas praticam.
Gál 5:22 Mas o fruto do Espírito é: amor, alegria, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fidelidade,
Gál 5:23 mansidão, domínio próprio. Contra estas coisas não há lei.
Gál 5:24 E os que são de Cristo Jesus crucificaram a carne, com as suas paixões e concupiscências.
Em outras palavras, o que nos define como cristãos é isto mesmo: que nós repudiemos as obras da carne. A graça, não a lei, é o que nos capacita e nos motiva e nos dá poder para fazer isso. E, ao mesmo tempo, a graça nos ensina a cultivar o fruto do Espírito.
Assim, as lições 1 e 2 que aprendemos na escola da graça: repudiar as obras da carne; para cultivar o fruto do Espírito, e agora a terceira:
3. A antecipar a bem-aventurança da eternidade
Aqui está a distinção fundamental entre a lei e a graça. Porque para qualquer pensamento de auto-conhecimento o efeito da lei por si só, à parte da graça, é puro terror. Porque nós somos pecadores, a lei ameaça os pecadores com a destruição total. Mas a graça nos enche de expectativa e antecipa as bênçãos que vão durar eternamente. Versículo 13: “aguardando a bendita esperança e a manifestação da glória do nosso grande Deus e Salvador Cristo Jesus.”
Em suma, a escatologia da graça é diferente da escatologia da lei. Sempre que a lei pronuncia condenação e jura vingança eterna, a graça pronuncia uma bênção e promete recompensa eterna. A graça nos ensina a viver à luz desta esperança.
Todas as lições que a graça nos ensina são incentivos para a santidade: o nosso ódio da injustiça, a dívida que temos para com a justiça de Cristo, a recompensa que nos é prometida na eternidade – todas essas coisas são incentivos para nós renunciarmos à impiedade e às paixões mundanas e vivermos de modo sensato, justo e piedoso, no presente século.
E note: este era o próprio objetivo de Cristo em redimir-nos, em primeiro lugar. Versículo 14: “o qual a si mesmo se deu por nós, a fim de remir-nos de toda iniquidade e purificar, para si mesmo, um povo exclusivamente seu, zeloso de boas obras.”
Agora, não me diga que não há nada inerentemente legalista sobre ser zeloso de boas obras. E não me diga que a graça exclui qualquer tipo de boas obras. O zelo para as boas obras é o objetivo final da graça.
Agora, tenha em mente: esta passagem abrange todos os tempos e todas as perspectivas: passado, presente e futuro. Eu, os outros, e Deus. Em todos os aspectos, exceto um, as lições da graça estão em perfeito acordo com o que a lei diz. Elas dizem a mesma coisa. Tanto a lei e a graça dizem que devemos “renunciar à impiedade e às paixões mundanas.” Tanto a lei e a graça dizem que devemos ter domínio próprio, e viver de modo justo e piedoso no presente tempo. Tanto a lei e a graça nos humilham e nos mostram a virtude do domínio próprio. Tanto a lei e a graça dizem que devemos viver em retidão e amar o nosso próximo como amamos a nós mesmos. Tanto a lei e a graça nos instruem a amar o Senhor nosso Deus com todo nosso coração, alma, mente e força. Em todos os aspectos, a graça está de acordo com os mandamentos e diretrizes da lei moral eterna de Deus. Nunca entretenhamos o pensamento de que a lei e a graça ou a lei e o evangelho se contradizem.
Mas há esta distinção vital entre a lei e a graça, e a diferença reside nesta terceira lição: a lei nos ameaça com a destruição, porque não podemos obedecê-la perfeitamente. A graça nos dá tanto o desejo e o poder para obedecer. Isso é o que Filipenses 2:13 diz: “é Deus quem efetua em vós tanto o querer como o realizar segundo a sua boa vontade”. A vontade e o poder para a obediência são dons da graça divina. Assim, enquanto a lei e a graça concordam em que ambas nos impelem a ser santos, a lei somente pode nos condenar para o nosso fracasso e nos ameaçar com a destruição. A graça é o remédio para o nosso fracasso, e garante a bênção eterna.
A diferença principal, sucintamente, é que a lei não pode dar vida, somente pode levar à morte. II Coríntios 3:6: “A letra mata, mas o Espírito vivifica.” Somos salvos “pela santificação do Espírito”, de acordo com 2 Tessalonicenses 2:13. A obra graciosa do Espírito em nossos corações garante a nossa santificação. Leia Romanos 8:3-4: “Porquanto o que fora impossível à lei, no que estava enferma pela carne, isso fez Deus enviando o seu próprio Filho em semelhança de carne pecaminosa e no tocante ao pecado; e, com efeito, condenou Deus, na carne, o pecado, a fim de que o preceito da lei se cumprisse em nós, que não andamos segundo a carne, mas segundo o Espírito.”
A distinção entre a lei e a graça não tem nada a ver com os mandamentos, ou o conteúdo moral da lei. O que a graça elimina são as maldições da lei. Quando os imperativos morais da lei estão em causa, a graça está de pleno acordo. Paulo diz isso expressamente em Gálatas 3:6: “a lei é contrária às promessas de Deus? Certamente que não! Porque, se houvesse uma lei que pudesse dar vida, então a justiça seria de fato pela lei.”. Gálatas 3:21: “O problema com a lei era a nossa incapacidade e nossa falta de vontade de querer e trabalhar para o bom prazer de Deus. A graça é o remédio para isso.
E o resultado? Versículo 14: para que pudéssemos ser redimidos de toda iniquidade e purificados por Cristo – “um povo exclusivamente seu, zeloso de boas obras ” E não há nada nem um pouco “legalista” sobre esse zelo.
Versículo 15: “Dize estas coisas; exorta e repreende também com toda a autoridade. Ninguém te despreze.”
Eu não tenho qualquer simpatia pela ideia de que aqueles que acreditam que a pessoa com a consciência mais sincera (ou a escola bíblica com as regras mais rigorosas) deveriam definir para nós o que seja a santidade. Estou muito feliz de deixar a Escritura definir os parâmetros da santificação. E onde a Bíblia é silenciosa, eu acho que deveria ser, também.
Então, eu deploro a cada pitada de legalismo, e quero deixar isso claro.
Mas, também enfaticamente desprezo a tendência evangélica comum de considerar como “legalista” todas as chamadas para a obediência e para cada convocação à santidade. Como se a graça fosse uma punição por causa de desobediência e imoralidade. Como se o evangelho nos desse licença para “Permaneceremos no pecado, para que a graça aumente.” Ele nunca pode ser isto! Como morreríamos para o pecado ainda vivendo nele?”
Agora, a linha de demarcação entre o Evangelho e a lei é absolutamente vital, e você nunca vai me ouvir dizer o contrário. Um dos grandes avanços da Reforma Protestante veio na forma como Martinho Lutero salientou a distinção entre lei e evangelho. A lei não é evangelho e vice-versa. Eu aprecio os que trabalham para diferenciar entre os dois. Não há praticamente nenhuma distinção teológica mais importante.
E deixe-me dizer isto mais uma vez, com ênfase: Confundir a lei e o evangelho não é um pequeno erro. É um erro fácil de se cometer, e vamos ser francos: parece haver algo no coração humano caído que nos torna propensos a esse erro. É o erro que está no cerne de todo o tipo de legalismo. Eu acho que há uma tendência de cada mente humana caída para o padrão para o legalismo, e é certo que devemos resistir a essa tendência. Não há nenhum erro mais mortal em toda a teologia. Algumas das palavras mais fortes de condenação em qualquer lugar do Novo Testamento foram destinadas a quem suplantou as promessas do evangelho com exigências legais (Gálatas 1:6-9).
Então estamos claros sobre isso? Eu odeio o legalismo com uma paixão santa.
No entanto, é um erro grave (também condenado em termos muito fortes pelo apóstolo Paulo) imaginar que o evangelho não concorda com o padrão moral estabelecido pela lei; que a justificação pela fé, elimina a necessidade de obediência, ou que a liberdade perfeita da graça de Deus dá a licença para uma vida não santa. As boas obras, obediência aos mandamentos de Cristo, e encorajamentos e admoestações para sermos santos são aspectos necessários da vida cristã. Não necessariamente (na forma como o legalista sugere) para ganhar o favor de Deus. Na verdade, nossas obras são inúteis, totalmente impotentes, para esse fim. Mas a obediência é uma expressão natural e inevitável e essencial do amor a Cristo e gratidão por Sua graça. Esta é a lição prática principal que podemos aprender com o princípio da graça: a graça nos compele ao amor e às boas obras. A graça nos constrange a renunciar ao pecado e a buscar a justiça.
Veja: O evangelho é mais excelente do que a lei, mas os dois não discordam. O evangelho nos liberta da condenação da lei, mas não nos dispensa do padrão moral estabelecido pela lei. Ou, para dizer de outra forma: o princípio da sola fide – justificação somente pela fé – não é hostil às boas obras. O evangelho coloca as boas obras no seu devido lugar, mas se entendermos corretamente o princípio da sola fide, seremos zelosos de boas obras; em busca sincera da santidade, e ansiosos para obedecer aos mandamentos de nosso Senhor. Não precisamos ser nem um pouco hesitantes em “estimularmos um ao outro ao amor e às boas obras.”
E isso é o que vamos ver na passagem que estamos meditando nesta hora – Tito 2:11-15. Lendo este texto, que lições podemos aprender com uma compreensão bíblica do princípio da graça? Qual é a graça afirmada que deve nos ensinar? Em toda a nossa conversa sobre ser saturado de graça, com foco no evangelho, o ministério centrado em Cristo, será que realmente temos entendido a “graça” corretamente, ou temos inadvertidamente caído no mesmo passo de “homens ímpios, que transformam a graça de nosso Deus em libertinagem?” E se nós, como pastores, temos feito um bom trabalho em instruir o nosso povo nas verdadeiras lições da graça?
Agora, aqui está a nossa passagem (Tito 2:11-15):
11 Porquanto a graça de Deus se manifestou salvadora a todos os homens,
12 educando-nos para que, renegadas a impiedade e as paixões mundanas, vivamos, no presente século, sensata, justa e piedosamente,
13 aguardando a bendita esperança e a manifestação da glória do nosso grande Deus e Salvador Cristo Jesus,
14 o qual a si mesmo se deu por nós, a fim de remir-nos de toda iniqüidade e purificar, para si mesmo, um povo exclusivamente seu, zeloso de boas obras.
15 Dize estas coisas; exorta e repreende também com toda a autoridade. Ninguém te despreze.
Vamos começar com uma palavra sobre o contexto e as circunstâncias que levaram a esta epístola. Paulo está escrevendo a Tito, a quem ele “deixou… em Creta, para que Tito colocasse em ordem o que ainda era necessário e constituísse presbíteros em cada cidade” (1:5). Então Tito está treinando e designando líderes para as igrejas em Creta. E Paulo envia a Tito uma pequena lista de qualificações para os homens que ele deveria nomear anciãos nas igrejas. É essencialmente idêntica à lista dada em 1 Timóteo 3. O princípio central, certamente, é o de que os líderes da igreja são “mordomos de Deus” e, portanto, devem ser moralmente e de reputação “irrepreensível”. Paulo reitera a mesma expressão duas vezes, no início de sua lista, em 1:6 e novamente no versículo 7.
Ele segue com uma lista de especificações que definem o significado de ser “irrepreensível”. Notem que exceto para a habilidade de ensinar (que é um dom que é absolutamente necessário para cumprir o chamado de um ancião) os requisitos apresentados por Paulo não se referem a habilidades e talentos. Eles são qualidades de caráter. E todos eles têm a ver com a maturidade, domínio próprio e retidão moral.
Este é o tipo de homem que está qualificado para liderar a igreja. Ele não é um palhaço ou um comediante. Não é alguém com potencial para ser uma celebridade, um futurista, um inovador, e palestrante motivacional. O tipo de pessoa que Tito deveria nomear para a liderança não era alguém com um enorme ego e um dom para ser simplista. Não há nada aqui sobre capacidade artística, graus de aprendizagem, exatidão política, visão de negócios, estilo de roupa, inteligência e criatividade, ou o seu conhecimento da cultura popular Nenhuma das coisas que as igrejas de hoje tendem a pesar quando à procura de um pastor.
Mas os anciãos que Tito deveria treinar e ordenar simplesmente precisavam ser, santos, homens disciplinados, maduros, capazes de lidar com a Palavra de Deus com precisão e ensinar suas verdades para os outros. Não jovens, e culturalmente esclarecidos, mas homens de Deus que são totalmente maduros e firmes.
Se você entender o que Paulo está dizendo aqui e compará-lo com a cultura evangélica do século 21, isto deveria causar um pouco de dissonância cognitiva. A estratégia que Paulo está dizendo a Timóteo para usar no trabalho de plantação de igrejas nada tem a ver como as organizações de plantação de igrejas de hoje dizem ser necessário.
Eu não posso imaginar que Tito leu esta carta e levou Paulo a dizer que ele precisava para começar a dar aulas de contextualização, patrocinando seminários sobre sexo, gerindo simpósios sobre inovação e marketing da igreja, ou oferecendo cursos sobre liderança valendo-se das obras mais recentes escritas sobre o assunto por autores renomados, que vão na contramão de tudo o que o apóstolo ensinou.
E (eu sei que isso é um pouco de digressão, mas) eu quero dizer isto claramente: As maiores ameaças para o evangelho de hoje não são as políticas do governo que prejudicam os nossos valores, e nem crenças seculares que atacam nossas confissões de fé, nem mesmo ateus que negam nosso Deus. Os maiores inimigos do evangelho de hoje são igrejas mundanas e pastores mercenários que banalizam o Cristianismo.
E isso não é um problema novo. Isto era verdade mesmo nos tempos apostólicos – em muitas igrejas primitivas. Em Filipenses 3:18-19, o apóstolo Paulo escreveu: “Porque muitos há, dos quais muitas vezes eu vos disse, e agora vos digo até chorando, que são inimigos da cruz de Cristo.” Uma das principais características que Paulo destacou desses inimigos da cruz – inimigos da autêntica graça, era que eles “tinham suas mentes nas coisas terrenas.” Eles “pervertiam a graça de nosso Deus em sensualidade.” Eles misturaram a ideia de liberdade cristã com uma oportunidade para satisfazer a carne. Eles “usaram a liberdade como um disfarce (cobertura) para o mal.” No processo, eles banalizaram a cruz, corromperam a idéia da graça, e perverteram o evangelho.
E aqui no nosso texto, Paulo emprega o princípio da própria graça para refutar tal banalizada, mundana, noção de uma religião sem lei. Ele diz que as verdadeiras lições que aprendemos com a graça haviam fugido em face de tudo o que é superficial e mundano, injusto, desobediente.
Por uma questão de fato, Paulo está advertindo Tito a não ceder às tendências da cultura cretense secular. Capítulo 1, versículo 12: “Os cretenses são sempre mentirosos, bestas ruins, ventres preguiçosos.” Isso provavelmente não era uma coisa politicamente correta para ser dita, mas mesmo assim, Paulo acrescenta enfaticamente: “Este testemunho é verdadeiro. Portanto, repreende-os severamente, para que sejam sãos na fé.” Ele estava dizendo a Tito que a igreja deve ser contra-cultural, resistente aos males e falhas de caráter da sociedade secular. Os líderes da Igreja não devem ser obcecados com ganhar elogios e admiração do mundo.
Em vez disso, Paulo diz (2:1): “ensina o que está de acordo com a sã doutrina,” e ele passa a dar uma série de mandamentos para categorias específicas de pessoas na igreja: “anciãos” (v. 2). “As mulheres mais velhas da mesma maneira” (v. 3). “As mulheres jovens” (v. 4). “Os homens mais jovens” (v. 6). “Escravos” (v. 9). E a Tito como o pastor missionário de plantação de igrejas é dada uma diretriz em particular: “Em todos os aspectos … seja um modelo de boas obras” (v. 7), especialmente por causa dos jovens que representam os futuros líderes na igreja .
Agora, observe que o versículo 1 fala de “o que está de acordo com a sã doutrina”, e, em seguida, Paulo passa a relacionar uma pequena lista de coisas que nós provavelmente rotulamos de “deveres práticos” mais do que os tipos de coisas que deveríamos designar como “verdades doutrinárias”. Veja, um dos principais pontos de Paulo aqui é que ele não quer que Tito gaste todo o seu tempo ensinando doutrina como teoria, concentrando-se apenas no conteúdo objetivo bíblico, histórico e teológico à custa de exortar a igreja à obediência e à santidade prática. E vamos ser honestos: isso é uma falha peculiar em algumas de nossas igrejas reformadas e calvinistas. Adotamos uma abordagem didática que é pesada em material relativo à verdade e à doutrina objetiva – algumas vezes, sem nunca abordar qualquer tipo de exortação prática.
O ponto de Paulo é que os deveres práticos vitais de santidade e obediência estão em perfeito “acordo com a sã doutrina.” As chamadas para a obediência e exortações à virtude não são incompatíveis com as doutrinas da graça, e muito menos estão em oposição à graça. Nas palavras do versículo 10, o que Paulo definiu neste capítulo são as ações e qualidades de caráter que “adornam a doutrina de Deus, nosso Salvador “.
Em outras palavras (se você me permite citar a versão bíblica NIV), estas são coisas que “vão tornar o ensino sobre Deus, nosso Salvador atraente”, e não” atraente” no sentido de que elas tornariam a mensagem numa estória que agrade o mundo. O evangelho ainda é “um escândalo para os judeus e loucura para os gentios.” Cristo ainda é “uma pedra de tropeço e rocha de escândalo”. Sua advertência em João 15:18-20 ainda é válida: “Se o mundo vos odeia, sabei que antes odiou a mim. Se vós fôsseis do mundo, o mundo amaria o que era seu, mas porque não sois do mundo, porque eu vos escolhi do mundo, por isso o mundo vos odeia. Um servo não é maior do que seu senhor. Se eles me perseguiram, também vos perseguirão a vós.” Assim também, nas palavras de 1 João 3:13: “Não se surpreendam irmãos, que o mundo vos odeie.” Você não pode mudar isso e ser fiel. Pare de tanto se esforçar para ganhar a afeição do mundo.
E, no entanto, a virtude autêntica é atraente no sentido de que capta a atenção do mundo e dá à nossa mensagem uma medida de inegável credibilidade. Nesse sentido, o cultivo da virtude básica é mil vezes mais atraente do que qualquer marca atualmente popular do evangelismo elegante, da moderna religião, ou da contextualização pós-moderna.
Essa é a estratégia do apóstolo Paulo para se chegar a uma cultura hostil. E o que me intriga é como ele usa o princípio da graça para fazer seu ponto. Em contraste com aqueles que transformam a graça em libertinagem, Paulo diz que o princípio bíblico da graça nos ensina algo completamente diferente.
Na verdade, eu vejo três lições distintas que Paulo afirma que podemos aprender com a graça. Todas elas têm a ver com a forma como vivemos (em outras palavras, elas são práticas, não lições teóricas). Todas as três lições nos dão instruções e incentivos para a vida reta e obediência ao senhorio de Cristo. Isso, diz Paulo, é o que a graça deve produzir, não uma atitude negligente sobre a virtude e o vício, não uma aceitação casual dos valores mundanos, mas exatamente o oposto. O fruto verdadeiro da graça divina é uma vida santa.
A graça nos ensina três lições nos versículos 12 e 13, mas antes de nos concentrarmos nesses dois versos, preste atenção na estrutura da passagem maior, começando no versículo 11. Você notou as duas ocorrências da palavra “aparecer”? Versículo 11: “Porque a graça de Deus se manifestou.” Versículo 13: Nós estamos “esperando … o aparecimento de … Jesus Cristo.” É o mesmo texto básico no original grego. A palavra no versículo 11 é a forma verbal (para aparecer) e a palavra no versículo 13 é a forma substantiva (aparência); e a palavra grega tem a conotação de brilho (literalmente, “brilhar” ou “ser trazido à luz”).
E essas duas palavras apontam para os dois adventos de Jesus Cristo.
Versículo 11: “a graça de Deus se manifestou.” Como, especificamente? Na encarnação e ministério de Cristo. “Porque a lei foi dada por meio de Moisés, a graça e a verdade vieram por Jesus Cristo.”, João 1:7 , e eu acho que é importante ressaltar o que João quis dizer quando escreveu isso. Ele não estava sugerindo, é claro, que a Velha Aliança era desprovida de graça. Ele não estava dizendo que a graça é algo novo que Cristo introduziu no seu primeiro advento. Ele simplesmente quer dizer que Cristo é a própria encarnação da graça divina. Moisés, por um lado, foi o legislador, Jesus, por outro lado, é a fonte e o representante vivo da graça de Deus. A lei foi a característica dominante da aliança mosaica, a graça e a verdade são as características dominantes da Nova Aliança. João 1:14: “E o Verbo se fez carne e habitou entre nós, e vimos a sua glória, glória como do unigênito Filho do Pai, cheio de graça e de verdade.” (João 1:14). Moisés era o representante e instrumento através do qual a lei foi escrita em tábuas de pedra. Cristo é a pessoa em quem a graça e a verdade estão encarnados. Mas Moisés e Cristo não são adversários. Muito pelo contrário. Cristo veio como o cumprimento de tudo o que Moisés jamais escreveu.
E isso inclui a lei. A graça cumpre a lei, não a derruba. O próprio Jesus disse isso no início de Seu Sermão da Montanha (Mateus 5:17): “Não penseis que vim revogar a Lei ou os profetas: não vim revogar, mas cumprir.”
Assim a graça “apareceu” de uma forma única e definitiva através da encarnação e obra expiatória de Cristo. Paulo se refere a isso novamente em Tito 3:4-5: “Quando, porém, se manifestou a benignidade de Deus, nosso Salvador, e o seu amor para com todos, não por obras de justiça praticadas por nós, mas segundo sua misericórdia, ele nos salvou mediante o lavar regenerador e renovador do Espírito Santo,”.
A palavra “aparecer” – manifestação – em Tito 2:13, certamente, é uma referência à segunda vinda de Cristo: “aguardando a bendita esperança e a manifestação da glória do nosso grande Deus e Salvador Cristo Jesus,”. Agora, nós não temos tempo para entrar em detalhes sobre isso, mas a maneira como Paulo emprega as palavras nesta declaração é instrutiva. Esta é uma referência a uma pessoa, não duas. “Nosso grande Deus e Salvador, Cristo Jesus”. É uma afirmação da divindade de Cristo, e é um paralelo exato com a expressão encontrada no final do versículo 10: “Deus, nosso Salvador.” Jesus Cristo é o nosso Deus e nosso Salvador. É Sua manifestação em glória que esperamos.
Enquanto isso, vivemos entre esses dois adventos – as duas “aparições”. No final do versículo 12, Paulo se refere ao período de tempo entre as duas aparições como “o presente século”. Assim, ele nos aponta para o passado, quando “a graça de Deus … apareceu.” Ele quer que vivamos “no século atual” – exemplificando as virtudes da graça no aqui e agora. E ele quer que a gente fique de olho na expectativa sobre o futuro, à medida que ” aguardando a bendita esperança “, o retorno de Deus, nosso Salvador, em Seu esplendor completo – que será a culminação final tanto da graça quanto da glória.
Em outras palavras, existem dimensões passadas, presentes e futuras da graça, e a presente dimensão é o foco principal de nosso texto. Enquanto vivemos entre estes dois adventos, a graça nos leva para a escola. Este “presente século” é a escola da graça. E eu vejo três lições principais que a graça nos ensina. Elas todas são lições difíceis, porque são contrárias às tendências naturais da nossa carne caída, e nós temos que guardar e reaprender essas lições diariamente. Mas aqui estão elas. Lição número 1. A graça nos ensina:
1. A repudiar as obras da carne
Versos 11-12: “Porquanto a graça de Deus se manifestou salvadora a todos os homens, educando-nos para que, renegadas a impiedade e as paixões mundanas, vivamos, no presente século, sensata, justa e piedosamente,”. Agora, eu preciso comentar o versículo 11, mas nós não podemos permanecer lá. Obviamente, este texto não está dizendo que a graça traz a salvação para todas as pessoas, porque Jesus ensinou repetida e expressamente que “larga é a porta e espaçoso o caminho que conduz à perdição, e aqueles que entram por ela são muitos.” (Mateus 7:13). Descrições do julgamento final de Jesus sempre incluem avisos urgentes que muitos naquele dia ouvirão: “Apartai-vos de mim, malditos, para o fogo eterno, preparado para o diabo e seus anjos.”
Então Tito 2:11 , não está ensinando uma doutrina de salvação universal. Observe a conjunção “Para” no início do verso. Vincula a declaração a que a precedeu – e isto é uma longa lista de categorias de pessoas – “Os homens mais velhos … mulheres mais velhas … mulheres jovens … homens mais jovens … e escravos.” “Porque a graça de Deus se manifestou, trazendo salvação para todos os tipos de pessoas, todas as pessoas: homens velhos, mulheres velhas, jovens, homens mais jovens, e escravos, nos ensinando a todos, a renunciar à impiedade e às paixões mundanas . “
Essa é a primeira lição que aprendemos debaixo da graça como nosso instrutor: “dizer não às paixões mundanas e à impiedade”. O verbo grego é arneomai, que significa “negar” ou “recusar”, ou “repudiar”.
É uma palavra forte, repudiar, mas não tão forte, talvez, como a palavra que Paulo ocasionalmente usa em outro lugar: “mortificar”, Romanos 8:13: “mortificar as obras da carne”. Colossenses 3:5: “Ponha à morte … o que é da terra em você”. Gálatas 5:24: “Crucifique a carne com as suas paixões e concupiscências”. O sentido, porém, é exatamente o mesmo. “Repudiar a impiedade e as paixões mundanas.” Quão fortemente devemos repudiar tais coisas? Basta seguir em frente e colocá-las à morte. Exterminá-las.
Essa é a primeira lição que a graça nos ensina. É no que consiste o arrependimento: a total, renúncia incondicional e negação das obras carnais e desejos mundanos.
Agora, isto não é opcional. Há uma ideia de que todas as exigências para a obediência e todo apelo à santidade são, por definição, pietistas, legalistas e moralistas, e, portanto, essas coisas devem ser evitadas, como se fossem uma ameaça séria para o evangelho e o princípio da graça.
Se você acha que cada apelo à santidade soa como legalismo, você tem um problema. Por outro lado, se você acha que o remédio real para a derrota na vida cristã é dobrar os joelhos e trabalhar duro para alcançar a santidade, você tem um problema, também. Acima de tudo, você tem uma visão distorcida da graça se você acha que a graça elimina qualquer necessidade de santidade. Você tem uma visão distorcida da graça se você acha que graça simplesmente derruba a justiça em favor do livre e fácil perdão. Se você pensa que a marca da chamada “livre graça” soa perigosa ou você acha que isso soa divertido, se você acha que graça torna discutível todo tipo de dever moral, você não entende a graça adequadamente.
Os evangélicos contemporâneos são perigosamente suscetíveis tanto ao legalismo quanto ao liberalismo, porque os evangélicos têm ficado satisfeitos com uma compreensão superficial da graça por gerações. O problema remonta, eu acho, a mais do que um século.
A graça foi degradada pela primeira vez no inferno. Em seguida, ela foi retratada como um meio de realização pessoal. Hoje em dia é geralmente entendida como um princípio que anula a necessidade de ser ou agir corretamente. Talvez alguns de vocês pensem que a graça é um princípio que anula a necessidade de ser ou agir corretamente. Mas isto é uma mentira que é enfaticamente refutada pelo apóstolo Paulo aqui: “a graça de Deus nos ensina a renunciar à impiedade.”
Note que esta primeira lição sozinha faz um forte contraste com a noção convencional de graça. A graça não é um sentimento meloso que nos faz sempre passivos e positivos. A graça em si é dinâmica. É a expressão ativa do favor de Deus. É favor imerecido. Mais do que isso, é exatamente o oposto daquilo que nós merecemos. Mas é uma força potente, poderosa. Pela graça Deus se apodera de pecadores indignos, e os une espiritualmente a Cristo, os veste com Sua justiça, desperta suas almas mortas, remove os seus corações de pedra e dá-lhes a vida, um coração terno de carne, e os abençoa, com todas as bênçãos espirituais.
E a primeira resposta mesma da graça que advém do coração regenerado é uma confissão negativa: nós “renunciamos à impiedade e às paixões mundanas.” Em outras palavras, o primeiro movimento de nosso arrependimento é um dom de Deus, uma obra da graça. Cada aspecto do arrependimento autêntico é motivado e operado pela graça. A pessoa que não se arrependeu não recebeu de fato a graça.
Falamos de “graça irresistível”. Gosto dessa expressão, porque transmite a sensação de que a graça é dinâmica, não passiva. Mas também é sujeita a mal-entendidos. Quando dizemos que a graça é “irresistível”, não queremos dizer Deus emprega coerção para nos conduzir a Cristo. A graça é irresistível no mesmo sentido que eu acho a minha mulher irresistível. Não que ela me ameace ou me obrigue a fazer a sua vontade, mas que eu estou cativado de uma forma muito positiva por seu apelo inerente.
De um modo semelhante, mas ainda mais profundo, a graça divina nos leva a Cristo pela atração, não por constrangimento. E se você foi atraído a Cristo pela graça, se você realmente o ama, você vai odiar tudo o que se opõe a ele. É assim que a graça que nos atrai a Cristo nos ensina “a renunciar à impiedade e às paixões mundanas.” Isso, eu acho, é a mesma verdade que Paulo tem em mente em Romanos 2:4 quando diz que “a bondade de Deus é quem nos conduz ao arrependimento”.
Nas famosas palavras de Martinho Lutero, de suas 95 teses, “Quando o nosso Senhor e Mestre, Jesus Cristo, disse “Arrependei-vos,” Ele chamou toda a vida dos fiéis para ser de arrependimento.” Nós “renunciamos à impiedade e às paixões mundanas” num fundamento diário, que é a graça, adequadamente compreendida, que nos instrui a nos arrependermos no início de nossa vida cristã, e em seguida, solicita e opera arrependimentos diários desde então.” Essa é a lição número um que podemos aprender com a graça: repudiar as obras da carne. Aqui está uma segunda lição. A graça nos ensina:
2. A cultivar o fruto do Espírito
A segunda metade do versículo 12. A graça nos ensina para que “vivamos, no presente século, sensata, justa e piedosamente,”. Observe o enfoque triplo na sobriedade, justiça e piedade. O primeiro termo é de uma palavra grega que, literalmente, se refere a solidez de mente. Sua conotação é auto-controle, moderação. A versão King James diz: “sóbria”, e a Bíblia New American Standard diz: “sensata”. Todas essas ideias são inerentes à palavra no original grego. A ideia não é apenas de temperança e moderação, mas de sabedoria, prudência, circunspecção – clareza de mente. Ele está descrevendo uma virtude cujo benefício principal reverte para o próprio indivíduo. A graça nos ensina a ser lúcidos e a exercer domínio próprio cauteloso.
O segundo termo descreve uma virtude que descreve as nossas relações com os outros: A graça nos capacita a “viver … com justiça.” A ESV e a NIV usam a palavra “reto”. Para citar o grande teólogo batista John Gill, isso fala da vida “justa” entre os homens, dando a cada um o que lhe é devido, e lidar com tudo de acordo com as regras de equidade e justiça, por termos sido feitos novos homens, criados para a justiça e santidade verdadeiras, e como mortos para o pecado, através da morte de Cristo, e assim vivemos para a justiça, ou de uma forma justa, e como sendo justificados pela justiça de Cristo, revelada no Evangelho.” Isto abrange todas as dimensões da justiça – prática e forense. Mas como o contexto é claramente sobre o modo como vivemos nossas vidas, eu acho que o enfoque aqui é sobre as nossas relações com os outros seres humanos. Viver “de modo justo” é fruto do ensino da graça.
E então o terceiro termo, “piedoso”.
Esta terceira palavra “piedoso” é um adjetivo que no grego é etimologicamente o oposto exato da palavra traduzida por “impiedade” no início do verso. “Impiedade” é asebeia. “Piedade” é eusebos. Elas são formas positivas e negativas de uma mesma raiz. A graça nos ensina a evitar a impiedade e a viver piedosamente. Isso tudo é muito simples e direto. Paulo não está dando a Tito uma ideia complexa e misteriosa. É muito simples: A graça (a autêntica graça bíblica, não o substituto pobre moderno evangélico, mas a graça do Senhor Jesus Cristo) nos ensina a repudiar as obras da carne e a cultivar o fruto do Espírito.
Paulo ensina esta mesma ideia em Gálatas 5, onde ele contrasta as obras da carne com o fruto do Espírito. Gálatas 5:18-24:
Mas, se sois guiados pelo Espírito, não estais debaixo da lei. É claro que os crentes são não estão sob a lei, mas debaixo da graça. Então, o que Paulo está fazendo nesta passagem é um claro contraste entre o que produz a carne sob o jugo da lei, contra o que o Espírito Santo produz em nós através da liberdade da graça. Ouça o contraste. E note que a única coisa que a nossa carne caída pode produzir são obras corruptas. Mas a obra do Espírito em nós é chamada de “fruto”, e isto é inteiramente virtuoso:
Gál 5:19 Ora, as obras da carne são conhecidas e são: prostituição, impureza, lascívia,
Gál 5:20 idolatria, feitiçarias, inimizades, porfias, ciúmes, iras, discórdias, dissensões, facções,
Gál 5:21 invejas, bebedices, glutonarias e coisas semelhantes a estas, a respeito das quais eu vos declaro, como já, outrora, vos preveni, que não herdarão o reino de Deus os que tais coisas praticam.
Gál 5:22 Mas o fruto do Espírito é: amor, alegria, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fidelidade,
Gál 5:23 mansidão, domínio próprio. Contra estas coisas não há lei.
Gál 5:24 E os que são de Cristo Jesus crucificaram a carne, com as suas paixões e concupiscências.
Em outras palavras, o que nos define como cristãos é isto mesmo: que nós repudiemos as obras da carne. A graça, não a lei, é o que nos capacita e nos motiva e nos dá poder para fazer isso. E, ao mesmo tempo, a graça nos ensina a cultivar o fruto do Espírito.
Assim, as lições 1 e 2 que aprendemos na escola da graça: repudiar as obras da carne; para cultivar o fruto do Espírito, e agora a terceira:
3. A antecipar a bem-aventurança da eternidade
Aqui está a distinção fundamental entre a lei e a graça. Porque para qualquer pensamento de auto-conhecimento o efeito da lei por si só, à parte da graça, é puro terror. Porque nós somos pecadores, a lei ameaça os pecadores com a destruição total. Mas a graça nos enche de expectativa e antecipa as bênçãos que vão durar eternamente. Versículo 13: “aguardando a bendita esperança e a manifestação da glória do nosso grande Deus e Salvador Cristo Jesus.”
Em suma, a escatologia da graça é diferente da escatologia da lei. Sempre que a lei pronuncia condenação e jura vingança eterna, a graça pronuncia uma bênção e promete recompensa eterna. A graça nos ensina a viver à luz desta esperança.
Todas as lições que a graça nos ensina são incentivos para a santidade: o nosso ódio da injustiça, a dívida que temos para com a justiça de Cristo, a recompensa que nos é prometida na eternidade – todas essas coisas são incentivos para nós renunciarmos à impiedade e às paixões mundanas e vivermos de modo sensato, justo e piedoso, no presente século.
E note: este era o próprio objetivo de Cristo em redimir-nos, em primeiro lugar. Versículo 14: “o qual a si mesmo se deu por nós, a fim de remir-nos de toda iniquidade e purificar, para si mesmo, um povo exclusivamente seu, zeloso de boas obras.”
Agora, não me diga que não há nada inerentemente legalista sobre ser zeloso de boas obras. E não me diga que a graça exclui qualquer tipo de boas obras. O zelo para as boas obras é o objetivo final da graça.
Agora, tenha em mente: esta passagem abrange todos os tempos e todas as perspectivas: passado, presente e futuro. Eu, os outros, e Deus. Em todos os aspectos, exceto um, as lições da graça estão em perfeito acordo com o que a lei diz. Elas dizem a mesma coisa. Tanto a lei e a graça dizem que devemos “renunciar à impiedade e às paixões mundanas.” Tanto a lei e a graça dizem que devemos ter domínio próprio, e viver de modo justo e piedoso no presente tempo. Tanto a lei e a graça nos humilham e nos mostram a virtude do domínio próprio. Tanto a lei e a graça dizem que devemos viver em retidão e amar o nosso próximo como amamos a nós mesmos. Tanto a lei e a graça nos instruem a amar o Senhor nosso Deus com todo nosso coração, alma, mente e força. Em todos os aspectos, a graça está de acordo com os mandamentos e diretrizes da lei moral eterna de Deus. Nunca entretenhamos o pensamento de que a lei e a graça ou a lei e o evangelho se contradizem.
Mas há esta distinção vital entre a lei e a graça, e a diferença reside nesta terceira lição: a lei nos ameaça com a destruição, porque não podemos obedecê-la perfeitamente. A graça nos dá tanto o desejo e o poder para obedecer. Isso é o que Filipenses 2:13 diz: “é Deus quem efetua em vós tanto o querer como o realizar segundo a sua boa vontade”. A vontade e o poder para a obediência são dons da graça divina. Assim, enquanto a lei e a graça concordam em que ambas nos impelem a ser santos, a lei somente pode nos condenar para o nosso fracasso e nos ameaçar com a destruição. A graça é o remédio para o nosso fracasso, e garante a bênção eterna.
A diferença principal, sucintamente, é que a lei não pode dar vida, somente pode levar à morte. II Coríntios 3:6: “A letra mata, mas o Espírito vivifica.” Somos salvos “pela santificação do Espírito”, de acordo com 2 Tessalonicenses 2:13. A obra graciosa do Espírito em nossos corações garante a nossa santificação. Leia Romanos 8:3-4: “Porquanto o que fora impossível à lei, no que estava enferma pela carne, isso fez Deus enviando o seu próprio Filho em semelhança de carne pecaminosa e no tocante ao pecado; e, com efeito, condenou Deus, na carne, o pecado, a fim de que o preceito da lei se cumprisse em nós, que não andamos segundo a carne, mas segundo o Espírito.”
A distinção entre a lei e a graça não tem nada a ver com os mandamentos, ou o conteúdo moral da lei. O que a graça elimina são as maldições da lei. Quando os imperativos morais da lei estão em causa, a graça está de pleno acordo. Paulo diz isso expressamente em Gálatas 3:6: “a lei é contrária às promessas de Deus? Certamente que não! Porque, se houvesse uma lei que pudesse dar vida, então a justiça seria de fato pela lei.”. Gálatas 3:21: “O problema com a lei era a nossa incapacidade e nossa falta de vontade de querer e trabalhar para o bom prazer de Deus. A graça é o remédio para isso.
E o resultado? Versículo 14: para que pudéssemos ser redimidos de toda iniquidade e purificados por Cristo – “um povo exclusivamente seu, zeloso de boas obras ” E não há nada nem um pouco “legalista” sobre esse zelo.
Versículo 15: “Dize estas coisas; exorta e repreende também com toda a autoridade. Ninguém te despreze.”
Devocional Alegria Inabalável - John Piper
ADOREMOS AO CORDEIRO
Versículo do dia: Eu chorava muito, porque ninguém foi achado digno de abrir o livro, nem mesmo de olhar para ele. (Apocalipse 5.4)
Você já pensou em suas orações como o aroma do céu? A Semana Santa me atraiu novamente para ler Apocalipse 4 e 5. Aqui há um vislumbre da vida no céu.
Em Apocalipse 5, vemos o Deus todo-poderoso no trono com um livro em sua mão. O livro tinha sete selos. Todos eles precisavam ser removidos antes que o livro fosse aberto.
Eu acho que a abertura do livro representa os últimos dias da história e a retirada dos sete selos representa o tipo de história que viveremos à medida que nos aproximarmos desses dias.
A princípio, João chorou pois não havia ninguém digno de abrir o livro e nem de olhar para ele (5.4). Mas, então, o ancião no céu diz: “Não chores; eis que o Leão da tribo de Judá, a Raiz de Davi, venceu para abrir o livro e os seus sete selos” (5.5).
Ao morrer na cruz, Jesus conquistou o direito de abrir o restante da história redentora e conduzir o seu povo vitoriosamente através dela.
No próximo verso, o Leão é retratado como um Cordeiro, “de pé… como tendo sido morto” (5.6). Essa não é uma bela imagem da vitória de Jesus na cruz?
É tão certo como se um leão tivesse devorado o inimigo — mas a maneira como ele conseguiu a vitória foi deixando o inimigo matá-lo como um cordeiro!
Portanto, agora o Cordeiro é digno de tomar o livro da história redentora da mão de Deus e abri-lo. Esse é um ato tão digno de um rei que os vinte e quatro anciãos do céu (o conselho de adoração de Deus, por assim dizer) se prostram diante do Cordeiro em adoração.
E você sabe o que são as taças de ouro cheias de incenso? O versículo 8 diz que elas são “as orações dos santos”. Isso não significa que nossas orações são o aroma do céu, aroma agradável diante do trono de Deus e do Cordeiro?
Sou fortalecido e encorajado a orar com mais frequência e vigor, quando penso que minhas orações estão sendo reunidas e armazenadas no céu, e oferecidas a Cristo repetidamente em atos celestiais de adoração.
Bendigamos, honremos e adoremos a Cristo aqui em baixo com nossas orações e, depois, alegremo-nos duplamente que o conselho de adoração do céu as oferece novamente a Cristo como aroma agradável de incenso diante do Cordeiro que foi morto.
Versículo do dia: Eu chorava muito, porque ninguém foi achado digno de abrir o livro, nem mesmo de olhar para ele. (Apocalipse 5.4)
Você já pensou em suas orações como o aroma do céu? A Semana Santa me atraiu novamente para ler Apocalipse 4 e 5. Aqui há um vislumbre da vida no céu.
Em Apocalipse 5, vemos o Deus todo-poderoso no trono com um livro em sua mão. O livro tinha sete selos. Todos eles precisavam ser removidos antes que o livro fosse aberto.
Eu acho que a abertura do livro representa os últimos dias da história e a retirada dos sete selos representa o tipo de história que viveremos à medida que nos aproximarmos desses dias.
A princípio, João chorou pois não havia ninguém digno de abrir o livro e nem de olhar para ele (5.4). Mas, então, o ancião no céu diz: “Não chores; eis que o Leão da tribo de Judá, a Raiz de Davi, venceu para abrir o livro e os seus sete selos” (5.5).
Ao morrer na cruz, Jesus conquistou o direito de abrir o restante da história redentora e conduzir o seu povo vitoriosamente através dela.
No próximo verso, o Leão é retratado como um Cordeiro, “de pé… como tendo sido morto” (5.6). Essa não é uma bela imagem da vitória de Jesus na cruz?
É tão certo como se um leão tivesse devorado o inimigo — mas a maneira como ele conseguiu a vitória foi deixando o inimigo matá-lo como um cordeiro!
Portanto, agora o Cordeiro é digno de tomar o livro da história redentora da mão de Deus e abri-lo. Esse é um ato tão digno de um rei que os vinte e quatro anciãos do céu (o conselho de adoração de Deus, por assim dizer) se prostram diante do Cordeiro em adoração.
E você sabe o que são as taças de ouro cheias de incenso? O versículo 8 diz que elas são “as orações dos santos”. Isso não significa que nossas orações são o aroma do céu, aroma agradável diante do trono de Deus e do Cordeiro?
Sou fortalecido e encorajado a orar com mais frequência e vigor, quando penso que minhas orações estão sendo reunidas e armazenadas no céu, e oferecidas a Cristo repetidamente em atos celestiais de adoração.
Bendigamos, honremos e adoremos a Cristo aqui em baixo com nossas orações e, depois, alegremo-nos duplamente que o conselho de adoração do céu as oferece novamente a Cristo como aroma agradável de incenso diante do Cordeiro que foi morto.
Devocional Do Dia - Charles Spurgeon
Versículo do Dia: “Dizia eu na minha prosperidade: jamais serei abalado.” (Salmos 30.6)
“Moabe…tem repousado nas fezes do seu vinho; não foi mudado de vasilha para vasilha” (Jeremias 48.11). Deem a alguém riquezas e façam com que seus navios lhe tragam constantemente ricas mercadorias. Que os ventos e as ondas apresentem-se como servos dele, e conduzam os navios através do profundo e forte mar. Façam com que as terras desta pessoa produzam em abundância e que o clima seja propício às suas colheitas. Permitam que o sucesso lhe sobrevenha ininterruptamente; que seja entre os homens, um negociante bem-sucedido. Façam com que ele desfrute de saúde constante e deem-lhe um coração feliz. Deem-lhe um espírito esperançoso; que ele tenha perpetuamente, uma canção nos lábios. Permitam que seus olhos estejam sempre brilhando com regozijo. Mesmo se tratando do melhor crente que já existiu, a consequência natural de tal estado de tranquilidade será a presunção.
O próprio rei Davi afirmou: “Jamais serei abalado”. E não somos melhores do que ele, nem mesmo tão bons quanto ele. Se, na jornada, você está passando por lugares tranquilos, acautele-se. Se o caminho é áspero, agradeça ao Senhor por tal caminho. Se Deus sempre nos firmasse no cavalete da prosperidade, se sempre houvesse poucas nuvens no céu, se em todos os momentos tivéssemos gotas doces no vinho desta vida, ficaríamos intoxicados com os prazeres. Pensaríamos estar de pé, sim estaríamos de pé, mas no alto de um pináculo. Assim como o homem que dorme no mastro, estaríamos em perigo a cada momento. Bendizemos a Deus em nossas aflições; agradecemos-Lhe por nossas mudanças; exaltamos o seu nome na perda da prosperidade, pois sentimos que, se Ele não nos tivesse disciplinado deste modo, poderíamos ter ficado excessivamente seguros. A contínua prosperidade mundana é uma prova de fogo.
As aflições, embora pareçam severas, sempre são enviadas em misericórdia.
“Moabe…tem repousado nas fezes do seu vinho; não foi mudado de vasilha para vasilha” (Jeremias 48.11). Deem a alguém riquezas e façam com que seus navios lhe tragam constantemente ricas mercadorias. Que os ventos e as ondas apresentem-se como servos dele, e conduzam os navios através do profundo e forte mar. Façam com que as terras desta pessoa produzam em abundância e que o clima seja propício às suas colheitas. Permitam que o sucesso lhe sobrevenha ininterruptamente; que seja entre os homens, um negociante bem-sucedido. Façam com que ele desfrute de saúde constante e deem-lhe um coração feliz. Deem-lhe um espírito esperançoso; que ele tenha perpetuamente, uma canção nos lábios. Permitam que seus olhos estejam sempre brilhando com regozijo. Mesmo se tratando do melhor crente que já existiu, a consequência natural de tal estado de tranquilidade será a presunção.
O próprio rei Davi afirmou: “Jamais serei abalado”. E não somos melhores do que ele, nem mesmo tão bons quanto ele. Se, na jornada, você está passando por lugares tranquilos, acautele-se. Se o caminho é áspero, agradeça ao Senhor por tal caminho. Se Deus sempre nos firmasse no cavalete da prosperidade, se sempre houvesse poucas nuvens no céu, se em todos os momentos tivéssemos gotas doces no vinho desta vida, ficaríamos intoxicados com os prazeres. Pensaríamos estar de pé, sim estaríamos de pé, mas no alto de um pináculo. Assim como o homem que dorme no mastro, estaríamos em perigo a cada momento. Bendizemos a Deus em nossas aflições; agradecemos-Lhe por nossas mudanças; exaltamos o seu nome na perda da prosperidade, pois sentimos que, se Ele não nos tivesse disciplinado deste modo, poderíamos ter ficado excessivamente seguros. A contínua prosperidade mundana é uma prova de fogo.
As aflições, embora pareçam severas, sempre são enviadas em misericórdia.
segunda-feira, 3 de abril de 2017
MENTE E CORAÇÃO AQUECIDOS: O LUGAR DAS ESCRITURAS NA EXPERIÊNCIA CRISTÃ
Por Eliandro da Costa Cordeiro
Leitura: Texto: Lc. 24:13-35, 44-53
Emaús
Sempre és o hóspede – nunca és o rei.
Muito mais derrotado que vitorioso.
Quando chegas e bates ao meu coração
Eu não te reconheço – há luz demais –
Debruço-me sobre as gravuras do caminho.
Quando te afastas – acompanhado pelo peixe azul –
Quando as formas se movem como num aquário,
Então eu levanto enternecido a lanterna
E logo começo a desejar que voltes,
Fascinado pela tua obscuridade.
– Murilo Mendes, Mundo Enigma (1942)
Discernir a espiritualidade cristã do misticismo nem sempre é fácil. O rev. Augustus Nicodemos percebe que o misticismo está muito próximo à tendência dos teólogos liberais, pois ambos buscam uma “espiritualidade” sem a mediação das Escrituras. Assim, infere-se que entre o místico e o espiritual estão as Escrituras como base à experiência, e não o seu contrário.
Não há dúvidas de que a Fé Cristã é em seu conteúdo mística. Pensemos, por exemplo, na ceia; o pão e o vinho não são o símbolo da fé no Salvador (Mc14. 22; Lc 22.19; 1Co 10.16; 11.27)?
O problema é que o homem se inclina a dar ao místico uma certa compreensão irracional; isto é, o “espiritualmente místico” se torna em místico-fenomênico. Deus pode ser tocado, visto, “cheirado”, pois se torna parte de uma realidade irracional da (im)compreensão da religião. E assim, a razão humana supera-se saltando de sua limitada capacidade de pensar Deus para o deus tangível, fruto de seus pensamentos (Gn 11.1ss; Rm. 1.23, 1Ts. 2.4).
Ora, diz Augustus Nicodemus:
Creio que o misticismo bíblico – união com Cristo realizada na sua morte, vivida pelo Espírito, celebrada na Ceia e vivenciada pelo uso dos meios de graça – continua sendo o padrão para os cristãos. O que falta em muitos é a disposição para vivê-lo.
É esta espiritualidade sadia, mística, mas não exotérica, que as Escrituras nos evocam (Rm. 12.1,2; 1Co 14.15,19). Uma atitude corajosa de se agarrar à Palavra de Deus e balizar o mundo por Ela (Rm 1.8; Ef 3.9).
Assim, embora a ressurreição exija fé, exige também a compreensão da fé. E o projeto de Lucas neste evangelho se vê assim. Lucas faz um laborioso e inteligente relato. Trata-se de uma narrativa de estrutura ‘parabólica’, com alguns reflexos de diatribes (quiçá, herança paulina).
As narrativas acerca da ressurreição seguem uma estrutura que não permite a dicotomia entre Ressurreição e as Escrituras. Todavia, esta estrutura também aponta para o fato de que sem a Ressurreição as Escrituras não atingem o seu ápice lógico e profético; isto é, soteriológico (Mt 16.21; 26.54,56; At.17.3; Rm 16.26; 1Co 15.4).
O fim principal desta dependência recíproca é a internalização de uma única verdade: Deus veio aos homens na Pessoa de seu Filho, a fim de conduzi-los a Ele perfeitamente aceitáveis (Ef.5:27; Col.2:10; 1Pe.2:5; Jd 24; Hb.9:24; 10.1).
Veja como que esta Verdade se torna destituída de significado caso não existisse correspondência, dependência mútua entre Escritura e Ressurreição (1Co 15.14-17).
Lucas tira o foco de todas as aparições narradas nos outros evangelhos e o põe num só dia e lugar: Jerusalém. É desta cidade que os discípulos fogem e é para lá que devem voltar. Nela está o cenário do propósito redentor de Deus (Mt 2.1; 16.21; 20.18).
É de Jerusalém que os discípulos deverão partir corajosamente, a fim de pregar as boas novas. Mas antes, deverão entender esta mensagem ensinada pelo Senhor, cuja crucificação recebe o poder que se eleva à vergonha e horror da fé judaica (Lc 9.31; 24.47; At.1.4,8; 10.39). E é neste aspecto que Escrituras e as experiências advindas destas caminham juntas (Sl 119.9,11,25,50,133; Jo.17.17).
E é assim que a verdade resulta clara: a base de toda a experiência cristã deve ser as Escrituras (At.17:11; 2Tm.3:16).
Tal verdade pode ser diligentemente observada na exposição que Lucas faz acerca da conversação entre os dois discípulos a caminho de Emaús e o “ilustre Desconhecido”. É possível acompanharmos a cada passo neste caminho o modo como o “Desconhecido Caminhante” traz os “caminhantes” de volta à fé em Cristo, tão somente apontando e rememorando o que o Mestre havia dito acerca das Escrituras.
Da narrativa lucana pode-se extrair a implicação da Escritura na experiência dos discípulos. Tal implicação resulta significativamente na necessidade de tê-la pautando o nosso mudus vivendi da Fé Cristã. Vejamos, pois, pelo menos três delas:
I-A experiência cristã sem as Escrituras perde o significado (23,24,26-27)
As Escrituras só dão significado à realidade se estudada no seu todo e o seu todo tem como ápice a ressurreição (Lc 4.1ss; At 28.23; Rm 15.4; 2Tm 3.16).
Lucas tem vital interesse em apontar, narrativamente, “como Deus executa o seu plano em conformidade com o estabelecido na antiga promessa” (Lc1. 70). Vê-se frequentemente a expressão: “para que se cumprissem as Escrituras […].” Jesus expõe a necessidade das Escrituras a citar desde Moisés aos profetas.
Kaiser nos lembra de que isto (a necessidade de ampliar o conhecimento dos homens quanto a Verdade do cumprimento das Escrituras em virtude da ignorância humana) ocorre frequentemente não só no Evangelho de Lucas, mas está por todo o livro de Atos dos Apóstolos [eg. At.26.22,23] (W. Kaiser, O Plano da Promessa de Deus, p. 339).
Conforme Fabris e Maggioni,
Lucas se apressa em reler todos os particulares da crucificação e morte de Jesus através da grade dos textos bíblicos, em particular dos salmos […], (e.g: Sl. 22.19; 69.22; 31.6; 38.12; 88.9).
Observemos que os dois discípulos de Lucas 24 conversam com o ‘Desconhecido Caminhante’ e dizem o que esperavam de Jesus: “Varão poderoso em palavras e obras, que iria libertar o seu povo […].” Contudo, a exposição versa apenas parte das Escrituras. O sofrimento, a cruz, o pecado que o Messias tomaria sobre si, bem como a ressurreição, são ignorados (Mt 16.21; Lc 24.26,46; At 17.3)!
Esta perspectiva teológica das Escrituras não é totalmente suficiente para trazer a lume o significado da agradável sensação de ardume nos corações dos homens que ouvem o Estranho no caminho. O coração de Cléopas arde juntamente com a tristeza da morte de Jesus, confundindo as experiências às emoções e à realidade de uma teologia incorporada a um contexto de fé teo-político.
A literatura lucana é bela de significados (o que se observa sem o recurso de alegorias, mas que parece sempre querer dizer na mente do seu leitor mais do que se narra). Agostinho não resiste à provocação de Lucas e se rende: “O Mestre acompanha-os pelo caminho, Ele próprio é o Caminho; mas eles ainda não estão no verdadeiro Caminho.” Cristo estava vivo, mas os discípulos com a esperança morta. Que contraste entre a fé nas Escrituras e naquilo que se vive e vê!
Agostinho nos faz entender que, o Cristo que ressuscitou na tumba fria, deveria ressuscitar também nos corações cegos desses discípulos que não entendiam o plano divino. Têm a esperança assassinada por uma fé que espera alívio existencial nada além da sua concepção da vida (Rm 8.25; 1Co 15.19). Somente a compreensão das Escrituras preencheria de vida o coração desses homens (Pv 19.16; Jo 4.10; 6.55; 7.38; Rm 7.10).
Jesus durante o trajeto a Emaús expõe sabiamente a Escritura à altura do intelecto desses discípulos. Isto porque o Deus/Homem entra neste mundo apercebido de todas as mazelas humanas e sabe como ninguém utilizar-se da linguagem humana com o propósito de apontar, conscientizar e eliminar tais mazelas do coração humano (Rm. 8.3; Fl. 2.1ss; Hb 2.14-18; 4.15).
Ele sabe traduzir a linguagem do coração humano, bem como lê-la em amor (Jo 2.25; Hb 2.11): “O que é que vocês conversam?”, pergunta o Salvador aos homens que seguem incrédulos o caminho da ignorância da ressurreição.
Ora, o que se fala no “caminho” é aquilo que nos enche o coração; isto é, a realidade (Lc 6.45). As conversas do caminho buscam o consolo dentro de uma realidade que parece hostil à fé. O lugar da Ressurreição e das Escrituras é mostrar que a realidade é bem mais ampla para o Cristianismo do que para qualquer outra religião ou concepção de vida (Jo 11.25; Rm 8.31ss; Ef. 1.20; 2.6; Hb. 11.1ss).
O que se pode considerar como realidade nem sempre condiz com a verdade. A Verdade está além de uma concepção dita como real, haja vista que sempre nos enganamos. Deste modo, a Verdade, independentemente de meu juízo, existirá e há de se revelar (Jo 8.45; Gl 5.7; 2Tm 2.4; 1Jo 2.21; 2Co 13.8).
Morris acredita que os dois discípulos conversavam pelo caminho a fim de aliviar um pouco a tristeza. Procuravam na reciprocidade um pouco de consolo. Isto é notado no versículo 14 – “No caminho, conversavam (discurso) a respeito de tudo o que havia acontecido”; “Eles iam falando entre si e fazendo perguntas um ao outro” (ARC).
Todavia, a grande verdade é que nem sempre a troca de ideias ou experiências nos ajuda a entender a vida. Os discípulos precisavam entender o que havia dado errado bem como se agarrar ao pouco de esperança que nutriam conversando um com o outro. Estes homens deveriam aprender o modo como a Escritura auxilia o discípulo na esperança da ressurreição. Ela se tornará fundamental à incipiente comunidade da fé (Lc 20.36; At 24:15; Rm 6:5; 11:15).
Mas precisam romper com a ideia messiânica que evade a dor e sofrimento. Precisam entender a derrota da cruz (Mt 16.21; At 3.18; 26.23; Hb 9.26).
Jesus torna as Escrituras significativas no caminho daqueles homens; isto é, no presente, na caminhada. Ela não é um escrito do passado. As Escrituras têm o seu cumprimento no hoje desses dois caminhantes errantes. É o passado se desdobrando sempre novo à frente das esperanças humanas (Sl 119.105; Is 40.8; 1Pe 1.23).
J. MacArthur declara que,
A pureza e a clareza da Bíblia produzem o benefício de “alumiar os olhos”. Ela provê iluminação no centro da escuridão moral, ética e espiritual. Ela revela o conhecimento de tudo que não pode ser realmente visto de outra forma (cf. Pv 6.23). Uma das razões essenciais de que a Palavra de Deus é suficiente para todas as necessidades espirituais humanas é que ela não deixa dúvidas a respeito da verdade essencial. A vida por si só já é confusa e caótica. Procurar a verdade fora da Bíblia só aumenta a confusão. As Escrituras, em contraste com tudo isso, são muito claras (Pense biblicamente).
Jesus deve esclarecer aos discípulos o significado de todos os testemunhos que os dois discípulos ouviram. Tiveram várias evidências, mas o que são elas aos olhos que só se abrirão mediante o poder da Palavra? Observemos que a pedra estava removida, anjos foram vistos e ouvidos, mulheres testemunharam, Pedro viu o túmulo vazio. Por que não creram?
Fábris e Maggioni nos explicam que,
[…] a morte de Jesus já não é mais um incidente absurdo, mas o cumprimento de um projeto de salvação já revelado por Deus na Escritura. É esta interpretação teológica que torna a narração da morte não uma página de crônica macabra, mas o anúncio da salvação para os crentes (Os Ev. II, R. Fábris e B.Maggioni).
É este cumprimento veterotestamentário que foge à compreensão: não só dos dois discípulos a caminho de Emaús, mas de todos os discípulos até a ressurreição e a sua interpretação feita por Jesus (Mt. 26:31ss).
II- As Escrituras devem anteceder as experiências (28ss)
Quando as Escrituras assumem o seu lugar, torna-se claro que a fé e a compreensão dos fatos bíblicos nos faz ver Cristo conosco, ainda que não o vejamos com os olhos físicos (2Tm 4.10,16-18). E esta aplicação é lúcida, pois,
Quando o Senhor começou a falar com eles, os discípulos ainda não tinham fé. Eles ainda não acreditavam na sua ressurreição; nem esperavam sequer que ele pudesse ressuscitar. Tinham perdido a fé; tinham perdido a esperança. Eram mortos que caminhavam com um vivo; caminhavam mortos, com a vida. A “vida caminhava com eles, mas em seus corações, a vida ainda não tinha sido renovada.” (Agostinho)
Jesus caminhou com os confusos e desiludidos discípulos cerca de onze quilômetros expondo-lhes as Escrituras.
Expor-lhes as Escrituras parece ter-lhe sido mais necessário no percurso do que a imediata revelação de sua ressurreição aos confusos companheiros de estrada. Só no final do percurso, já hóspede desses homens, Jesus se revela. Por qual razão? Porque é assim que Ele deve ser conhecido pelos homens: primeiro como cumprimento das Escrituras; depois, como aquele que se pode experimentar do prazer justificado por corações em brasas!
Quando o coração ardia? Eles dizem: “Porventura não ardia em nós o nosso coração quando, pelo caminho, falava conosco e quando nos abria as Escrituras?” (24.32). O coração desses discípulos ardia, mas por quê? O que significa um coração que arde com as Palavras que não lhes trazem entendimento? Somente toda a Escritura explanada traz sentido ao coração em brasas! É o que o Mestre procura fazer durante o caminho.
Há uma Revelação que progride ao longo do caminho, o que torna a Verdade de Deus mais clara. Cristo lhes fala pelo caminho, seus corações ardem ao ouvi-lo, mas eles só têm os olhos abertos no final do percurso. Jesus guarda-se de revelar a sua Pessoa a eles, por quê? Experiências a parte da exposição das Escrituras são “fogo de palha.”
Parece-nos que, para Jesus, explicar aos discípulos as Escrituras era bem mais importante do que se revelar a estes. Ele compreende bem o paradoxo experimentado pelos discípulos no caminho: têm-se no caminho tanto as Escrituras quanto o seu cumprimento; isto é, o Cristo ressurreto. Mas tal paradoxo só é ‘compreendido’ mediante o coração que arde e a mente que absorve os ensinamentos de Deus.
Concordemos com Schroeder ao afirmar que,
Jesus havia querido, primeiramente, permanecer desconhecido para os discípulos a fim de instruí-los pelas Escrituras, antes de convencer-lhes por uma manifestação exterior, apropriada para impressionar seus sentidos (Comentario del Nuevo Testamento, L.Bonnet Y A. Schroeder).
A lógica é simples: uma vez passado o momento do alívio ou a memória da experiência, se exigirá uma outra que lhe satisfaça com maior vigor a carência causada pela primeira. E, neste momento, podemos nos perguntar se conseguiríamos trilhar o caminho da mudança da história, de acontecimentos contraditórios ou frustrações teológicas, amparados somente pela Escritura (2Co 11.4; Gl. 1.7,8)?
Àqueles que acreditam que as Escrituras devem a sua autenticidade às experiências (Lc 16.27-31), consideremos o que diz Lutero:
Fiz uma aliança com Deus: que Ele não me mande visões, nem sonhos, nem mesmo anjos. Estou satisfeito com o dom das Escrituras Sagradas, que me dão instrução abundante e tudo o que preciso conhecer tanto para esta vida quanto para o que há de vir.
O fato de Jesus ter entendido ser urgência maior a sua exposição das Escrituras antes de sua manifestação aos discípulos de Emaús estabelece, não só o valor, mas também a sua experiência particular na meditação dos Escritos Sagrados. Otto Borchert diz algo interessante sobre o relacionamento de Jesus com as Escrituras em seu ministério:
Ouvimos falar muito daqueles anos da Sua vida dos quais temos mais notícias, mas nunca ouvimos falar que ele usou essas horas de solidão para ler. O seu estudo da Escritura, portanto, deve ter precedido a Sua vida de ação, mas nos anos de semeadura e combates, Ele viveu essencialmente do que havia adquirido, tirando-o do tesouro da Sua memória. […] Jesus encontrava Deus na Bíblia, a cada vez que a lia entrava em comunhão viva com Seu Pai (O Jesus histórico, p. 176,177).
Os discípulos colocaram a experiência à frente da Escritura: viram com seus olhos a Cristo, mas não o conheceram. Isto porque nem sempre o Cristo da experiência é o Cristo da Ressurreição.
Todavia, veja como o Senhor os trata e se relaciona com esses. Cristo segue perguntando, conversando, observando que estão tristes e se importando com a sua fé. Esses discípulos deverão entender o que significam as palavras de seu Mestre, ouvidas e pregadas durante três anos (Mt 26.55; Jo 14.9).
Que experiência no caminho! Que sentido faz a vida pautada pelas Escrituras! E que sentido faz um coração bater de emoção se no final a Verdade está sepultada?
O Rev. Valdir Oliveira, sobre esta passagem, aconselha àqueles que se frustraram no caminho a não colocarem a esperança naquilo que Deus não prometeu em sua Palavra. Isto por que Cléopas e o outro discípulo evitaram as palavras da morte e ressurreição de Jesus dando maior importância à vitória do Messias somente numa esfera político-teocrática (9.21,22; 24.21).
A esperança desses discípulos no Cristo projetado por seus anseios, e não nas palavras do Mestre, causou-lhes a decepção natural de quem costuma hiatizar a fé da razão.
J. MacArthur afirma incisivamente que
A falta de saída para os difíceis problemas da vida não é o resultado de inadequação das Escrituras; é o resultado da inadequação das pessoas no estudo e aplicação da Palavra. Se as pessoas amassem a Palavra de Deus como deveriam, ninguém jamais questionaria a suficiência da Bíblia (Pense biblicamente).
III-Somente nas Escrituras descobrimos de fato, quem é Jesus (21,25)
“Fica conosco senhor”, pedem os discípulos. Ele já estava, mas os olhos nada entendem sem o amparo das Escrituras (Mt 28.20; Jo 14.16,26; 16.7).
Se não se mostrasse, como é que os discípulos poderiam ouvir a sua pergunta e responder-lhe? Caminha com eles e parece segui-los, mas é Ele quem os conduz. Veem-no, mas não o reconhecem, “porque os seus olhos, diz o texto, estavam impedidos de O reconhecer… A ausência do Senhor não é uma ausência. Crê somente e Aquele que não vês estará contigo.” (Agostinho)
Jesus apresenta-lhes todo o conteúdo sagrado; isto é, Deus está no controle e o túmulo vazio está repleto de significado e história (Mt 25.34; Ef 1.4; Hb 9.26; Ap 5.12; 13.8). Uma vez aberto os olhos, Cléopas e o outro discípulo voltam a Jerusalém. Não é isto que significa ressurreição? Volver a Jerusalém, onde toda a história dos homens encontra o seu significado (Rm 11.36)?
De fato, conhecer o Cristo ressurreto das Escrituras é apaixonar-se (2Co 5.14; Fl 3.7,8). É querer que ele esteja sempre ao alcance de nossos olhos, de nossos sentidos. Não é debalde que o versículo 14 nos apresenta os discípulos desejosos de que o ‘Homem do caminho’(Cristo) permanecesse mais um pouco com eles. Cristo ainda se esconde na torpeza de seus entendimentos, mas a alma anseia enxergá-lo. Por quê? As Escrituras foram entendidas. Cristo, Completo Deus/Homem, o Salvador revela todo o sentido da história e dissipa toda a ideia de que a vida não faz mais sentido (Rm 10.4; Ap 22.13). A fé supera as emoções (Hc 3.17).
O Cristo ressuscitado levou os dois discípulos do diálogo no caminho ao reconhecimento de sua divindade. Conheceram a Jesus caminhante como homem, mas agora o RECONHECERÁ como o Deus/Homem. Louvemos a Deus por aquilo que a Palavra de Deus nos dá acerca do Salvador! Ele não é o derrotado na Cruz. Ele é o Deus Vivo (1Co 15.54,55)!
De repente, ele se apresenta. “Jesus aproximou-se e ia com eles”, a delicadeza do Verbo é pura poesia. O Mestre começa sua aula magna. Interroga, comenta, expõe as Escrituras. Fala de si mesmo com tamanha humildade que passa despercebido pelos olhos. Mas não pelo coração. Sem alarde, o coração denuncia a santidade que caminha ao lado.
Encanta-me a doce insistência divina em revelar-se para a nossa vagarosa inteligência. O testemunho das mulheres, a comprovação ocular dos outros discípulos que foram ao túmulo, a chama ardendo no peito, tudo isso, mas uma espécie de casca impermeável parece obstruir a claridade da revelação. Ainda bem que ele é luz! Compreendo aqueles dois porque sou exatamente assim. Lento, sou um peregrino a buscar, vasculhar, ler, pesquisar alucinadamente. O peito arde, mas os olhos protestam”. (Alan Brizotti)
Ora, quando as Escrituras antecedem às experiências pessoais, estas responderão às exigências daquela. Estas exigências são o resultado natural da ação das Escrituras no intelecto e coração (se de fato os pudermos separar) do discípulo.
Trata-se de uma exigência progressiva, que por si só já é a verdadeira experiência cristã; ou seja, uma vez entendida a ressurreição, Cristo é visto sempre entre o seu povo em seus corações, mediante olhos da FÉ (Mt 18.20; Jo 20.29).
A experiência das Escrituras obrigam os discípulos a nutrirem um novo tipo de relacionamento com Cristo. Depois de sua ressurreição, a realidade que Jesus traz ao mundo é totalmente outra. Somente será possível o seu relacionamento com os crentes pela fé (Rm 1.17; 5.1; Ef 3.12,17; 2Co 5.7; Gl 3.26; Hb 11.6).
O versículo 31 nos informa que Jesus some; por quê? Ora, uma vez que Jesus deixou claro o cumprimento das Escrituras, será a fé quem guiará os corações na chama da ressurreição! Tem-se por base os relatos do texto sagrado (Rm 10.4; Gl. 3.24)!
Lembremos a narrativa joanina, correlata ao texto lucano. No Evangelho de João (cap. 20) Cristo censura a incredulidade de Tomé, mas não parece tê-la feito a Pedro e João que, igualmente, tiveram que ‘ver para crer’. O texto joanino parece endossar a ideia de que Tomé recebera, agora, tanto o testemunho dos discípulos (João e Pedro), como o do próprio Senhor em aparição no meio deles. Trata-se de um testemunho duplo. A nova condição do Senhor ressuscitado exige também nova condição para ser encontrado (Lc 24.5; Jo 20.17).
Os discípulos chegaram à fé, mas não ainda à fé completa, cujas bases são o testemunho e as Escrituras. E não é diferente com os crentes. É caminhando com Jesus e a exposição de sua Palavra, dia a dia, que temos os nossos olhos abertos. Até, então, os discípulos trataram Jesus como um viajante à sua semelhança. Antes de ter as Escrituras aberta (Lc 24.45) nosso Senhor era mais um no caminho com esses discípulos: perdido, frustrado.
A nova realidade, trazida na ressurreição, exige que o coração que arde com a sua Palavra deve aprender a ler a história com “novos olhos”. Para tal é necessário percorrer todo o caminho que leva ao reconhecimento de Jesus: “a escuta da Palavra que muda coração” (Fábris e Maggioni).
Contudo, os dois caminhantes no relato dos fatos a Jesus, durante o percurso a Emaús, demonstram que tipo de fé nutria no Mestre: “Jesus era o homem de Nazaré, profeta poderoso em obras e palavras […]” (Lc. 24.19). Mas não era Deus? Trata-se de uma “boa teologia” frustrada. Contudo, é este o fim de boas teologias sem bases bíblicas.
Observe o diálogo de Jesus com os dois. A princípio, Jesus apenas pergunta e eles expõem as suas esperanças teológicas frustradas. Depois, Cristo expõe outra perspectiva teológica: a Ressurreição. É outro modo de ver a vida e o seu vazio de significado. Basta que se observe a trajetória dos discípulos após a conversa com Cristo. Uma vez levados à compreensão das Escrituras, convencidos de que a interpretação que ouvira era de fato coerente, são renovados e se põem a caminho de volta a Jerusalém.
A simultaneidade da descoberta é encantadora. Ao término de todo o movimento textual; isto é, explicação da Palavra, chega-se à visão daquele que sempre estivera ao alcance de seus olhos. São duas verdades de uma mesma realidade. Cristo está com eles, mas não veem. Depois, Cristo não mais lhes está ao alcance dos sentidos, mas pode ser visto. Entenderam que o túmulo vazio representa a plenitude da presença de Jesus no coração dos crentes. Nunca o vazio esteve tão repleto de vida e significado.
Coração e mente funcionam juntos ao som das Palavras de Jesus, naquele caminho. E ao final de toda a exposição, Cristo desaparece, mas o coração e a mente são capazes de regressarem onde tudo começou. E isto é assim, pois, descobrir o Cristo das Escrituras é regressar à origem, é recomeçar e buscar a comunhão com o seu povo. É contar a alegria da vida (Lc 24.52)!
Entender as Escrituras e experimentar da Ressurreição é redescobrir todo o cenário do amor divino. O objetivo de Jesus era o de fazê-los retornar a Jerusalém e reincorporarem o número dos discípulos em seus relatos acerca da visão do Cristo ressuscitado (Lc 24.33,35).
Observemos como Jesus distrai os olhos desses homens voltados para o aqui e os eleva às Verdades Eternas. “Do que vocês estão falando”? “O que dizem as Escrituras, pergunta Jesus”. Trata-se de uma pergunta que implica em convicção não no rumo em que a história parece tomar, mas naquilo que a Palavra diz que tomará.
A realidade que os discípulos enfrentavam apontava para a vitória da morte. Transformara a verdade em mentira. mas é nesse momento que se deve perguntar: o que dizem as Escrituras? Isto é essencial porque a nossa esperança pessoal e teológica frustradas não implica numa cruz que derrota a Cristo ou num túmulo que o impeça de caminhar junto ao crente em angústias ou frustrações.
Não levemos em nossa caminhada os velhos sapatos da incredulidade ou a leitura da vida pelos noticiários da TV. Ao contrário, busquemos um coração que arda em sentido a partir da ressurreição.
Murilo Mendes acertadamente declara o Cristo que viu neste texto. E assim o divide: 1- O Cristo companheiro, sempre interessado na relação. “Ser amigo é repartir a vida.”; 2- Cristo hóspede; 3- Cristo das Escrituras.
Desconhecer as Escrituras é o mesmo que desconhecer a Cristo, pois são elas que dele testificam! (?) Este Cristo no caminho de Emaús é o paradoxo da discrição e penetrante, delicado e severo, humilde e sábio, Sofredor e vitorioso. Conhecemos este poderoso servo sofredor que demonstra no sofrimento seu grandioso poder, que vence em se revelar servo, sendo verdadeiro Rei?
Os discípulos devem, agora, voltar e relatar toda sua experiência no caminho. Mormente, a experiência esteve repleta de significado e embasada pelas Escrituras explicadas pelo próprio Senhor.
Se por quiasmo ou diatribe não o sei, mas não parece ser por acaso que, depois que os discípulos tiveram os seus olhos abertos, Cristo tenha desaparecido! Por quê? “Jesus abriu a mentes deles para entenderem as Escrituras” (v.45). É a Palavra de Deus quem os deverá guiar, agora.
Carmem Lussi comenta que a palavra Caminho é de importante significado para Lucas. Aponta os dois discípulos de volta a Emaús e, depois da aparição de Cristo, a necessidade de retornarem a Jerusalém. Pois,
É ali que os discípulos missionárias/os desanimados recebem a confirmação que de fato o Senhor ressuscitou, pois o calor no coração quando Jesus explicava as Escrituras no caminho fazia parte do percurso de retomada da fé […].
No final da caminhada os discípulos são chamados para irem além de suas experiências e não sem elas, mas agora, explicadas e explicitadas. “Lucas repete duas vezes na mesma perícope (v. 27 e 45): Jesus mesmo quem nos revela o sentido da Palavra, porque é necessária a escuta da Palavra e porque, sem ela, fica difícil manter fidelidade e alegria no discipulado. Anunciando a eles o essencial da fé (v. 47-48), a falta do anúncio da necessidade da cruz e da acolhida existencial deste anúncio cria comunidades de “fogo de palha”, sem raízes profundas, que os espinhos e o sol facilmente eliminam e neutralizam o potencial.” (Carmem Lussi).
O que torna-se mais importante na vida do discípulo que é guiado pela exposição das Escrituras no caminho? Ao invés de falar da “aparição de Jesus”, os dois narram sobre “o que tinha acontecido no Caminho”. Agora sim, temos as experiências valorizadas. Todavia, a base dos relatos das experiências são as Escrituras.
É necessário perfazer o caminho de volta a Jerusalém. Ouvir, ler e entender o plano de Deus no Filho, a fim de proclamá-lo ao mundo. Em Jerusalém receberão o poder do Espírito outorgado nos méritos de Cristo ; depois disto, hão de proclamar o maior acontecimento da história: Cristo vive (Lc 24.47-53).
O itinerário de Lucas é uma evolução até que se entenda o ápice messiânico; ou seja — Ressurreição. Conforme Ladd,
No N.T. a ideia e a esperança da ressurreição gira inteiramente em torno da ressurreição de Jesus […] sua ressurreição significa que ele aboliu a morte e trouxe à luz a vida e a imortalidade, ‘por meio do Evangelho’.
É como o cumprimento das Escrituras que o Cristo será levado a todos os povos.
O relato evangélico que a Bíblia descreve sobre o encontro de Jesus com os discípulos no caminho de Jerusalém para Emaús revela o itinerário da fé alicerçada na Palavra de Deus. A estrada de Emaús, na qual caminhavam os dois discípulos de Jesus, nada mais é do que a estrada da vida de cada um de nós, com tudo o que nela acontece. É neste caminho que aprendemos a lidar com a vida e ter um encontro com Jesus. O Ponto Fraco Nosso e dos Discípulos – Meditação do fato de que não lemos a bíblia, com entusiasmo, apenas nos contentamos com uma leitura superficial da Palavra, nos cultos diários. Mas, o que vem a ser realmente o entusiasmo? Sua origem é grega significando “cheios de Deus”. É um processo para que o coração fique ardendo, aquecido e pegando fogo. Portanto, tudo vai mudar em nossas vidas se vivermos com o coração vivificado e olhos aberto, veremos a gloria de Deus.”(Rev. Ultimato)
O lugar da experiência cristã na ressurreição, Nas palavras de D. Ewert:
A certeza de nossa esperança na ressurreição dentre os mortos repousa, antes de tudo, sobre os ensinos de Jesus e de seus apóstolos. Mas fundamentalmente ainda, ela escuda-se sobre a ressurreição do nosso Senhor Jesus. (Então virá o fim, p.110).
O que as Escrituras nos ensinam acerca da ressurreição do Salvador? A morte não é aquilo com quem eu devo me confrontar no final da vida, mas a própria Vida quando não mais existir a morte (1Sm20.3). Quando, enfim, os homens viverem sua morte e esta lhe for tal qual a vida (a sua única realidade), será a Vida quem o atemorizará durante toda a eternidade.
Conforme Oscar Cullmann,
O N.T. desconhece uma visão otimista da morte, como se ela fosse uma “amiga” que viesse para libertar a alma da prisão do corpo. Tal “entendimento sobre a morte é excluído pela visão da morte como uma terrível consequência do pecado” (“Death”, Interpreter’s Dictionary of the Bible, p. 807).
A grande vitória de Cristo sobre a morte é demonstrada no desvelo das Escrituras à sua ressurreição (1Ts 4.14). Temos no Evangelho de Lucas toda a trajetória dos profetas até o Calvário no curto período de três anos. Cristo é o cumprimento das Escrituras, da mesma forma em que Ele é o único que a pode cumprir (Lc 24.44-47; Rm 10.4)!
Lucas utiliza cerca de dezoito vezes os termos “deve e necessário” em seu Evangelho e vinte e duas vezes em Atos como o apontamento da excelência das Escrituras se cumprindo nEle, Cristo Jesus.
Assim, não é errado inferir que o fogo duradouro no coração é aquele que associa as Escrituras com a fé na ressurreição de Cristo. Este coração em chama há de se manifestar na proclamação do Evangelho, registrado pelo próprio Lucas no livro de Atos dos apóstolos (Lc 24.52,52; At 1.12-14; 2.1ss).
Conclusão
A Fé Cristã não é cega ou puramente razão (1Pe 3.15). As Escrituras não dicotomizam o homem em animal (puro instinto) e máquina (resultado físico de leis). O homem é um ser que se apercebe enquanto físico-espiritual. Pois o Cristianismo crê que
Ninguém pode ser persuadido a se tornar cristão. Contudo, ignorando as normas racionais, a experiência religiosa é menos bíblica e evangélica. Alguém pó ser persuadido intelectualmente sobre a consistência lógica e verdadeira do conceito evangélico em relação a Deus e ao mundo. De outro lado, esse alguém não precisa ser um crente para compreender as verdades contidas na revelação divina. Uma pessoa convencida intelectualmente da verdade do Evangelho, mas que busca fugir ou adiar sua decisão pessoal quanto à confiança salvadora, está divinamente condenada, porém, a fé pessoal é um dom do Espírito. O Espírito Santo usa a verdade como instrumento de convencimento e persuasão (Pense Biblicamente, J.MacArthur).
Logo, tem-se na narrativa dos dois discípulos no caminho de Emaús um exemplo de que a fé cristã deve controlar tanto a razão como as emoções (1Co 14.14,15,32). É deste modo que se pode ter a mente e o coração aquecidos.
Leitura: Texto: Lc. 24:13-35, 44-53
Emaús
Sempre és o hóspede – nunca és o rei.
Muito mais derrotado que vitorioso.
Quando chegas e bates ao meu coração
Eu não te reconheço – há luz demais –
Debruço-me sobre as gravuras do caminho.
Quando te afastas – acompanhado pelo peixe azul –
Quando as formas se movem como num aquário,
Então eu levanto enternecido a lanterna
E logo começo a desejar que voltes,
Fascinado pela tua obscuridade.
– Murilo Mendes, Mundo Enigma (1942)
Discernir a espiritualidade cristã do misticismo nem sempre é fácil. O rev. Augustus Nicodemos percebe que o misticismo está muito próximo à tendência dos teólogos liberais, pois ambos buscam uma “espiritualidade” sem a mediação das Escrituras. Assim, infere-se que entre o místico e o espiritual estão as Escrituras como base à experiência, e não o seu contrário.
Não há dúvidas de que a Fé Cristã é em seu conteúdo mística. Pensemos, por exemplo, na ceia; o pão e o vinho não são o símbolo da fé no Salvador (Mc14. 22; Lc 22.19; 1Co 10.16; 11.27)?
O problema é que o homem se inclina a dar ao místico uma certa compreensão irracional; isto é, o “espiritualmente místico” se torna em místico-fenomênico. Deus pode ser tocado, visto, “cheirado”, pois se torna parte de uma realidade irracional da (im)compreensão da religião. E assim, a razão humana supera-se saltando de sua limitada capacidade de pensar Deus para o deus tangível, fruto de seus pensamentos (Gn 11.1ss; Rm. 1.23, 1Ts. 2.4).
Ora, diz Augustus Nicodemus:
Creio que o misticismo bíblico – união com Cristo realizada na sua morte, vivida pelo Espírito, celebrada na Ceia e vivenciada pelo uso dos meios de graça – continua sendo o padrão para os cristãos. O que falta em muitos é a disposição para vivê-lo.
É esta espiritualidade sadia, mística, mas não exotérica, que as Escrituras nos evocam (Rm. 12.1,2; 1Co 14.15,19). Uma atitude corajosa de se agarrar à Palavra de Deus e balizar o mundo por Ela (Rm 1.8; Ef 3.9).
Assim, embora a ressurreição exija fé, exige também a compreensão da fé. E o projeto de Lucas neste evangelho se vê assim. Lucas faz um laborioso e inteligente relato. Trata-se de uma narrativa de estrutura ‘parabólica’, com alguns reflexos de diatribes (quiçá, herança paulina).
As narrativas acerca da ressurreição seguem uma estrutura que não permite a dicotomia entre Ressurreição e as Escrituras. Todavia, esta estrutura também aponta para o fato de que sem a Ressurreição as Escrituras não atingem o seu ápice lógico e profético; isto é, soteriológico (Mt 16.21; 26.54,56; At.17.3; Rm 16.26; 1Co 15.4).
O fim principal desta dependência recíproca é a internalização de uma única verdade: Deus veio aos homens na Pessoa de seu Filho, a fim de conduzi-los a Ele perfeitamente aceitáveis (Ef.5:27; Col.2:10; 1Pe.2:5; Jd 24; Hb.9:24; 10.1).
Veja como que esta Verdade se torna destituída de significado caso não existisse correspondência, dependência mútua entre Escritura e Ressurreição (1Co 15.14-17).
Lucas tira o foco de todas as aparições narradas nos outros evangelhos e o põe num só dia e lugar: Jerusalém. É desta cidade que os discípulos fogem e é para lá que devem voltar. Nela está o cenário do propósito redentor de Deus (Mt 2.1; 16.21; 20.18).
É de Jerusalém que os discípulos deverão partir corajosamente, a fim de pregar as boas novas. Mas antes, deverão entender esta mensagem ensinada pelo Senhor, cuja crucificação recebe o poder que se eleva à vergonha e horror da fé judaica (Lc 9.31; 24.47; At.1.4,8; 10.39). E é neste aspecto que Escrituras e as experiências advindas destas caminham juntas (Sl 119.9,11,25,50,133; Jo.17.17).
E é assim que a verdade resulta clara: a base de toda a experiência cristã deve ser as Escrituras (At.17:11; 2Tm.3:16).
Tal verdade pode ser diligentemente observada na exposição que Lucas faz acerca da conversação entre os dois discípulos a caminho de Emaús e o “ilustre Desconhecido”. É possível acompanharmos a cada passo neste caminho o modo como o “Desconhecido Caminhante” traz os “caminhantes” de volta à fé em Cristo, tão somente apontando e rememorando o que o Mestre havia dito acerca das Escrituras.
Da narrativa lucana pode-se extrair a implicação da Escritura na experiência dos discípulos. Tal implicação resulta significativamente na necessidade de tê-la pautando o nosso mudus vivendi da Fé Cristã. Vejamos, pois, pelo menos três delas:
I-A experiência cristã sem as Escrituras perde o significado (23,24,26-27)
As Escrituras só dão significado à realidade se estudada no seu todo e o seu todo tem como ápice a ressurreição (Lc 4.1ss; At 28.23; Rm 15.4; 2Tm 3.16).
Lucas tem vital interesse em apontar, narrativamente, “como Deus executa o seu plano em conformidade com o estabelecido na antiga promessa” (Lc1. 70). Vê-se frequentemente a expressão: “para que se cumprissem as Escrituras […].” Jesus expõe a necessidade das Escrituras a citar desde Moisés aos profetas.
Kaiser nos lembra de que isto (a necessidade de ampliar o conhecimento dos homens quanto a Verdade do cumprimento das Escrituras em virtude da ignorância humana) ocorre frequentemente não só no Evangelho de Lucas, mas está por todo o livro de Atos dos Apóstolos [eg. At.26.22,23] (W. Kaiser, O Plano da Promessa de Deus, p. 339).
Conforme Fabris e Maggioni,
Lucas se apressa em reler todos os particulares da crucificação e morte de Jesus através da grade dos textos bíblicos, em particular dos salmos […], (e.g: Sl. 22.19; 69.22; 31.6; 38.12; 88.9).
Observemos que os dois discípulos de Lucas 24 conversam com o ‘Desconhecido Caminhante’ e dizem o que esperavam de Jesus: “Varão poderoso em palavras e obras, que iria libertar o seu povo […].” Contudo, a exposição versa apenas parte das Escrituras. O sofrimento, a cruz, o pecado que o Messias tomaria sobre si, bem como a ressurreição, são ignorados (Mt 16.21; Lc 24.26,46; At 17.3)!
Esta perspectiva teológica das Escrituras não é totalmente suficiente para trazer a lume o significado da agradável sensação de ardume nos corações dos homens que ouvem o Estranho no caminho. O coração de Cléopas arde juntamente com a tristeza da morte de Jesus, confundindo as experiências às emoções e à realidade de uma teologia incorporada a um contexto de fé teo-político.
A literatura lucana é bela de significados (o que se observa sem o recurso de alegorias, mas que parece sempre querer dizer na mente do seu leitor mais do que se narra). Agostinho não resiste à provocação de Lucas e se rende: “O Mestre acompanha-os pelo caminho, Ele próprio é o Caminho; mas eles ainda não estão no verdadeiro Caminho.” Cristo estava vivo, mas os discípulos com a esperança morta. Que contraste entre a fé nas Escrituras e naquilo que se vive e vê!
Agostinho nos faz entender que, o Cristo que ressuscitou na tumba fria, deveria ressuscitar também nos corações cegos desses discípulos que não entendiam o plano divino. Têm a esperança assassinada por uma fé que espera alívio existencial nada além da sua concepção da vida (Rm 8.25; 1Co 15.19). Somente a compreensão das Escrituras preencheria de vida o coração desses homens (Pv 19.16; Jo 4.10; 6.55; 7.38; Rm 7.10).
Jesus durante o trajeto a Emaús expõe sabiamente a Escritura à altura do intelecto desses discípulos. Isto porque o Deus/Homem entra neste mundo apercebido de todas as mazelas humanas e sabe como ninguém utilizar-se da linguagem humana com o propósito de apontar, conscientizar e eliminar tais mazelas do coração humano (Rm. 8.3; Fl. 2.1ss; Hb 2.14-18; 4.15).
Ele sabe traduzir a linguagem do coração humano, bem como lê-la em amor (Jo 2.25; Hb 2.11): “O que é que vocês conversam?”, pergunta o Salvador aos homens que seguem incrédulos o caminho da ignorância da ressurreição.
Ora, o que se fala no “caminho” é aquilo que nos enche o coração; isto é, a realidade (Lc 6.45). As conversas do caminho buscam o consolo dentro de uma realidade que parece hostil à fé. O lugar da Ressurreição e das Escrituras é mostrar que a realidade é bem mais ampla para o Cristianismo do que para qualquer outra religião ou concepção de vida (Jo 11.25; Rm 8.31ss; Ef. 1.20; 2.6; Hb. 11.1ss).
O que se pode considerar como realidade nem sempre condiz com a verdade. A Verdade está além de uma concepção dita como real, haja vista que sempre nos enganamos. Deste modo, a Verdade, independentemente de meu juízo, existirá e há de se revelar (Jo 8.45; Gl 5.7; 2Tm 2.4; 1Jo 2.21; 2Co 13.8).
Morris acredita que os dois discípulos conversavam pelo caminho a fim de aliviar um pouco a tristeza. Procuravam na reciprocidade um pouco de consolo. Isto é notado no versículo 14 – “No caminho, conversavam (discurso) a respeito de tudo o que havia acontecido”; “Eles iam falando entre si e fazendo perguntas um ao outro” (ARC).
Todavia, a grande verdade é que nem sempre a troca de ideias ou experiências nos ajuda a entender a vida. Os discípulos precisavam entender o que havia dado errado bem como se agarrar ao pouco de esperança que nutriam conversando um com o outro. Estes homens deveriam aprender o modo como a Escritura auxilia o discípulo na esperança da ressurreição. Ela se tornará fundamental à incipiente comunidade da fé (Lc 20.36; At 24:15; Rm 6:5; 11:15).
Mas precisam romper com a ideia messiânica que evade a dor e sofrimento. Precisam entender a derrota da cruz (Mt 16.21; At 3.18; 26.23; Hb 9.26).
Jesus torna as Escrituras significativas no caminho daqueles homens; isto é, no presente, na caminhada. Ela não é um escrito do passado. As Escrituras têm o seu cumprimento no hoje desses dois caminhantes errantes. É o passado se desdobrando sempre novo à frente das esperanças humanas (Sl 119.105; Is 40.8; 1Pe 1.23).
J. MacArthur declara que,
A pureza e a clareza da Bíblia produzem o benefício de “alumiar os olhos”. Ela provê iluminação no centro da escuridão moral, ética e espiritual. Ela revela o conhecimento de tudo que não pode ser realmente visto de outra forma (cf. Pv 6.23). Uma das razões essenciais de que a Palavra de Deus é suficiente para todas as necessidades espirituais humanas é que ela não deixa dúvidas a respeito da verdade essencial. A vida por si só já é confusa e caótica. Procurar a verdade fora da Bíblia só aumenta a confusão. As Escrituras, em contraste com tudo isso, são muito claras (Pense biblicamente).
Jesus deve esclarecer aos discípulos o significado de todos os testemunhos que os dois discípulos ouviram. Tiveram várias evidências, mas o que são elas aos olhos que só se abrirão mediante o poder da Palavra? Observemos que a pedra estava removida, anjos foram vistos e ouvidos, mulheres testemunharam, Pedro viu o túmulo vazio. Por que não creram?
Fábris e Maggioni nos explicam que,
[…] a morte de Jesus já não é mais um incidente absurdo, mas o cumprimento de um projeto de salvação já revelado por Deus na Escritura. É esta interpretação teológica que torna a narração da morte não uma página de crônica macabra, mas o anúncio da salvação para os crentes (Os Ev. II, R. Fábris e B.Maggioni).
É este cumprimento veterotestamentário que foge à compreensão: não só dos dois discípulos a caminho de Emaús, mas de todos os discípulos até a ressurreição e a sua interpretação feita por Jesus (Mt. 26:31ss).
II- As Escrituras devem anteceder as experiências (28ss)
Quando as Escrituras assumem o seu lugar, torna-se claro que a fé e a compreensão dos fatos bíblicos nos faz ver Cristo conosco, ainda que não o vejamos com os olhos físicos (2Tm 4.10,16-18). E esta aplicação é lúcida, pois,
Quando o Senhor começou a falar com eles, os discípulos ainda não tinham fé. Eles ainda não acreditavam na sua ressurreição; nem esperavam sequer que ele pudesse ressuscitar. Tinham perdido a fé; tinham perdido a esperança. Eram mortos que caminhavam com um vivo; caminhavam mortos, com a vida. A “vida caminhava com eles, mas em seus corações, a vida ainda não tinha sido renovada.” (Agostinho)
Jesus caminhou com os confusos e desiludidos discípulos cerca de onze quilômetros expondo-lhes as Escrituras.
Expor-lhes as Escrituras parece ter-lhe sido mais necessário no percurso do que a imediata revelação de sua ressurreição aos confusos companheiros de estrada. Só no final do percurso, já hóspede desses homens, Jesus se revela. Por qual razão? Porque é assim que Ele deve ser conhecido pelos homens: primeiro como cumprimento das Escrituras; depois, como aquele que se pode experimentar do prazer justificado por corações em brasas!
Quando o coração ardia? Eles dizem: “Porventura não ardia em nós o nosso coração quando, pelo caminho, falava conosco e quando nos abria as Escrituras?” (24.32). O coração desses discípulos ardia, mas por quê? O que significa um coração que arde com as Palavras que não lhes trazem entendimento? Somente toda a Escritura explanada traz sentido ao coração em brasas! É o que o Mestre procura fazer durante o caminho.
Há uma Revelação que progride ao longo do caminho, o que torna a Verdade de Deus mais clara. Cristo lhes fala pelo caminho, seus corações ardem ao ouvi-lo, mas eles só têm os olhos abertos no final do percurso. Jesus guarda-se de revelar a sua Pessoa a eles, por quê? Experiências a parte da exposição das Escrituras são “fogo de palha.”
Parece-nos que, para Jesus, explicar aos discípulos as Escrituras era bem mais importante do que se revelar a estes. Ele compreende bem o paradoxo experimentado pelos discípulos no caminho: têm-se no caminho tanto as Escrituras quanto o seu cumprimento; isto é, o Cristo ressurreto. Mas tal paradoxo só é ‘compreendido’ mediante o coração que arde e a mente que absorve os ensinamentos de Deus.
Concordemos com Schroeder ao afirmar que,
Jesus havia querido, primeiramente, permanecer desconhecido para os discípulos a fim de instruí-los pelas Escrituras, antes de convencer-lhes por uma manifestação exterior, apropriada para impressionar seus sentidos (Comentario del Nuevo Testamento, L.Bonnet Y A. Schroeder).
A lógica é simples: uma vez passado o momento do alívio ou a memória da experiência, se exigirá uma outra que lhe satisfaça com maior vigor a carência causada pela primeira. E, neste momento, podemos nos perguntar se conseguiríamos trilhar o caminho da mudança da história, de acontecimentos contraditórios ou frustrações teológicas, amparados somente pela Escritura (2Co 11.4; Gl. 1.7,8)?
Àqueles que acreditam que as Escrituras devem a sua autenticidade às experiências (Lc 16.27-31), consideremos o que diz Lutero:
Fiz uma aliança com Deus: que Ele não me mande visões, nem sonhos, nem mesmo anjos. Estou satisfeito com o dom das Escrituras Sagradas, que me dão instrução abundante e tudo o que preciso conhecer tanto para esta vida quanto para o que há de vir.
O fato de Jesus ter entendido ser urgência maior a sua exposição das Escrituras antes de sua manifestação aos discípulos de Emaús estabelece, não só o valor, mas também a sua experiência particular na meditação dos Escritos Sagrados. Otto Borchert diz algo interessante sobre o relacionamento de Jesus com as Escrituras em seu ministério:
Ouvimos falar muito daqueles anos da Sua vida dos quais temos mais notícias, mas nunca ouvimos falar que ele usou essas horas de solidão para ler. O seu estudo da Escritura, portanto, deve ter precedido a Sua vida de ação, mas nos anos de semeadura e combates, Ele viveu essencialmente do que havia adquirido, tirando-o do tesouro da Sua memória. […] Jesus encontrava Deus na Bíblia, a cada vez que a lia entrava em comunhão viva com Seu Pai (O Jesus histórico, p. 176,177).
Os discípulos colocaram a experiência à frente da Escritura: viram com seus olhos a Cristo, mas não o conheceram. Isto porque nem sempre o Cristo da experiência é o Cristo da Ressurreição.
Todavia, veja como o Senhor os trata e se relaciona com esses. Cristo segue perguntando, conversando, observando que estão tristes e se importando com a sua fé. Esses discípulos deverão entender o que significam as palavras de seu Mestre, ouvidas e pregadas durante três anos (Mt 26.55; Jo 14.9).
Que experiência no caminho! Que sentido faz a vida pautada pelas Escrituras! E que sentido faz um coração bater de emoção se no final a Verdade está sepultada?
O Rev. Valdir Oliveira, sobre esta passagem, aconselha àqueles que se frustraram no caminho a não colocarem a esperança naquilo que Deus não prometeu em sua Palavra. Isto por que Cléopas e o outro discípulo evitaram as palavras da morte e ressurreição de Jesus dando maior importância à vitória do Messias somente numa esfera político-teocrática (9.21,22; 24.21).
A esperança desses discípulos no Cristo projetado por seus anseios, e não nas palavras do Mestre, causou-lhes a decepção natural de quem costuma hiatizar a fé da razão.
J. MacArthur afirma incisivamente que
A falta de saída para os difíceis problemas da vida não é o resultado de inadequação das Escrituras; é o resultado da inadequação das pessoas no estudo e aplicação da Palavra. Se as pessoas amassem a Palavra de Deus como deveriam, ninguém jamais questionaria a suficiência da Bíblia (Pense biblicamente).
III-Somente nas Escrituras descobrimos de fato, quem é Jesus (21,25)
“Fica conosco senhor”, pedem os discípulos. Ele já estava, mas os olhos nada entendem sem o amparo das Escrituras (Mt 28.20; Jo 14.16,26; 16.7).
Se não se mostrasse, como é que os discípulos poderiam ouvir a sua pergunta e responder-lhe? Caminha com eles e parece segui-los, mas é Ele quem os conduz. Veem-no, mas não o reconhecem, “porque os seus olhos, diz o texto, estavam impedidos de O reconhecer… A ausência do Senhor não é uma ausência. Crê somente e Aquele que não vês estará contigo.” (Agostinho)
Jesus apresenta-lhes todo o conteúdo sagrado; isto é, Deus está no controle e o túmulo vazio está repleto de significado e história (Mt 25.34; Ef 1.4; Hb 9.26; Ap 5.12; 13.8). Uma vez aberto os olhos, Cléopas e o outro discípulo voltam a Jerusalém. Não é isto que significa ressurreição? Volver a Jerusalém, onde toda a história dos homens encontra o seu significado (Rm 11.36)?
De fato, conhecer o Cristo ressurreto das Escrituras é apaixonar-se (2Co 5.14; Fl 3.7,8). É querer que ele esteja sempre ao alcance de nossos olhos, de nossos sentidos. Não é debalde que o versículo 14 nos apresenta os discípulos desejosos de que o ‘Homem do caminho’(Cristo) permanecesse mais um pouco com eles. Cristo ainda se esconde na torpeza de seus entendimentos, mas a alma anseia enxergá-lo. Por quê? As Escrituras foram entendidas. Cristo, Completo Deus/Homem, o Salvador revela todo o sentido da história e dissipa toda a ideia de que a vida não faz mais sentido (Rm 10.4; Ap 22.13). A fé supera as emoções (Hc 3.17).
O Cristo ressuscitado levou os dois discípulos do diálogo no caminho ao reconhecimento de sua divindade. Conheceram a Jesus caminhante como homem, mas agora o RECONHECERÁ como o Deus/Homem. Louvemos a Deus por aquilo que a Palavra de Deus nos dá acerca do Salvador! Ele não é o derrotado na Cruz. Ele é o Deus Vivo (1Co 15.54,55)!
De repente, ele se apresenta. “Jesus aproximou-se e ia com eles”, a delicadeza do Verbo é pura poesia. O Mestre começa sua aula magna. Interroga, comenta, expõe as Escrituras. Fala de si mesmo com tamanha humildade que passa despercebido pelos olhos. Mas não pelo coração. Sem alarde, o coração denuncia a santidade que caminha ao lado.
Encanta-me a doce insistência divina em revelar-se para a nossa vagarosa inteligência. O testemunho das mulheres, a comprovação ocular dos outros discípulos que foram ao túmulo, a chama ardendo no peito, tudo isso, mas uma espécie de casca impermeável parece obstruir a claridade da revelação. Ainda bem que ele é luz! Compreendo aqueles dois porque sou exatamente assim. Lento, sou um peregrino a buscar, vasculhar, ler, pesquisar alucinadamente. O peito arde, mas os olhos protestam”. (Alan Brizotti)
Ora, quando as Escrituras antecedem às experiências pessoais, estas responderão às exigências daquela. Estas exigências são o resultado natural da ação das Escrituras no intelecto e coração (se de fato os pudermos separar) do discípulo.
Trata-se de uma exigência progressiva, que por si só já é a verdadeira experiência cristã; ou seja, uma vez entendida a ressurreição, Cristo é visto sempre entre o seu povo em seus corações, mediante olhos da FÉ (Mt 18.20; Jo 20.29).
A experiência das Escrituras obrigam os discípulos a nutrirem um novo tipo de relacionamento com Cristo. Depois de sua ressurreição, a realidade que Jesus traz ao mundo é totalmente outra. Somente será possível o seu relacionamento com os crentes pela fé (Rm 1.17; 5.1; Ef 3.12,17; 2Co 5.7; Gl 3.26; Hb 11.6).
O versículo 31 nos informa que Jesus some; por quê? Ora, uma vez que Jesus deixou claro o cumprimento das Escrituras, será a fé quem guiará os corações na chama da ressurreição! Tem-se por base os relatos do texto sagrado (Rm 10.4; Gl. 3.24)!
Lembremos a narrativa joanina, correlata ao texto lucano. No Evangelho de João (cap. 20) Cristo censura a incredulidade de Tomé, mas não parece tê-la feito a Pedro e João que, igualmente, tiveram que ‘ver para crer’. O texto joanino parece endossar a ideia de que Tomé recebera, agora, tanto o testemunho dos discípulos (João e Pedro), como o do próprio Senhor em aparição no meio deles. Trata-se de um testemunho duplo. A nova condição do Senhor ressuscitado exige também nova condição para ser encontrado (Lc 24.5; Jo 20.17).
Os discípulos chegaram à fé, mas não ainda à fé completa, cujas bases são o testemunho e as Escrituras. E não é diferente com os crentes. É caminhando com Jesus e a exposição de sua Palavra, dia a dia, que temos os nossos olhos abertos. Até, então, os discípulos trataram Jesus como um viajante à sua semelhança. Antes de ter as Escrituras aberta (Lc 24.45) nosso Senhor era mais um no caminho com esses discípulos: perdido, frustrado.
A nova realidade, trazida na ressurreição, exige que o coração que arde com a sua Palavra deve aprender a ler a história com “novos olhos”. Para tal é necessário percorrer todo o caminho que leva ao reconhecimento de Jesus: “a escuta da Palavra que muda coração” (Fábris e Maggioni).
Contudo, os dois caminhantes no relato dos fatos a Jesus, durante o percurso a Emaús, demonstram que tipo de fé nutria no Mestre: “Jesus era o homem de Nazaré, profeta poderoso em obras e palavras […]” (Lc. 24.19). Mas não era Deus? Trata-se de uma “boa teologia” frustrada. Contudo, é este o fim de boas teologias sem bases bíblicas.
Observe o diálogo de Jesus com os dois. A princípio, Jesus apenas pergunta e eles expõem as suas esperanças teológicas frustradas. Depois, Cristo expõe outra perspectiva teológica: a Ressurreição. É outro modo de ver a vida e o seu vazio de significado. Basta que se observe a trajetória dos discípulos após a conversa com Cristo. Uma vez levados à compreensão das Escrituras, convencidos de que a interpretação que ouvira era de fato coerente, são renovados e se põem a caminho de volta a Jerusalém.
A simultaneidade da descoberta é encantadora. Ao término de todo o movimento textual; isto é, explicação da Palavra, chega-se à visão daquele que sempre estivera ao alcance de seus olhos. São duas verdades de uma mesma realidade. Cristo está com eles, mas não veem. Depois, Cristo não mais lhes está ao alcance dos sentidos, mas pode ser visto. Entenderam que o túmulo vazio representa a plenitude da presença de Jesus no coração dos crentes. Nunca o vazio esteve tão repleto de vida e significado.
Coração e mente funcionam juntos ao som das Palavras de Jesus, naquele caminho. E ao final de toda a exposição, Cristo desaparece, mas o coração e a mente são capazes de regressarem onde tudo começou. E isto é assim, pois, descobrir o Cristo das Escrituras é regressar à origem, é recomeçar e buscar a comunhão com o seu povo. É contar a alegria da vida (Lc 24.52)!
Entender as Escrituras e experimentar da Ressurreição é redescobrir todo o cenário do amor divino. O objetivo de Jesus era o de fazê-los retornar a Jerusalém e reincorporarem o número dos discípulos em seus relatos acerca da visão do Cristo ressuscitado (Lc 24.33,35).
Observemos como Jesus distrai os olhos desses homens voltados para o aqui e os eleva às Verdades Eternas. “Do que vocês estão falando”? “O que dizem as Escrituras, pergunta Jesus”. Trata-se de uma pergunta que implica em convicção não no rumo em que a história parece tomar, mas naquilo que a Palavra diz que tomará.
A realidade que os discípulos enfrentavam apontava para a vitória da morte. Transformara a verdade em mentira. mas é nesse momento que se deve perguntar: o que dizem as Escrituras? Isto é essencial porque a nossa esperança pessoal e teológica frustradas não implica numa cruz que derrota a Cristo ou num túmulo que o impeça de caminhar junto ao crente em angústias ou frustrações.
Não levemos em nossa caminhada os velhos sapatos da incredulidade ou a leitura da vida pelos noticiários da TV. Ao contrário, busquemos um coração que arda em sentido a partir da ressurreição.
Murilo Mendes acertadamente declara o Cristo que viu neste texto. E assim o divide: 1- O Cristo companheiro, sempre interessado na relação. “Ser amigo é repartir a vida.”; 2- Cristo hóspede; 3- Cristo das Escrituras.
Desconhecer as Escrituras é o mesmo que desconhecer a Cristo, pois são elas que dele testificam! (?) Este Cristo no caminho de Emaús é o paradoxo da discrição e penetrante, delicado e severo, humilde e sábio, Sofredor e vitorioso. Conhecemos este poderoso servo sofredor que demonstra no sofrimento seu grandioso poder, que vence em se revelar servo, sendo verdadeiro Rei?
Os discípulos devem, agora, voltar e relatar toda sua experiência no caminho. Mormente, a experiência esteve repleta de significado e embasada pelas Escrituras explicadas pelo próprio Senhor.
Se por quiasmo ou diatribe não o sei, mas não parece ser por acaso que, depois que os discípulos tiveram os seus olhos abertos, Cristo tenha desaparecido! Por quê? “Jesus abriu a mentes deles para entenderem as Escrituras” (v.45). É a Palavra de Deus quem os deverá guiar, agora.
Carmem Lussi comenta que a palavra Caminho é de importante significado para Lucas. Aponta os dois discípulos de volta a Emaús e, depois da aparição de Cristo, a necessidade de retornarem a Jerusalém. Pois,
É ali que os discípulos missionárias/os desanimados recebem a confirmação que de fato o Senhor ressuscitou, pois o calor no coração quando Jesus explicava as Escrituras no caminho fazia parte do percurso de retomada da fé […].
No final da caminhada os discípulos são chamados para irem além de suas experiências e não sem elas, mas agora, explicadas e explicitadas. “Lucas repete duas vezes na mesma perícope (v. 27 e 45): Jesus mesmo quem nos revela o sentido da Palavra, porque é necessária a escuta da Palavra e porque, sem ela, fica difícil manter fidelidade e alegria no discipulado. Anunciando a eles o essencial da fé (v. 47-48), a falta do anúncio da necessidade da cruz e da acolhida existencial deste anúncio cria comunidades de “fogo de palha”, sem raízes profundas, que os espinhos e o sol facilmente eliminam e neutralizam o potencial.” (Carmem Lussi).
O que torna-se mais importante na vida do discípulo que é guiado pela exposição das Escrituras no caminho? Ao invés de falar da “aparição de Jesus”, os dois narram sobre “o que tinha acontecido no Caminho”. Agora sim, temos as experiências valorizadas. Todavia, a base dos relatos das experiências são as Escrituras.
É necessário perfazer o caminho de volta a Jerusalém. Ouvir, ler e entender o plano de Deus no Filho, a fim de proclamá-lo ao mundo. Em Jerusalém receberão o poder do Espírito outorgado nos méritos de Cristo ; depois disto, hão de proclamar o maior acontecimento da história: Cristo vive (Lc 24.47-53).
O itinerário de Lucas é uma evolução até que se entenda o ápice messiânico; ou seja — Ressurreição. Conforme Ladd,
No N.T. a ideia e a esperança da ressurreição gira inteiramente em torno da ressurreição de Jesus […] sua ressurreição significa que ele aboliu a morte e trouxe à luz a vida e a imortalidade, ‘por meio do Evangelho’.
É como o cumprimento das Escrituras que o Cristo será levado a todos os povos.
O relato evangélico que a Bíblia descreve sobre o encontro de Jesus com os discípulos no caminho de Jerusalém para Emaús revela o itinerário da fé alicerçada na Palavra de Deus. A estrada de Emaús, na qual caminhavam os dois discípulos de Jesus, nada mais é do que a estrada da vida de cada um de nós, com tudo o que nela acontece. É neste caminho que aprendemos a lidar com a vida e ter um encontro com Jesus. O Ponto Fraco Nosso e dos Discípulos – Meditação do fato de que não lemos a bíblia, com entusiasmo, apenas nos contentamos com uma leitura superficial da Palavra, nos cultos diários. Mas, o que vem a ser realmente o entusiasmo? Sua origem é grega significando “cheios de Deus”. É um processo para que o coração fique ardendo, aquecido e pegando fogo. Portanto, tudo vai mudar em nossas vidas se vivermos com o coração vivificado e olhos aberto, veremos a gloria de Deus.”(Rev. Ultimato)
O lugar da experiência cristã na ressurreição, Nas palavras de D. Ewert:
A certeza de nossa esperança na ressurreição dentre os mortos repousa, antes de tudo, sobre os ensinos de Jesus e de seus apóstolos. Mas fundamentalmente ainda, ela escuda-se sobre a ressurreição do nosso Senhor Jesus. (Então virá o fim, p.110).
O que as Escrituras nos ensinam acerca da ressurreição do Salvador? A morte não é aquilo com quem eu devo me confrontar no final da vida, mas a própria Vida quando não mais existir a morte (1Sm20.3). Quando, enfim, os homens viverem sua morte e esta lhe for tal qual a vida (a sua única realidade), será a Vida quem o atemorizará durante toda a eternidade.
Conforme Oscar Cullmann,
O N.T. desconhece uma visão otimista da morte, como se ela fosse uma “amiga” que viesse para libertar a alma da prisão do corpo. Tal “entendimento sobre a morte é excluído pela visão da morte como uma terrível consequência do pecado” (“Death”, Interpreter’s Dictionary of the Bible, p. 807).
A grande vitória de Cristo sobre a morte é demonstrada no desvelo das Escrituras à sua ressurreição (1Ts 4.14). Temos no Evangelho de Lucas toda a trajetória dos profetas até o Calvário no curto período de três anos. Cristo é o cumprimento das Escrituras, da mesma forma em que Ele é o único que a pode cumprir (Lc 24.44-47; Rm 10.4)!
Lucas utiliza cerca de dezoito vezes os termos “deve e necessário” em seu Evangelho e vinte e duas vezes em Atos como o apontamento da excelência das Escrituras se cumprindo nEle, Cristo Jesus.
Assim, não é errado inferir que o fogo duradouro no coração é aquele que associa as Escrituras com a fé na ressurreição de Cristo. Este coração em chama há de se manifestar na proclamação do Evangelho, registrado pelo próprio Lucas no livro de Atos dos apóstolos (Lc 24.52,52; At 1.12-14; 2.1ss).
Conclusão
A Fé Cristã não é cega ou puramente razão (1Pe 3.15). As Escrituras não dicotomizam o homem em animal (puro instinto) e máquina (resultado físico de leis). O homem é um ser que se apercebe enquanto físico-espiritual. Pois o Cristianismo crê que
Ninguém pode ser persuadido a se tornar cristão. Contudo, ignorando as normas racionais, a experiência religiosa é menos bíblica e evangélica. Alguém pó ser persuadido intelectualmente sobre a consistência lógica e verdadeira do conceito evangélico em relação a Deus e ao mundo. De outro lado, esse alguém não precisa ser um crente para compreender as verdades contidas na revelação divina. Uma pessoa convencida intelectualmente da verdade do Evangelho, mas que busca fugir ou adiar sua decisão pessoal quanto à confiança salvadora, está divinamente condenada, porém, a fé pessoal é um dom do Espírito. O Espírito Santo usa a verdade como instrumento de convencimento e persuasão (Pense Biblicamente, J.MacArthur).
Logo, tem-se na narrativa dos dois discípulos no caminho de Emaús um exemplo de que a fé cristã deve controlar tanto a razão como as emoções (1Co 14.14,15,32). É deste modo que se pode ter a mente e o coração aquecidos.
GRAÇA NECESSÁRIA
“e, como os teus dias, será a tua força.” (Deuteronômio 33:25)
Deus não dá graça – até a hora da provação chegar. Mas quando ela vem – a quantidade de graça, e a natureza da graça especial necessária, é concedida.
Minha alma! não tenhas uma apreensão dolorosa sobre o futuro. Não antecipe tristezas vindouras; não fique perplexa com a graça necessária para emergências futuras; o amanhã trará a sua graça prometida – juntamente com as provações do amanhã.
Deus, querendo manter o seu povo humilde e dependente de Si mesmo, não dá um estoque de graça; Ele a fornece de acordo com as exigências de cada dia, para que ela possa estar viajando constantemente entre o nosso próprio vazio – e a plenitude de Cristo; nossa própria fraqueza – e força de Cristo. Mas, quando a necessidade vem, você pode confiar com segurança no braço Todo-Poderoso que lhe dará suporte para atravessar a provação!
Há agora algum “espinho na carne” enviado para lhe dilacerar? Você pode ter estado rogando ao Senhor para a sua remoção. Sua oração foi, sem dúvida, ouvida e atendida; mas não da maneira que, talvez, seja a esperada ou desejada por você. O “espinho” ainda pode ser deixado como um aguilhão, a provação ainda pode ser deixada para continuar golpeando; mas “mais graça” tem sido dada para suportá-los.
Oh! quantas vezes o seu povo, foi conduzido desta maneira para a glória em suas fraquezas, e a triunfar em suas aflições – vendo que o poder de Cristo repousa mais abundantemente sobre eles! A força que a hora da provação traz – frequentemente faz o cristão maravilhar-se consigo mesmo, e gloriar-se em suas fraquezas, em suas cruzes e no Seu Deus!
Deus não dá graça – até a hora da provação chegar. Mas quando ela vem – a quantidade de graça, e a natureza da graça especial necessária, é concedida.
Minha alma! não tenhas uma apreensão dolorosa sobre o futuro. Não antecipe tristezas vindouras; não fique perplexa com a graça necessária para emergências futuras; o amanhã trará a sua graça prometida – juntamente com as provações do amanhã.
Deus, querendo manter o seu povo humilde e dependente de Si mesmo, não dá um estoque de graça; Ele a fornece de acordo com as exigências de cada dia, para que ela possa estar viajando constantemente entre o nosso próprio vazio – e a plenitude de Cristo; nossa própria fraqueza – e força de Cristo. Mas, quando a necessidade vem, você pode confiar com segurança no braço Todo-Poderoso que lhe dará suporte para atravessar a provação!
Há agora algum “espinho na carne” enviado para lhe dilacerar? Você pode ter estado rogando ao Senhor para a sua remoção. Sua oração foi, sem dúvida, ouvida e atendida; mas não da maneira que, talvez, seja a esperada ou desejada por você. O “espinho” ainda pode ser deixado como um aguilhão, a provação ainda pode ser deixada para continuar golpeando; mas “mais graça” tem sido dada para suportá-los.
Oh! quantas vezes o seu povo, foi conduzido desta maneira para a glória em suas fraquezas, e a triunfar em suas aflições – vendo que o poder de Cristo repousa mais abundantemente sobre eles! A força que a hora da provação traz – frequentemente faz o cristão maravilhar-se consigo mesmo, e gloriar-se em suas fraquezas, em suas cruzes e no Seu Deus!
Devocional Alegria Inabalável - John Piper
DEUS CUIDA DE VOCÊ
Versículo do dia: Humilhai-vos, portanto, sob a poderosa mão de Deus, para que ele, em tempo oportuno, vos exalte, lançando sobre ele toda a vossa ansiedade, porque ele tem cuidado de vós. (1 Pedro 5.6-7)
Por que a ansiedade quanto ao futuro é uma forma de orgulho?
A resposta de Deus seria algo como isso:
Eu — o Senhor, seu Criador — sou aquele que lhe conforta, que promete cuidar de você; e aqueles que lhe ameaçam são meros homens mortais. Portanto, seu medo significa que você não confia em mim — e mesmo que não tenha certeza de que seus próprios recursos cuidarão de você, ainda assim opta por uma autossuficiência frágil, em vez de crer na minha graça futura. Assim, todo o seu temor — fraco como é — revela orgulho.
O remédio? Converta-se da autossuficiência para a dependência de Deus e coloque sua fé no poder todo-suficiente da graça futura.
Vemos a ansiedade como uma forma de orgulho em 1 Pedro 5.6-7. Observe a conexão gramatical entre os versos. “Humilhai-vos… sob a poderosa mão de Deus… [versículo 7] lançando sobre ele toda a vossa ansiedade”. O versículo 7 não é uma nova sentença. É uma cláusula subordinada. “Humilhai-vos… [por meio de] lançar sobre ele toda a vossa ansiedade”.
Isso significa que lançar suas ansiedades sobre Deus é um modo de se humilhar sob a poderosa mão de Deus. É como dizer: “Coma educadamente… mastigando com a boca fechada”. “Dirija com cuidado… mantendo os olhos abertos”. “Seja generoso… convidando alguém para o Dia de Ação de Graças”.
Uma maneira de ser humilde é lançar todas as suas ansiedades sobre Deus. O que significa que um obstáculo para lançar suas ansiedades sobre Deus é o orgulho. O que significa que a preocupação indevida é uma forma de orgulho.
Agora, por que lançar as nossas ansiedades sobre o Senhor é o oposto do orgulho? Porque o orgulho não gosta de admitir que tem alguma ansiedade. E se o orgulho tem que admitir isso, ainda assim, ele não gosta de admitir que o remédio pode ser confiar em alguém que é mais sábio e mais forte.
Em outras palavras, o orgulho é uma forma de incredulidade e não gosta de confiar na futura graça de Deus. A fé admite a necessidade de auxílio. O orgulho não. A fé confia em Deus para ajudar. O orgulho não. A fé lança ansiedades sobre Deus. O orgulho não.
Portanto, a maneira de lutar contra a incredulidade do orgulho é admitir voluntariamente que você tem ansiedades e valorizar a promessa da graça futura nas palavras: “Ele tem cuidado de vós”
Versículo do dia: Humilhai-vos, portanto, sob a poderosa mão de Deus, para que ele, em tempo oportuno, vos exalte, lançando sobre ele toda a vossa ansiedade, porque ele tem cuidado de vós. (1 Pedro 5.6-7)
Por que a ansiedade quanto ao futuro é uma forma de orgulho?
A resposta de Deus seria algo como isso:
Eu — o Senhor, seu Criador — sou aquele que lhe conforta, que promete cuidar de você; e aqueles que lhe ameaçam são meros homens mortais. Portanto, seu medo significa que você não confia em mim — e mesmo que não tenha certeza de que seus próprios recursos cuidarão de você, ainda assim opta por uma autossuficiência frágil, em vez de crer na minha graça futura. Assim, todo o seu temor — fraco como é — revela orgulho.
O remédio? Converta-se da autossuficiência para a dependência de Deus e coloque sua fé no poder todo-suficiente da graça futura.
Vemos a ansiedade como uma forma de orgulho em 1 Pedro 5.6-7. Observe a conexão gramatical entre os versos. “Humilhai-vos… sob a poderosa mão de Deus… [versículo 7] lançando sobre ele toda a vossa ansiedade”. O versículo 7 não é uma nova sentença. É uma cláusula subordinada. “Humilhai-vos… [por meio de] lançar sobre ele toda a vossa ansiedade”.
Isso significa que lançar suas ansiedades sobre Deus é um modo de se humilhar sob a poderosa mão de Deus. É como dizer: “Coma educadamente… mastigando com a boca fechada”. “Dirija com cuidado… mantendo os olhos abertos”. “Seja generoso… convidando alguém para o Dia de Ação de Graças”.
Uma maneira de ser humilde é lançar todas as suas ansiedades sobre Deus. O que significa que um obstáculo para lançar suas ansiedades sobre Deus é o orgulho. O que significa que a preocupação indevida é uma forma de orgulho.
Agora, por que lançar as nossas ansiedades sobre o Senhor é o oposto do orgulho? Porque o orgulho não gosta de admitir que tem alguma ansiedade. E se o orgulho tem que admitir isso, ainda assim, ele não gosta de admitir que o remédio pode ser confiar em alguém que é mais sábio e mais forte.
Em outras palavras, o orgulho é uma forma de incredulidade e não gosta de confiar na futura graça de Deus. A fé admite a necessidade de auxílio. O orgulho não. A fé confia em Deus para ajudar. O orgulho não. A fé lança ansiedades sobre Deus. O orgulho não.
Portanto, a maneira de lutar contra a incredulidade do orgulho é admitir voluntariamente que você tem ansiedades e valorizar a promessa da graça futura nas palavras: “Ele tem cuidado de vós”
Devocional Do Dia - Charles Spurgeon
Versículo do Dia: “Ele é totalmente desejável.” (Cântico dos Cânticos 5.16)
A insuperável beleza de Jesus é atraente em todos os aspectos. A beleza dele não é apenas para ser admirada, e sim para ser amada. O Senhor Jesus é muito mais do que agradável e belo. Ele é desejável. Com certeza, o povo de Deus pode justificar o uso deste adjetivo excelente, pois o Senhor Jesus é o objeto do amor mais intenso do seu povo, um amor fundado na excelência intrínseca da pessoa dele, a completa perfeição de seus encantos. Discípulos de Jesus, olhem para os lábios de seu Senhor e respondam: o falar dele não é o mais agradável de todos? As palavras dele não lhes fazem arder o coração, enquanto caminha ao lado de vocês na jornada cristã? Contemplem a cabeça de Jesus, mais preciosa que ouro finíssimo, e digam-me: os pensamentos dele não lhes são preciosos? A adoração de vocês não é fortalecida com afeição, quando se prostram com humildade diante daquela face que, à semelhança do Líbano, é tão excelente como os cedros (ver Cântico dos Cânticos 5.15)? Não existe encanto em todas as características do Senhor Jesus? E toda a sua pessoa não é tão perfumada com os aromas de excelentes unguentos? Há algum membro em seu corpo glorioso que não seja atraente? Existe alguma porção de sua pessoa que não seja um bom atrativo para nossas almas? Ou, alguma de suas obras que não seja uma forte corda para reter seu coração?
O nosso amor por Ele não é um selo colocado apenas sobre o coração amoroso do Senhor Jesus. Nosso amor também está firmado em seu braço poderoso. Desejamos imitar toda a vida de Jesus e refletir todo o seu caráter perfeito. Em todos os outros seres, vemos imperfeições; em Cristo, porém, existe toda a perfeição. O melhor de todos os santos do Senhor Jesus têm manchas em suas vestes e rugas em seu rosto. O Senhor Jesus é totalmente amável. Todas as estrelas têm manchas. O mundo tem desertos. Não conseguimos amar tudo na coisa mais amável, mas Ele é ouro puríssimo; é luz sem trevas, resplendor sem obscuridade. “Ele é totalmente desejável.”
A insuperável beleza de Jesus é atraente em todos os aspectos. A beleza dele não é apenas para ser admirada, e sim para ser amada. O Senhor Jesus é muito mais do que agradável e belo. Ele é desejável. Com certeza, o povo de Deus pode justificar o uso deste adjetivo excelente, pois o Senhor Jesus é o objeto do amor mais intenso do seu povo, um amor fundado na excelência intrínseca da pessoa dele, a completa perfeição de seus encantos. Discípulos de Jesus, olhem para os lábios de seu Senhor e respondam: o falar dele não é o mais agradável de todos? As palavras dele não lhes fazem arder o coração, enquanto caminha ao lado de vocês na jornada cristã? Contemplem a cabeça de Jesus, mais preciosa que ouro finíssimo, e digam-me: os pensamentos dele não lhes são preciosos? A adoração de vocês não é fortalecida com afeição, quando se prostram com humildade diante daquela face que, à semelhança do Líbano, é tão excelente como os cedros (ver Cântico dos Cânticos 5.15)? Não existe encanto em todas as características do Senhor Jesus? E toda a sua pessoa não é tão perfumada com os aromas de excelentes unguentos? Há algum membro em seu corpo glorioso que não seja atraente? Existe alguma porção de sua pessoa que não seja um bom atrativo para nossas almas? Ou, alguma de suas obras que não seja uma forte corda para reter seu coração?
O nosso amor por Ele não é um selo colocado apenas sobre o coração amoroso do Senhor Jesus. Nosso amor também está firmado em seu braço poderoso. Desejamos imitar toda a vida de Jesus e refletir todo o seu caráter perfeito. Em todos os outros seres, vemos imperfeições; em Cristo, porém, existe toda a perfeição. O melhor de todos os santos do Senhor Jesus têm manchas em suas vestes e rugas em seu rosto. O Senhor Jesus é totalmente amável. Todas as estrelas têm manchas. O mundo tem desertos. Não conseguimos amar tudo na coisa mais amável, mas Ele é ouro puríssimo; é luz sem trevas, resplendor sem obscuridade. “Ele é totalmente desejável.”
HERESIAS CONTEMPORÂNEAS
Por Vinicius Couto
Introdução
A Bíblia trata do caráter apologético das doutrinas centrais da fé cristã em praticamente todos os seus livros do Novo Testamento. Desde a ressurreição de Cristo, muitas heresias se introduziram no meio da Igreja. Embora os Apóstolos, os pais apostólicos, os pais apologistas e os pais polemistas tenham lutado pela fé que uma vez nos foi dada, alguns resquícios dessas falsas doutrinas permaneceram e/ou evoluíram para os séculos posteriores.
Na presente era da Igreja, encontramos esses resíduos primitivos em conceitos teológicos profundamente equivocados. Os atributos de Deus são confundidos em muitas seitas pseudo-cristãs. A natureza de Cristo ainda sofre má interpretação em relação a Sua divindade e humanidade. O Espírito Santo é questionado em alguns grupos religiosos. A doutrina da graça ainda é pervertida. O cânon das Escrituras continua a ser atacado por alguns supostos cristãos. Certos homens insistem em recosturar o véu. A simonia permanece desgraçando a autenticidade do cristianismo.
No presente artigo poderemos ver que, na ânsia de alguns em querer reinventar a roda, trouxeram à tona heresias que não possuem nada de novo. São apenas continuações ou evoluções de ideias antigas, as quais permearam os primeiros cinco séculos da era cristã.
Misticismo e revelações
A maioria das heresias ocorre em virtude da ênfase exageradamente mística que alguns dão à religiosidade.[1] É certo que Deus é um ser pessoal e que se relaciona com seu povo. Todavia, devemos buscar explicações para nossas experiências à luz da Palavra de Deus e não vice-versa. Berkhof diz que, esta “posição deve ser sustentada em oposição a todas as classes de místicos”, pois eles alegam revelações especiais, bem como um conhecimento metafísico não mediado pela Palavra de Deus, o que pode nos levar “a um oceano de ilimitado subjetivismo”.[2]
Essa influência parte de um dos primeiros grupos heréticos que os cristãos tiveram que enfrentar: os gnósticos. Este termo deriva do grego, gnosis, que significa conhecimento. Tais pessoas acreditavam que existia uma revelação secreta e que somente pessoas especiais tinham o privilégio de ter acesso a elas. Para isso, usavam da astrologia, ocultismo, numerologia e outras práticas de adivinhação. Eles também negavam a natureza humana de Jesus. Era contra esse grupo que o Apóstolo João escrevia alertando os cristãos primitivos (1 Jo 4.1-3).
Os “cristãos” gnósticos provavelmente foram influenciados pelas religiões de mistério que os romanos haviam importado.[3] Dentre elas, podemos citar o mitraísmo, uma religião da antiga Pérsia e da Índia e que tinha muita popularidade entre os soldados romanos. Segundo essa religião, Mitra era o deus da luz e da sabedoria, o qual matou o touro sagrado. Logo após mata-lo, saíram todas as espécies boas da fauna e da flora do cadáver do touro. Eles acreditavam, ainda, que a imortalidade era era recebida através de rituais e de um rigoroso sistema ético.[4]
Na história da Igreja, alguns movimentos deram maior ênfase ao relacionamento pessoal com Deus, a fim de vivermos uma vida mais piedosa. O pietismo foi um desses. Ao passo que os luteranos haviam se dedicado ao conhecimento intelectual das doutrinas e haviam entrado num estado de relapso prático, numa espécie de secularização da igreja, o grupo citado buscava algo mais equilibrado, isto é, mais piedade e intimidade com Deus, sem no entanto, cair num cristianismo superficial.[5] Após estes, podemos citar os moravianos e o movimento wesleyano, os quais deram forte influência para o movimento pentecostal clássico.
Apesar de movimentos legítimos como os que foram citados, outros acabaram se desviando dos fundamentos escrituríticos. O descuido empírico levou muitas pessoas a afirmarem aberrações teológicas e até mesmo a negarem Cristo, como é o caso do islamismo. Experiências angelicais, como aconteceu no mormonismo, levou Joseph Smith a se afastar da ortodoxia e a contaminar a mentalidade de vários desconhecedores da Palavra de Deus (cf Gl 1.8).
Lutero, afirmando o princípio sola scriptura, tomou uma medida drástica contra as experiências extra-bíblicas: “Fiz uma aliança com Deus: que Ele não me mande visões, nem sonhos nem mesmo anjos. Estou satisfeito com o dom das Escrituras Sagradas, que me dão instrução abundante e tudo o que preciso conhecer tanto para esta vida quanto para a que há de vir”.[6]
Graça barata
É assim que poderíamos conceituar os ensinos do pregador cingapuriano Joseph Prince contidos em seu Best-seller “Destined to Reign” (Destinados a Reinar). A expressão “graça barata” foi cunhada pela primeira vez pelo teólogo alemão, Dietrich Bonhoeffer. Para ele, “A graça barata é a pregação do perdão sem arrependimento, o batismo sem a disciplina comunitária, é a Ceia do Senhor sem confissão dos pecados, é a absolvição sem confissão pessoal. A graça barata é a graça sem discipulado, a graça sem a cruz, a graça sem Jesus Cristo vivo, encarnado”.[7] A graça barata tem sido mais chamada de “hipergraça” atualmente, tendo em vista a ênfase que seus proponentes dão nas conquistas do sacrifício de Cristo a despeito da santificação.
Prince ensina que nossos pecados do passado, presente e futuro já foram perdoados e que desta forma não é mais necessário que um cristão peça perdão a Deus caso venha a pecar. Além disso, ele crê que Deus não pune o homem por suas falhas e encontra apoio para esse argumento nas epístolas paulinas. Segundo ele, os demais livros são legalistas e não expressam genuinamente a graça de Deus, o qual até era punitivo e agia com justiça na Antiga Aliança, mas que na Nova a graça é o atributo em evidência. Ele baseia toda sua doutrina em torno de uma “graça” mal compreendida.[8]
Os ensinos de Prince, além de conduzirem ao antinomianismo, resgatam alguns aspectos da velha heresia marcionista. Marcião ensinava que os livros do Antigo Testamento estavam ultrapassados e rejeitava-os, usando seu próprio compêndio de livros sacros, os quais compreendiam o Evangelho de Lucas e as cartas de Paulo, exceto as pastorais. Ele propagava uma contradição de dois deuses: um Demiurgo inferior que criou o universo, o Deus do judaísmo (severo e manifesto na Lei) e um Deus supremo, cheio de graça e amor redentor, revelado em Cristo. Ele tinha convicção de que estava restaurando o “puro Evangelho”.[9]
Outra heresia relacionada a graça divina foi a de um grupo chamado em Apocalipse de Nicolaítas (Ap 2.6,15). A interpretação dessa passagem é analisada em pelo menos três perspectivas: 1) eram seguidores de Nicolau, um dos sete que foram designados diáconos em At 6 e que acabou deixando a ortodoxia; 2) gnósticos que queriam se infiltrar na igreja e 3) pessoas que seguiam o ensinamento de falsos Apóstolos e de Balaão.[10]
Embora não haja consenso sobre a origem dos nicolaítas, sabemos que eles pregavam uma versão inovadoramente imoral do Cristianismo. Era um evangelho sem exigências, liberal e sem proibições, no qual queriam gozar o melhor da igreja e o melhor do mundo. Eles incentivavam os crentes a comer comidas sacrificadas aos ídolos e diziam que o sexo antes e fora do casamento não era pecado, estimulando a imoralidade.[11]
Clemente de Alexandria disse que Nicolau (ele cria que fosse um dos sete diáconos) foi repreendido por se enciumar de sua mulher que era muito bonita. Respondendo a essa reprovação, ele disse que quem quisesse poderia tomá-la como esposa, ou seja, ter relações sexuais com ela. Clemente acrescenta, ainda, que Nicolau passou a ensinar que os apóstolos tinham permitido relações promíscuas e comunitárias com as mulheres.[12]
Eusébio de Cesaréia confirma a citação de Clemente em sua história eclesiástica. Entretanto, alega ter pesquisado sobre a vida de Nicolau e descobriu que, embora este tenha ensinado que “cada um deve ofender a própria carne”, ele mesmo não viveu com outra mulher a não ser sua esposa, manteve suas filhas em virgindade até idade avançada, bem como seu filho incorrupto. Eusébio entende que Nicolau tenha permitido sua mulher se relacionar com outros homens para suprimir sua paixão carnal e os prazeres que buscava com tamanho empenho.[13]
Infelizmente, alguns seguiram a prática nicolaíta e se entregaram às paixões sob a alegação de que a carne para nada se aproveita. Easton disse que “eles se pareciam com uma classe de cristãos professos, que procuravam introduzir na igreja uma falsa liberdade ou licenciosidade, desta forma abusando da doutrina da Graça ensinada por Paulo”.[14]
Kistemaker, entretanto, faz uma excelente colocação sobre o tema. Segundo ele, os crentes de Éfeso odiavam as obras dos nicolaítas e além de serem elogiados por conta disso, Jesus acrescenta que Ele odeia igualmente essas obras. “Note que o ódio é direcionado para as obras, não para pessoas. Jesus odeia o pecado, porém estende seu amor para o pecador. Enquanto o pecado é uma afronta a sua santidade, a missão de Jesus é conduzir os pecadores ao arrependimento”.[15]
Judaizantes
Se por um lado “se introduziram furtivamente certos homens (…) ímpios, que convertem em dissolução a graça de nosso Deus, e negam o nosso único Soberano e Senhor, Jesus Cristo” (Jd 4), por outro vieram alguns que tentaram recosturar o véu que foi rasgado de alto abaixo no dia da expiação de Cristo.
Alguns grupos judaizantes da atualidade criaram doutrinas singulares, tais como negar o uso do nome Jesus no idioma português, sob o pretexto de que esse nome deriva da forma grega iesus, cujo significado seria deus-cavalo (para eles deve-se usar todos os nomes bíblicos no idioma hebraico), sistematizar o Espírito Santo num entendimento unicista, negar a fórmula batismal de Mt 28.19,20, negar a inspiração dos livros neotestamentários, além de dogmatizar a guarda do sábado.[16]
Israel é uma nação de importância histórica, política, econômica, militar e religiosa. Foi lá o berço do monoteísmo e também lá que nasceram homens que marcaram suas gerações. O judaísmo tinha aspectos de uma Aliança feita de Deus para com os homens, todavia, esses aspectos eram sombras que apontavam para o futuro, para uma Nova Aliança ratificada e firmada pelo Sangue do Cordeiro Jesus Cristo (Cl 2.17). Embora o cristianismo traga consigo a história dos hebreus, é peculiar e diferente do judaísmo.
Nos primeiros anos da jovem Igreja fundada por Cristo e dirigida pelo Espírito Santo, alguns homens que se converteram religiosamente ao cristianismo, não quiseram abrir mão de alguns aspectos do judaísmo farisaico e fizeram de tudo para misturar o Evangelho puro e simples com a Lei de Moisés. Essa controvérsia trouxe sérios aborrecimentos ao Apóstolo Paulo, o qual exortou irmãos que estavam deixando a doutrina de Cristo para ir após outro evangelho em sua carta aos gálatas.
As principais religiões judaicas do primeiro século da era cristã eram os fariseus, saduceus, zelotes e essênios. Cada um desses grupos tinham costumes que lhes eram próprios e com a proliferação do cristianismo para os gentios, houve um grande choque cultural entre estes e os judeus, os quais quiseram impor a continuação da circuncisão.
Esta discrepância doutrinária trouxe uma discussão acalorada entre Paulo, Silas e os fariseus recém-convertidos. Tal controvérsia só pôde ser apaziguada em uma reunião conciliatória em Jerusalém por volta do ano 51. d.C.. Embora este concílio tenha definido as contramedidas solucionadoras, algumas práticas judaizantes insistem em bater a nossa porta nos dias de hoje.
Falsos Cristos e falsos profetas
Vez ou outra aparece alguém com ideias absurdamente loucas, se autoproclamando um emissário de Deus, um profeta especial ou até mesmo Cristo. Na Sibéria, por exemplo, um homem chamado Sergei Torop passou por uma experiência mística em Maio de 1990. Nessa ocasião, ele alega ter recebido uma revelação de que é a reencarnação de Jesus e tem arrebatado milhares de seguidores pelo mundo.
Além dele, outros homens fizeram a mesma exposição. Podemos destacar o inglês David Shapler, o americano Ernest L. Norman, o cômico brasileiro INRI Cristo, o suicida Jim Jones, o japonês já morto Shoko Asahara, o americano Michel Travesser e o porto-riquenho José Luís de Jesus Miranda (o mais perigoso entre eles).[17]
Champlin ainda enumera pelo menos seis falsos Cristos da antiguidade, a saber: Teudas (44 d.C.), Barcocabe (132 d.C.), Moisés cretense (400 d.C.), Davi Alroy (1160 d.C.), Asher Lammlein (1502 d.C.) e Sabbethai Zebi (1625-1676 d.C.).[18] Desde o século XIX podemos também destacar outros nomes: John Nichols Thom (1799-1838), Arnold Potter (1804-1872), Bahá’u’lláh (1817-1892), William W. Davies (1833-1906), Mirza Ghulam Ahmad, (1835-1908) e Lou de Palingboer (1898-1968).[19]
Outra pessoa que teve certa expressividade no Brasil foi o fundador da Igreja da Unificação, o Reverendo Sun Myung Moon. Ele alegava ter sido comissionado pelo próprio Jesus enquanto ainda era um espírito vagante para completar a missão messiânica, pois Cristo não teria conseguido termina-la por completo. [20] O unificacionismo ensina que a missão de Cristo era estabelecer uma nova humanidade, casando-se e tendo filhos purificados da natureza satânica implantada no homem através da queda de Adão.[21] A culpa da missão inacabada de Cristo era de João Batista que deveria ter seguido Jesus logo após batiza-lo. Dessa forma, Moon se auto declarava o paracleto de Deus.
Entre os anos 120 e 180 da era cristã, viveu Montano, um profeta da Frígia que tinha profecias e revelações sobre a segunda vinda, além de outras ideias inovadoras. Ele denominou-se o “paracleto”, isto é, aquele em quem se iniciaria e se findaria o ministério do Espírito Santo. Ele acreditava ser o consolador prometido.[22] Tertuliano, um dos mestres da igreja acabou se aliando ao montanismo no final de sua vida.
Batalha Espiritual
Existe um movimento no evangelicalismo pós-moderno que trouxe consigo uma gama de heresias problemáticas. Estamos nos referindo ao movimento de batalha espiritual. Este movimento consiste em enfatizar a guerra que os crentes enfrentam a todo o momento com satanás e suas hostes malignas. Possui uma visão dualística do reino de Deus.
A existência de anjos, demônios e de tentativas do inimigo de nossas almas em frustrar a propagação do Evangelho é inegável. Paulo estava preso quando escreveu sua epístola aos efésios e nessa ocasião tranquilizou-os sobre sua situação. O fato de ter sido preso não deveria desmotivar os demais irmãos na continuação da missão da Igreja. Destarte, ele avisa àqueles irmãos que, embora ele tenha sido perseguido pelos soldados romanos, seus reais adversários não eram eles e sim as hostes espirituais da maldade (Ef 6.12).
Não era necessário tomar espadas e combater líderes religiosos, políticos, soldados ou pessoas que não criam na mensagem de Boas Novas. Aliás, as armas da milícia de Cristo não são carnais, mas espirituais e poderosas o suficiente para derrubar raciocínios errados, bem como todo baluarte que se ergue contra o conhecimento de Cristo (2 Co 10.4,5).
Após observar os soldados que lhe guardavam no cárcere, Paulo ainda compara suas armas com nosso equipamento bélico espiritual. Ao invés de uma couraça de metal, devemos utilizar a couraça da justiça. Verdade ao invés de cinto. A pregação do Evangelho a toda criatura ao invés de sandálias de couro. A Palavra de Deus ao invés de um gládio romano. A fé ao invés de um escudo. Uma mente renovada em Cristo ao invés de um capacete.
O movimento da batalha espiritual é cheio de ramificações. O Dr. Augustus Nicodemus cita em seu livro “O Que Você Precisa Saber Sobre Batalha Espiritual” um estudo do Professor do Christian Counseling & Educational Foundation (CCEF), David Powlison, no qual são citadas quatro linhas do movimento em questão: 1) Os carismáticos, representado dentre várias personalidades por Benny Hinn; 2) Os dispensacionalistas, de orientação não-carismática, com uma filosofia menos fantástica e mais concentrada em aconselhamento pastoral e oração em favor pelos oprimidos, cujos proponentes mais conhecidos são Mike Bubeck e Merril Unger; 3) Uma linha mais moderada com representantes como Neil Anderson, Timothy Warner e Ed Murphy e 4) a que tem mais popularidade no Brasil, identificada com o diretor de Escola de Missões Mundiais do Seminário Fuller, C. Peter Wagner [23].
As principais controvérsias do movimento de batalha espiritual, são portanto, ensinos como mapeamento espiritual, espíritos territoriais, quebra de maldições, maldições hereditárias, transferências de espíritos, terceirização da culpa pelo pecado (tudo passa a ser culpa do diabo, inclusive as obras da carne), revelações demoníacas, criaturas místicas e folclóricas (lobisomens, vampiros e zumbis), supervalorização dos demônios em detrimento de Cristo, bem como atribuições de super poderes às hostes do mal.
O movimento da batalha espiritual acaba por resgatar um tipo de heresia que já foi combatida há séculos pela Igreja: o Maniqueísmo. Esse foi o movimento fundado por Mani, que foi considerado com o último dos gnósticos. Ele nasceu por volta de 216 d.C. na Babilônia e ensinava que Deus usou diversos servos, como Buda, Zoroastro, Jesus e, finalmente, ele mesmo, o profeta final (paracleto, como ele afirmava).
Dizia, ainda, que o universo é dualista, isto é, existem duas linhas morais em existência, distintas, eternas e invictas: a luz e as trevas. Segundo os maniqueístas, essas duas forças cósmicas eram iguais, porém, opostas entre si.[24] As ideias de Mani foram refutadas por Orígenes e Agostinho, sendo ainda rejeitadas pela Igreja por contrariar a Soberania de Deus em controlar todas as coisas, além de ser satanás uma mera criatura, diferentemente da forma como o consideravam.
Apesar dos exageros do movimento de guerra espiritual, “precisamos nos guardar contra dois perigos extremos. Não podemos tratá-lo com muita leviandade, para não subestimar seus perigos. Por outro lado, também não podemos nos interessar demais por ele”. [25]
Finalizando esta seção, é válido comentar que, a Bíblia afirma ainda que o adversário das nossas almas é astuto, isto é, possui uma habilidade para enganar as pessoas de forma inteligente e usa de ciladas, armadilhas bem elaboradas, como fez com Eva no jardim do Éden (Gn 3.1; Ef 6.11).
Todavia, o diabo não é invencível. Jesus riscou o escrito de dívida que era contra nós, cravando-o na cruz, onde despojou os principados e as potestades, exibiu-os publicamente e deles triunfou (Cl 2.14,15). Além disso, aguardamos o cumprimento da promessa de que “o Deus de paz em breve esmagará a Satanás debaixo dos nossos pés” (Rm 16.20 – paráfrase de nossos em vossos).
A divindade de Cristo
As principais heresias cristológicas dos tempos hodiernos são as das Testemunhas de Jeová. Esequias Soares escreveu uma excelente obra esgotando cada uma das controvérsias jeovistas. As TJ’s não creem que Jesus é Deus e traduziram Jo 1.1 como sendo Jesus “um deus”, admitindo uma espécie de henoteísmo, isto é, um politeísmo em que existe um deus superior a outros deuses súditos menores do que ele.[26]
Na concepção jeovista, portanto, Jesus é um deus inferior a Jeová, bem como criatura sua. Essa alegação fica ainda pior quando admitem satanás sendo um terceiro deus, baseados em 2 Co 4.4. Jesus e Cristo são duas coisas distintas na concepção das TJ’s. Ele teria se tornado Cristo somente após o batismo no Jordão. Depois de sua morte, o Jesus de Nazaré terrestre não fora ressuscitado, isto é, não houve ressurreição corporal, apenas espiritual. Afirmam, ainda, que a verdadeira identidade de Jesus é outra. Ele seria na verdade o Arcanjo Miguel.[27]
Uma vez negada a divindade de Cristo, a doutrina cristã da Trindade fica ausentada de uma pessoa, Cristo. Mas não é apenas Ele que fica fora de Seu posto. O Espírito Santo também. Para a doutrina jeovista, o Espírito Santo é nada mais, nada menos que uma força ativa impessoal.
Além disso, eles negam alguns atributos incomunicáveis de Deus (entenda-se aqui Jeová), alegando que Ele não é onipresente porque tem morada e não é onisciente porque não sabe o futuro e não sabia o resultado da prova de Abraão.[28]
Não é objetivo deste artigo analisar as heresias da Sociedade Torre de Vigia, pois além de falta de espaço sairia de nosso propósito inicial. Entretanto, como se vê, as TJ’s afetam não apenas doutrinas cristológicas, mas paracletológicas, teontológicas, soteriológicas, hamartiológicas e escatológicas também. Isso sem falar de outras heresias não citadas.
Destarte, mostraremos que as heresias expostas aqui possuem considerável tempo de existência e embora tenham sido descartadas pelos primeiros cristãos, sofreram mutações e fundições no arraial jeovista.
A primeira delas foi a controvérsia conhecida como arianismo. Ário foi presbítero de Alexandria. Ele ensinava que Jesus Cristo era um ser criado e que encarnou num corpo humano que faltava uma alma racional. Sua profissão de fé declarava que ele reconhecia apenas um único Deus que é o único não gerado (auto-existente), único eterno, único sem começo, único verdadeiro, único detentor de imortalidade, único sábio, único bom, único juiz, etc. O Filho então, na visão ariana, seria uma criatura formada a partir do nada e sem nenhum dos atributos incomunicáveis da divindade (sempiterno, onipotente, onisciente, onipresente).[29]
Nestório ensinava que existiam as duas naturezas (humana e divina), porém, negava que ambas as naturezas compunham uma verdadeira unidade. Assim sendo, ele acabou ensinando que as duas naturezas eram duas pessoas. Para ele, Jesus era um hospedeiro de Cristo.[30]
Os monarquianistas dinâmicos (ou adocianistas) diziam que Cristo tinha assumido a forma divina somente após o batismo. Para eles, Jesus era um homem comum e que depois foi escolhido ou adotado como filho de Deus.[31]
Além das controvérsias já citadas, muitas outras confusões foram feitas sobre a natureza de Cristo. Os ebionitas entendiam que Jesus fosse apenas humano; Os docetas criam que Ele fosse apenas divino e que Seu sofrimento tinha sido apenas simbólico; Os eutiquianistas (monofisistas) ensinavam, à semelhança dos atuais localistas, uma natureza amalgamada. Os apolinarianistas negavam a natureza humana completa de Jesus, alegando que o Logos substituiu a alma humana de Cristo; cria-se, ainda, que Seu corpo era glorificado antes da ressurreição. Os sabelianos (monarquianistas modalistas ou somente modalistas) diziam ser Cristo o segundo modo das três sucessivas manifestações de Deus. Os patripassianistas, uma variante desta última, ensinavam que o próprio Pai havia morrido na cruz (patripassianismo).
Conclusão
Olhar para o passado nos ajuda a refletir sobre o presente e a pensar como queremos ser no futuro. Estudar as heresias primitivas nos capacita a entender o reflexo de suas controvérsias na atualidade e prevenir futuros resgates do que já foi antes rejeitado.
Embora dezenas de heresias tenham sido citadas aqui, muitas outras ainda ficaram faltando. Algumas por falta de espaço, outras por falta de pertinência temática. Contudo, que a Igreja continue utilizando o divino par de lentes que “coletando-nos na mente conhecimento de Deus de outra sorte confuso, dissipada a escuridão, mostra-nos em diáfana clareza o Deus verdadeiro”,[32] afinal, “A Bíblia, toda a Bíblia e nada mais do que a Bíblia, é a religião da igreja de Cristo.”[33] Ela é efetivamente “absoluta ou obsoleta”.[34]
Introdução
A Bíblia trata do caráter apologético das doutrinas centrais da fé cristã em praticamente todos os seus livros do Novo Testamento. Desde a ressurreição de Cristo, muitas heresias se introduziram no meio da Igreja. Embora os Apóstolos, os pais apostólicos, os pais apologistas e os pais polemistas tenham lutado pela fé que uma vez nos foi dada, alguns resquícios dessas falsas doutrinas permaneceram e/ou evoluíram para os séculos posteriores.
Na presente era da Igreja, encontramos esses resíduos primitivos em conceitos teológicos profundamente equivocados. Os atributos de Deus são confundidos em muitas seitas pseudo-cristãs. A natureza de Cristo ainda sofre má interpretação em relação a Sua divindade e humanidade. O Espírito Santo é questionado em alguns grupos religiosos. A doutrina da graça ainda é pervertida. O cânon das Escrituras continua a ser atacado por alguns supostos cristãos. Certos homens insistem em recosturar o véu. A simonia permanece desgraçando a autenticidade do cristianismo.
No presente artigo poderemos ver que, na ânsia de alguns em querer reinventar a roda, trouxeram à tona heresias que não possuem nada de novo. São apenas continuações ou evoluções de ideias antigas, as quais permearam os primeiros cinco séculos da era cristã.
Misticismo e revelações
A maioria das heresias ocorre em virtude da ênfase exageradamente mística que alguns dão à religiosidade.[1] É certo que Deus é um ser pessoal e que se relaciona com seu povo. Todavia, devemos buscar explicações para nossas experiências à luz da Palavra de Deus e não vice-versa. Berkhof diz que, esta “posição deve ser sustentada em oposição a todas as classes de místicos”, pois eles alegam revelações especiais, bem como um conhecimento metafísico não mediado pela Palavra de Deus, o que pode nos levar “a um oceano de ilimitado subjetivismo”.[2]
Essa influência parte de um dos primeiros grupos heréticos que os cristãos tiveram que enfrentar: os gnósticos. Este termo deriva do grego, gnosis, que significa conhecimento. Tais pessoas acreditavam que existia uma revelação secreta e que somente pessoas especiais tinham o privilégio de ter acesso a elas. Para isso, usavam da astrologia, ocultismo, numerologia e outras práticas de adivinhação. Eles também negavam a natureza humana de Jesus. Era contra esse grupo que o Apóstolo João escrevia alertando os cristãos primitivos (1 Jo 4.1-3).
Os “cristãos” gnósticos provavelmente foram influenciados pelas religiões de mistério que os romanos haviam importado.[3] Dentre elas, podemos citar o mitraísmo, uma religião da antiga Pérsia e da Índia e que tinha muita popularidade entre os soldados romanos. Segundo essa religião, Mitra era o deus da luz e da sabedoria, o qual matou o touro sagrado. Logo após mata-lo, saíram todas as espécies boas da fauna e da flora do cadáver do touro. Eles acreditavam, ainda, que a imortalidade era era recebida através de rituais e de um rigoroso sistema ético.[4]
Na história da Igreja, alguns movimentos deram maior ênfase ao relacionamento pessoal com Deus, a fim de vivermos uma vida mais piedosa. O pietismo foi um desses. Ao passo que os luteranos haviam se dedicado ao conhecimento intelectual das doutrinas e haviam entrado num estado de relapso prático, numa espécie de secularização da igreja, o grupo citado buscava algo mais equilibrado, isto é, mais piedade e intimidade com Deus, sem no entanto, cair num cristianismo superficial.[5] Após estes, podemos citar os moravianos e o movimento wesleyano, os quais deram forte influência para o movimento pentecostal clássico.
Apesar de movimentos legítimos como os que foram citados, outros acabaram se desviando dos fundamentos escrituríticos. O descuido empírico levou muitas pessoas a afirmarem aberrações teológicas e até mesmo a negarem Cristo, como é o caso do islamismo. Experiências angelicais, como aconteceu no mormonismo, levou Joseph Smith a se afastar da ortodoxia e a contaminar a mentalidade de vários desconhecedores da Palavra de Deus (cf Gl 1.8).
Lutero, afirmando o princípio sola scriptura, tomou uma medida drástica contra as experiências extra-bíblicas: “Fiz uma aliança com Deus: que Ele não me mande visões, nem sonhos nem mesmo anjos. Estou satisfeito com o dom das Escrituras Sagradas, que me dão instrução abundante e tudo o que preciso conhecer tanto para esta vida quanto para a que há de vir”.[6]
Graça barata
É assim que poderíamos conceituar os ensinos do pregador cingapuriano Joseph Prince contidos em seu Best-seller “Destined to Reign” (Destinados a Reinar). A expressão “graça barata” foi cunhada pela primeira vez pelo teólogo alemão, Dietrich Bonhoeffer. Para ele, “A graça barata é a pregação do perdão sem arrependimento, o batismo sem a disciplina comunitária, é a Ceia do Senhor sem confissão dos pecados, é a absolvição sem confissão pessoal. A graça barata é a graça sem discipulado, a graça sem a cruz, a graça sem Jesus Cristo vivo, encarnado”.[7] A graça barata tem sido mais chamada de “hipergraça” atualmente, tendo em vista a ênfase que seus proponentes dão nas conquistas do sacrifício de Cristo a despeito da santificação.
Prince ensina que nossos pecados do passado, presente e futuro já foram perdoados e que desta forma não é mais necessário que um cristão peça perdão a Deus caso venha a pecar. Além disso, ele crê que Deus não pune o homem por suas falhas e encontra apoio para esse argumento nas epístolas paulinas. Segundo ele, os demais livros são legalistas e não expressam genuinamente a graça de Deus, o qual até era punitivo e agia com justiça na Antiga Aliança, mas que na Nova a graça é o atributo em evidência. Ele baseia toda sua doutrina em torno de uma “graça” mal compreendida.[8]
Os ensinos de Prince, além de conduzirem ao antinomianismo, resgatam alguns aspectos da velha heresia marcionista. Marcião ensinava que os livros do Antigo Testamento estavam ultrapassados e rejeitava-os, usando seu próprio compêndio de livros sacros, os quais compreendiam o Evangelho de Lucas e as cartas de Paulo, exceto as pastorais. Ele propagava uma contradição de dois deuses: um Demiurgo inferior que criou o universo, o Deus do judaísmo (severo e manifesto na Lei) e um Deus supremo, cheio de graça e amor redentor, revelado em Cristo. Ele tinha convicção de que estava restaurando o “puro Evangelho”.[9]
Outra heresia relacionada a graça divina foi a de um grupo chamado em Apocalipse de Nicolaítas (Ap 2.6,15). A interpretação dessa passagem é analisada em pelo menos três perspectivas: 1) eram seguidores de Nicolau, um dos sete que foram designados diáconos em At 6 e que acabou deixando a ortodoxia; 2) gnósticos que queriam se infiltrar na igreja e 3) pessoas que seguiam o ensinamento de falsos Apóstolos e de Balaão.[10]
Embora não haja consenso sobre a origem dos nicolaítas, sabemos que eles pregavam uma versão inovadoramente imoral do Cristianismo. Era um evangelho sem exigências, liberal e sem proibições, no qual queriam gozar o melhor da igreja e o melhor do mundo. Eles incentivavam os crentes a comer comidas sacrificadas aos ídolos e diziam que o sexo antes e fora do casamento não era pecado, estimulando a imoralidade.[11]
Clemente de Alexandria disse que Nicolau (ele cria que fosse um dos sete diáconos) foi repreendido por se enciumar de sua mulher que era muito bonita. Respondendo a essa reprovação, ele disse que quem quisesse poderia tomá-la como esposa, ou seja, ter relações sexuais com ela. Clemente acrescenta, ainda, que Nicolau passou a ensinar que os apóstolos tinham permitido relações promíscuas e comunitárias com as mulheres.[12]
Eusébio de Cesaréia confirma a citação de Clemente em sua história eclesiástica. Entretanto, alega ter pesquisado sobre a vida de Nicolau e descobriu que, embora este tenha ensinado que “cada um deve ofender a própria carne”, ele mesmo não viveu com outra mulher a não ser sua esposa, manteve suas filhas em virgindade até idade avançada, bem como seu filho incorrupto. Eusébio entende que Nicolau tenha permitido sua mulher se relacionar com outros homens para suprimir sua paixão carnal e os prazeres que buscava com tamanho empenho.[13]
Infelizmente, alguns seguiram a prática nicolaíta e se entregaram às paixões sob a alegação de que a carne para nada se aproveita. Easton disse que “eles se pareciam com uma classe de cristãos professos, que procuravam introduzir na igreja uma falsa liberdade ou licenciosidade, desta forma abusando da doutrina da Graça ensinada por Paulo”.[14]
Kistemaker, entretanto, faz uma excelente colocação sobre o tema. Segundo ele, os crentes de Éfeso odiavam as obras dos nicolaítas e além de serem elogiados por conta disso, Jesus acrescenta que Ele odeia igualmente essas obras. “Note que o ódio é direcionado para as obras, não para pessoas. Jesus odeia o pecado, porém estende seu amor para o pecador. Enquanto o pecado é uma afronta a sua santidade, a missão de Jesus é conduzir os pecadores ao arrependimento”.[15]
Judaizantes
Se por um lado “se introduziram furtivamente certos homens (…) ímpios, que convertem em dissolução a graça de nosso Deus, e negam o nosso único Soberano e Senhor, Jesus Cristo” (Jd 4), por outro vieram alguns que tentaram recosturar o véu que foi rasgado de alto abaixo no dia da expiação de Cristo.
Alguns grupos judaizantes da atualidade criaram doutrinas singulares, tais como negar o uso do nome Jesus no idioma português, sob o pretexto de que esse nome deriva da forma grega iesus, cujo significado seria deus-cavalo (para eles deve-se usar todos os nomes bíblicos no idioma hebraico), sistematizar o Espírito Santo num entendimento unicista, negar a fórmula batismal de Mt 28.19,20, negar a inspiração dos livros neotestamentários, além de dogmatizar a guarda do sábado.[16]
Israel é uma nação de importância histórica, política, econômica, militar e religiosa. Foi lá o berço do monoteísmo e também lá que nasceram homens que marcaram suas gerações. O judaísmo tinha aspectos de uma Aliança feita de Deus para com os homens, todavia, esses aspectos eram sombras que apontavam para o futuro, para uma Nova Aliança ratificada e firmada pelo Sangue do Cordeiro Jesus Cristo (Cl 2.17). Embora o cristianismo traga consigo a história dos hebreus, é peculiar e diferente do judaísmo.
Nos primeiros anos da jovem Igreja fundada por Cristo e dirigida pelo Espírito Santo, alguns homens que se converteram religiosamente ao cristianismo, não quiseram abrir mão de alguns aspectos do judaísmo farisaico e fizeram de tudo para misturar o Evangelho puro e simples com a Lei de Moisés. Essa controvérsia trouxe sérios aborrecimentos ao Apóstolo Paulo, o qual exortou irmãos que estavam deixando a doutrina de Cristo para ir após outro evangelho em sua carta aos gálatas.
As principais religiões judaicas do primeiro século da era cristã eram os fariseus, saduceus, zelotes e essênios. Cada um desses grupos tinham costumes que lhes eram próprios e com a proliferação do cristianismo para os gentios, houve um grande choque cultural entre estes e os judeus, os quais quiseram impor a continuação da circuncisão.
Esta discrepância doutrinária trouxe uma discussão acalorada entre Paulo, Silas e os fariseus recém-convertidos. Tal controvérsia só pôde ser apaziguada em uma reunião conciliatória em Jerusalém por volta do ano 51. d.C.. Embora este concílio tenha definido as contramedidas solucionadoras, algumas práticas judaizantes insistem em bater a nossa porta nos dias de hoje.
Falsos Cristos e falsos profetas
Vez ou outra aparece alguém com ideias absurdamente loucas, se autoproclamando um emissário de Deus, um profeta especial ou até mesmo Cristo. Na Sibéria, por exemplo, um homem chamado Sergei Torop passou por uma experiência mística em Maio de 1990. Nessa ocasião, ele alega ter recebido uma revelação de que é a reencarnação de Jesus e tem arrebatado milhares de seguidores pelo mundo.
Além dele, outros homens fizeram a mesma exposição. Podemos destacar o inglês David Shapler, o americano Ernest L. Norman, o cômico brasileiro INRI Cristo, o suicida Jim Jones, o japonês já morto Shoko Asahara, o americano Michel Travesser e o porto-riquenho José Luís de Jesus Miranda (o mais perigoso entre eles).[17]
Champlin ainda enumera pelo menos seis falsos Cristos da antiguidade, a saber: Teudas (44 d.C.), Barcocabe (132 d.C.), Moisés cretense (400 d.C.), Davi Alroy (1160 d.C.), Asher Lammlein (1502 d.C.) e Sabbethai Zebi (1625-1676 d.C.).[18] Desde o século XIX podemos também destacar outros nomes: John Nichols Thom (1799-1838), Arnold Potter (1804-1872), Bahá’u’lláh (1817-1892), William W. Davies (1833-1906), Mirza Ghulam Ahmad, (1835-1908) e Lou de Palingboer (1898-1968).[19]
Outra pessoa que teve certa expressividade no Brasil foi o fundador da Igreja da Unificação, o Reverendo Sun Myung Moon. Ele alegava ter sido comissionado pelo próprio Jesus enquanto ainda era um espírito vagante para completar a missão messiânica, pois Cristo não teria conseguido termina-la por completo. [20] O unificacionismo ensina que a missão de Cristo era estabelecer uma nova humanidade, casando-se e tendo filhos purificados da natureza satânica implantada no homem através da queda de Adão.[21] A culpa da missão inacabada de Cristo era de João Batista que deveria ter seguido Jesus logo após batiza-lo. Dessa forma, Moon se auto declarava o paracleto de Deus.
Entre os anos 120 e 180 da era cristã, viveu Montano, um profeta da Frígia que tinha profecias e revelações sobre a segunda vinda, além de outras ideias inovadoras. Ele denominou-se o “paracleto”, isto é, aquele em quem se iniciaria e se findaria o ministério do Espírito Santo. Ele acreditava ser o consolador prometido.[22] Tertuliano, um dos mestres da igreja acabou se aliando ao montanismo no final de sua vida.
Batalha Espiritual
Existe um movimento no evangelicalismo pós-moderno que trouxe consigo uma gama de heresias problemáticas. Estamos nos referindo ao movimento de batalha espiritual. Este movimento consiste em enfatizar a guerra que os crentes enfrentam a todo o momento com satanás e suas hostes malignas. Possui uma visão dualística do reino de Deus.
A existência de anjos, demônios e de tentativas do inimigo de nossas almas em frustrar a propagação do Evangelho é inegável. Paulo estava preso quando escreveu sua epístola aos efésios e nessa ocasião tranquilizou-os sobre sua situação. O fato de ter sido preso não deveria desmotivar os demais irmãos na continuação da missão da Igreja. Destarte, ele avisa àqueles irmãos que, embora ele tenha sido perseguido pelos soldados romanos, seus reais adversários não eram eles e sim as hostes espirituais da maldade (Ef 6.12).
Não era necessário tomar espadas e combater líderes religiosos, políticos, soldados ou pessoas que não criam na mensagem de Boas Novas. Aliás, as armas da milícia de Cristo não são carnais, mas espirituais e poderosas o suficiente para derrubar raciocínios errados, bem como todo baluarte que se ergue contra o conhecimento de Cristo (2 Co 10.4,5).
Após observar os soldados que lhe guardavam no cárcere, Paulo ainda compara suas armas com nosso equipamento bélico espiritual. Ao invés de uma couraça de metal, devemos utilizar a couraça da justiça. Verdade ao invés de cinto. A pregação do Evangelho a toda criatura ao invés de sandálias de couro. A Palavra de Deus ao invés de um gládio romano. A fé ao invés de um escudo. Uma mente renovada em Cristo ao invés de um capacete.
O movimento da batalha espiritual é cheio de ramificações. O Dr. Augustus Nicodemus cita em seu livro “O Que Você Precisa Saber Sobre Batalha Espiritual” um estudo do Professor do Christian Counseling & Educational Foundation (CCEF), David Powlison, no qual são citadas quatro linhas do movimento em questão: 1) Os carismáticos, representado dentre várias personalidades por Benny Hinn; 2) Os dispensacionalistas, de orientação não-carismática, com uma filosofia menos fantástica e mais concentrada em aconselhamento pastoral e oração em favor pelos oprimidos, cujos proponentes mais conhecidos são Mike Bubeck e Merril Unger; 3) Uma linha mais moderada com representantes como Neil Anderson, Timothy Warner e Ed Murphy e 4) a que tem mais popularidade no Brasil, identificada com o diretor de Escola de Missões Mundiais do Seminário Fuller, C. Peter Wagner [23].
As principais controvérsias do movimento de batalha espiritual, são portanto, ensinos como mapeamento espiritual, espíritos territoriais, quebra de maldições, maldições hereditárias, transferências de espíritos, terceirização da culpa pelo pecado (tudo passa a ser culpa do diabo, inclusive as obras da carne), revelações demoníacas, criaturas místicas e folclóricas (lobisomens, vampiros e zumbis), supervalorização dos demônios em detrimento de Cristo, bem como atribuições de super poderes às hostes do mal.
O movimento da batalha espiritual acaba por resgatar um tipo de heresia que já foi combatida há séculos pela Igreja: o Maniqueísmo. Esse foi o movimento fundado por Mani, que foi considerado com o último dos gnósticos. Ele nasceu por volta de 216 d.C. na Babilônia e ensinava que Deus usou diversos servos, como Buda, Zoroastro, Jesus e, finalmente, ele mesmo, o profeta final (paracleto, como ele afirmava).
Dizia, ainda, que o universo é dualista, isto é, existem duas linhas morais em existência, distintas, eternas e invictas: a luz e as trevas. Segundo os maniqueístas, essas duas forças cósmicas eram iguais, porém, opostas entre si.[24] As ideias de Mani foram refutadas por Orígenes e Agostinho, sendo ainda rejeitadas pela Igreja por contrariar a Soberania de Deus em controlar todas as coisas, além de ser satanás uma mera criatura, diferentemente da forma como o consideravam.
Apesar dos exageros do movimento de guerra espiritual, “precisamos nos guardar contra dois perigos extremos. Não podemos tratá-lo com muita leviandade, para não subestimar seus perigos. Por outro lado, também não podemos nos interessar demais por ele”. [25]
Finalizando esta seção, é válido comentar que, a Bíblia afirma ainda que o adversário das nossas almas é astuto, isto é, possui uma habilidade para enganar as pessoas de forma inteligente e usa de ciladas, armadilhas bem elaboradas, como fez com Eva no jardim do Éden (Gn 3.1; Ef 6.11).
Todavia, o diabo não é invencível. Jesus riscou o escrito de dívida que era contra nós, cravando-o na cruz, onde despojou os principados e as potestades, exibiu-os publicamente e deles triunfou (Cl 2.14,15). Além disso, aguardamos o cumprimento da promessa de que “o Deus de paz em breve esmagará a Satanás debaixo dos nossos pés” (Rm 16.20 – paráfrase de nossos em vossos).
A divindade de Cristo
As principais heresias cristológicas dos tempos hodiernos são as das Testemunhas de Jeová. Esequias Soares escreveu uma excelente obra esgotando cada uma das controvérsias jeovistas. As TJ’s não creem que Jesus é Deus e traduziram Jo 1.1 como sendo Jesus “um deus”, admitindo uma espécie de henoteísmo, isto é, um politeísmo em que existe um deus superior a outros deuses súditos menores do que ele.[26]
Na concepção jeovista, portanto, Jesus é um deus inferior a Jeová, bem como criatura sua. Essa alegação fica ainda pior quando admitem satanás sendo um terceiro deus, baseados em 2 Co 4.4. Jesus e Cristo são duas coisas distintas na concepção das TJ’s. Ele teria se tornado Cristo somente após o batismo no Jordão. Depois de sua morte, o Jesus de Nazaré terrestre não fora ressuscitado, isto é, não houve ressurreição corporal, apenas espiritual. Afirmam, ainda, que a verdadeira identidade de Jesus é outra. Ele seria na verdade o Arcanjo Miguel.[27]
Uma vez negada a divindade de Cristo, a doutrina cristã da Trindade fica ausentada de uma pessoa, Cristo. Mas não é apenas Ele que fica fora de Seu posto. O Espírito Santo também. Para a doutrina jeovista, o Espírito Santo é nada mais, nada menos que uma força ativa impessoal.
Além disso, eles negam alguns atributos incomunicáveis de Deus (entenda-se aqui Jeová), alegando que Ele não é onipresente porque tem morada e não é onisciente porque não sabe o futuro e não sabia o resultado da prova de Abraão.[28]
Não é objetivo deste artigo analisar as heresias da Sociedade Torre de Vigia, pois além de falta de espaço sairia de nosso propósito inicial. Entretanto, como se vê, as TJ’s afetam não apenas doutrinas cristológicas, mas paracletológicas, teontológicas, soteriológicas, hamartiológicas e escatológicas também. Isso sem falar de outras heresias não citadas.
Destarte, mostraremos que as heresias expostas aqui possuem considerável tempo de existência e embora tenham sido descartadas pelos primeiros cristãos, sofreram mutações e fundições no arraial jeovista.
A primeira delas foi a controvérsia conhecida como arianismo. Ário foi presbítero de Alexandria. Ele ensinava que Jesus Cristo era um ser criado e que encarnou num corpo humano que faltava uma alma racional. Sua profissão de fé declarava que ele reconhecia apenas um único Deus que é o único não gerado (auto-existente), único eterno, único sem começo, único verdadeiro, único detentor de imortalidade, único sábio, único bom, único juiz, etc. O Filho então, na visão ariana, seria uma criatura formada a partir do nada e sem nenhum dos atributos incomunicáveis da divindade (sempiterno, onipotente, onisciente, onipresente).[29]
Nestório ensinava que existiam as duas naturezas (humana e divina), porém, negava que ambas as naturezas compunham uma verdadeira unidade. Assim sendo, ele acabou ensinando que as duas naturezas eram duas pessoas. Para ele, Jesus era um hospedeiro de Cristo.[30]
Os monarquianistas dinâmicos (ou adocianistas) diziam que Cristo tinha assumido a forma divina somente após o batismo. Para eles, Jesus era um homem comum e que depois foi escolhido ou adotado como filho de Deus.[31]
Além das controvérsias já citadas, muitas outras confusões foram feitas sobre a natureza de Cristo. Os ebionitas entendiam que Jesus fosse apenas humano; Os docetas criam que Ele fosse apenas divino e que Seu sofrimento tinha sido apenas simbólico; Os eutiquianistas (monofisistas) ensinavam, à semelhança dos atuais localistas, uma natureza amalgamada. Os apolinarianistas negavam a natureza humana completa de Jesus, alegando que o Logos substituiu a alma humana de Cristo; cria-se, ainda, que Seu corpo era glorificado antes da ressurreição. Os sabelianos (monarquianistas modalistas ou somente modalistas) diziam ser Cristo o segundo modo das três sucessivas manifestações de Deus. Os patripassianistas, uma variante desta última, ensinavam que o próprio Pai havia morrido na cruz (patripassianismo).
Conclusão
Olhar para o passado nos ajuda a refletir sobre o presente e a pensar como queremos ser no futuro. Estudar as heresias primitivas nos capacita a entender o reflexo de suas controvérsias na atualidade e prevenir futuros resgates do que já foi antes rejeitado.
Embora dezenas de heresias tenham sido citadas aqui, muitas outras ainda ficaram faltando. Algumas por falta de espaço, outras por falta de pertinência temática. Contudo, que a Igreja continue utilizando o divino par de lentes que “coletando-nos na mente conhecimento de Deus de outra sorte confuso, dissipada a escuridão, mostra-nos em diáfana clareza o Deus verdadeiro”,[32] afinal, “A Bíblia, toda a Bíblia e nada mais do que a Bíblia, é a religião da igreja de Cristo.”[33] Ela é efetivamente “absoluta ou obsoleta”.[34]
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