Semeando o Evangelho

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Semear a Verdade e o Amor de Deus

sexta-feira, 21 de abril de 2017

UM CLAMOR PELA SANIDADE DO EVANGELHO EM MISSÕES (PARTE 3)

Parte III: Super ansioso por contextualização

A cena foi tão desconcertante que parecia ser um filme de Hollywood (ou Bollywood). Nós estamos em um movimentado bazar em uma grande cidade no Norte da Índia. Um cara branco com calças jeans skinny pilota uma mini motocicleta para nos encontrar. Ele nos guia através de estreitos “gullies” (becos) dentro da pequena e populosa vizinhança em que ele vive e mora. Nós ouvimos sobre o ministério em que ele e seu amigo estão engajados ali. A meta deles: ganhar para Cristo um grupo específico. Mas eles não querem trabalhar juntamente com a igreja nacional estabelecida. Eles querem ganhar grupos de pessoas para Cristo, mas não querem ensinar a essas pessoas como é ser um seguidor de Cristo. Ao invés disso, eles querem que as pessoas sejam capazes de seguirem a Cristo “a partir de dentro de suas próprias culturas”. Porém, em muitos casos, o que resulta disso é uma confusa mistura de religiões que não tem virtualmente semelhança alguma com o Cristianismo bíblico.

Há mais do que somente alguns desses obreiros estrangeiros trabalhando na Índia.

Eu já mencionei a paixão pelos números e o fascínio do Ocidente por testemunhos “sobrenaturais”. Aqui, quero colocar outra questão que está rapidamente ganhando impulso e causando problemas na Índia, assim como tem acontecido no mundo mulçumano: formas extremas de “contextualização”.

O que eu quero dizer com contextualização? A palavra usada nos estudos sobre missões descreve como o evangelho deve ser apresentado e tornado claro em diferentes culturas. Eu sou contra a contextualização? Claro que não! Em meus anos de ministério na Índia, eu nunca vesti uma gravata para pregar. Eu geralmente prego descalço e as pessoas nas congregações se vestem com roupas indianas e sentam-se no chão. Quando eu prego no Ocidente, eu quase sempre visto terno e gravata. O tom da minha pregação é diferente, as ilustrações que eu uso são diferentes e as questões para as quais eu aplico as Escrituras são diferentes, tudo dependente do contexto. E, sim, minha esposa vestiu um saree (e não um vestido) no dia do nosso casamento. Certamente, eu sou grato aos muitos missionários do Ocidente que contextualizam a mensagem da Bíblia de formas que são biblicamente apoiadas, úteis e apropriadas à cultura.

Meu propósito aqui não é criticar a contextualização. Eu também não quero entrar em discussões tão detalhadas sobre o espectro da contextualização e o quanto de contextualização é legítimo. Ao invés disso, eu desejo aumentar a consciência sobre certas formas ilegítimas de contextualização que estão criando raízes na Índia. Essas formas de contextualização recebem seu ímpeto a partir de missionários ocidentais que se recusam a cooperar com as igrejas nacionais estabelecidas, crendo que eles podem entender mais sobre a cultura indiana do que qualquer um. E assim como os “Movimentos dos infiltrados” do mundo mulçumano,[4] a maioria desses ensinos resultam em falsos movimentos heréticos na Índia, bem distantes do Cristianismo bíblico. É minha oração que aquilo que compartilho aqui possa desafiar irmãos e irmãs no Ocidente a cessarem o suporte a missionários que propagam falsos ensinos e que praticam métodos danosos de ministério.

HIndus seguidores de cristo?
Alguns dos meus encontros com obreiros ocidentais cristãos na Índia me deixam profundamente perturbado. No último verão, eu estava visitando a Índia, quando minha equipe de ministério acabou topando com um desses caras – um americano que gastou a maior parte da última década na Índia. Ele nos considera cristãos indianos “ocidentalizados” demais e acha que ele é mais sintonizado com a cultura indiana, pois celebra festivais indianos e hindus – costumes que cristãos indianos como eu têm rejeitado.  Esse ocidental crê que as coisas que ele faz irão ajudar a remover barreiras da crença entre os hindus da alta casta que ele está buscando alcançar.

Há outros como ele que aparecem no horizonte de missões. Eles vêm de variados planos de fundo no Ocidente, mas muitos deles são cristãos hispsters do Canadá ou da costa oeste dos EUA, que bebem leite e vestem calças jeans skinny. Eles, seja lá por qual razão, parecem ter crescido entediados e desiludidos com o Cristianismo tradicional. Eles estão procurando por algo novo. Eles leram os últimos grandes livros sobre missões, contextualização e cultura (e talvez tenham um pequeno conhecimento da literatura da igreja emergente e da filosofia pós-moderna). E, então, eles chegam à Índia e tentam formar comunidades de “Yeshu-Baktha Hindus” ou “Hindus discípulos de Jesus”. Eles não querem ser identificados como “cristãos” porque consideram isso “ocidental demais” (esqueça Atos 11.26!).

Nessas comunidades, um puja ou ritual de iniciação hindu feito no nome de Jesus acontece no lugar do batismo cristão. A “Ceia do Senhor” consiste em quebrar um coco e beber a água. Bhajans (músicas devocionais hindus) são cantadas em nome de Jesus ao invés de hinos cristãos. O lugar de adoração é iluminado por pequenos diyas (lâmpadas indianas a óleo tipicamente usadas em cerimônias religiosas hindus). A pregação não acha lugar nessas comunidades, pois o “monólogo” é considerado uma ideia ocidental. Esses grupos são liderados por “gurus” ao invés de “pastores”. E o enredo da Escritura é substituído pelo enredo emprestado da cultura nativa. Jesus é entendido em termos da mitologia hindu. E o sacrifício de Jesus é interpretado à luz dos Vedas.

Muitos que propagam tais ensinamentos normalmente o fazem a partir de bons motivos. Eles são cautelosos quanto a uma forma colonialista de missões que impõe a cultura ocidental sobre os cristãos nativos. Eles realmente querem ver um movimento cristão nativo estabelecido. Eles compraram a ideia da última “pesquisa de missões” que diz que remover barreiras culturais para a crença é a melhor forma de atingir o crescimento da igreja. E então eles vestem o Cristianismo com o traje de grupos culturais específicos, esperando que esses grupos aceitem a fé cristã enquanto retêm sua própria cultura.

Devemos provocar ciúmes no senhor?
Infelizmente, esses bem-intencionados proponentes do Cristianismo “contextualizado” não percebem que eles estão apresentando um evangelho deturpado e formando comunidades sub-cristãs. Eu vou responder aqui identificando quatro problemas sérios com esses movimentos de “contextualização”.

i. Sincretismo e uma cosmovisão bíblica

Primeiro, o resultado natural desses tipos de “contextualização” é o sincretismo do pior tipo – uma perigosa e amaldiçoada mistura das cosmovisões hindu e cristã. Em muitos casos sérios, eu não hesito em chamar esses movimentos de heréticos. Os fervorosos proponentes da “contextualização” pensam que estão preservando a cultura indiana, mas eles não percebem que, para os indianos (diferente do Ocidente), cultura, cosmovisão e religião são indissociáveis. A maioria dos indianos, incluindo os “cristãos ocidentalizados” como eu, bem como ex-hindus que confiaram em Cristo, reconhecem esse fato.

A estreita ligação entre cultura e religião na mente indiana é a razão pela qual a maioria dos indianos têm uma impressão negativa do Cristianismo, pois eles assumem que todas as culturas ocidentais são “culturas cristãs”. Mas nós sabemos que o Cristianismo não é um produto da cultura “ocidental”. Ao contrário disso, a mensagem cristã é uma cosmovisão que transforma todas as culturas, tanto orientais quanto ocidentais. O evangelho demanda uma renúncia do pensamento secular, da imoralidade e da vida libertina do Ocidente, assim como demanda uma renúncia da idolatria e da superstição do Oriente. Nós temos que proclamar o senhorio e a glória de Jesus, que são transculturais, ao invés de orientar nossas mensagens e nossa prática ao redor de grupos culturais específicos.

Os apóstolos nunca permitiram que culturas pagãs influenciassem a mensagem bíblica ou a forma de adoração. Ao invés disso, até na cultura pagã de Corinto, Paulo dá preeminência às Escrituras. Escrevendo para uma congregação predominantemente gentia em Corinto, Paulo chama esses cristãos a verem a identidade deles em termos da narrativa bíblica (1 Coríntios 10). Paulo descreve o que deveria acontecer em seus cultos e até dita como eles deveriam tomar a Ceia do Senhor (1 Coríntios 11-14). Paulo proclama a morte e a ressurreição de Cristo “segundo as Escrituras” (1 Coríntios 15.3-4), e não alguma metanarrativa cultural de Corinto. A Escritura forma o povo de Deus, e não vice-versa. Eu sempre me perguntei se há uma conexão entre os movimentos de contextualização e a influência do pós-modernismo. A autoridade é mudada da palavra de Deus revelada para a comunidade de leitores.

Proponentes dos movimentos “contextualizados” desprezam o princípio bíblico de que as trevas não têm comunhão com a luz e que Cristo não tem parte com Belial (2 Coríntios 6.14-15). E a Palavra de Cristo é mutilada em nome da “contextualização”.

Quando os cristãos indianos nacionais apresentam essas críticas, nós somos rotulados como sendo “ocidentalizados”. De fato, aos cristãos indianos com “plano de fundo cristão” é dito que nós não temos direito de falar dessas questões de forma alguma, pois nós somos a raiz do problema. Mas até quando os cristãos com “plano de fundo hindu” apresentam suas preocupações – e eu conheço muitos que apresentam – eles são colocados de lado como já tendo sido “ocidentalizados”. A ironia é surpreendente: Esses são ocidentais dizendo que eles sabem mais sobre a cultura indiana do que indianos que nasceram e cresceram na Índia.

ii. Cristo nos manda “ensinar”

Alguns dos advogados mais moderados da “contextualização” com quem eu tenho interagido me dizem que eles não querem que um entendimento ocidental do Cristianismo seja imposto às pessoas na Índia. Portanto, ao invés de ensinar aos indianos como é a vida e a adoração cristãs, eles pedem que eles leiam a Bíblia e cheguem às suas próprias conclusões. Parece bom, não parece?

Talvez, caso Cristo não houvesse ordenado o contrário. A Grande Comissão inclui o chamado a fazer discípulos, ensinando-os a obedecer tudo o que Cristo ordenou (Mateus 28.18-20). E as ordens de Cristo são reveladas na Palavra apostólica – a Bíblia. A Bíblia é que estabelece a agenda. A Bíblia forma a identidade cristã. A Bíblia nos mostra como é a vida e a adoração cristãs. E a Bíblia nos diz que Jesus equipa seu povo através de mestres (Efésios 4.11). Isso significa que nós temos que interpretar e aplicar a Palavra de Deus através das linhas éticas e culturais – algo como o que Paulo, a princípio um judeu, fez nas congregações que ele formou em culturas gentílicas e pagãs.  A noção de que as comunidades devem ler e chegar às suas próprias conclusões é, na verdade, enraizada na mentalidade pós-moderna que coloca a autoridade na comunidade, e não no texto.

iii. “Movimentos de infiltrados” e “cristãos secretos”

Outro resultado dos movimentos de “contextualização” é a emergência de “movimentos de infiltrados” hindus. Os proponentes dos “movimentos dos infiltrados” ensinam as pessoas a permanecerem “cristãos secretos” ou como um “hindus devotos a Jesus”(Hindus Yeshu-Bakhta) para que eles não sejam excluídos de suas famílias e comunidades, mas possam, ao invés disso,  permanecer do lado de dentro a fim de “eventualmente ganhar mais convertidos para Cristo”. Além disso, aqueles que advogam por essas formas de contextualização—uma direta violação de 2 Coríntios 6.14-18 (também de 1 Coríntios 7.39) – ensinam que as pessoas devem preferir casar com não cristãos de seus próprios planos de fundo e de grupos de casta de sua própria etnia a casar com cristãos de outros grupos. Eles também insistem que “os hindus seguidores de Jesus” nunca deveriam casar com “cristãos de plano de fundo cristão”.

Os desejos pragmáticos de manter culturas e fazer a igreja crescer resultam em uma diluição da mensagem do evangelho e em um abandono do chamado de Cristo sobre o custo da perseguição e da exclusão de parentes (Mateus 10.34-38; Marcos 8.31-38; João 15.18-25; 16.33; 2 Timóteo 3.12).

Esse testemunho de uma irmã em Cristo de um plano de fundo hindu ilustra esse ponto:

Quando eu me tornei uma cristã, havia algumas pessoas em minha área que começaram a me ensinar que eu deveria permanecer uma “cristã secreta” e não informar a ninguém sobre minha fé. Eles não queriam que eu fosse excluída da minha família. Portanto, eles me encorajaram a viver como uma “cristã secreta” para que eu pudesse permanecer dentro da minha família, esperando que eventualmente minha família e comunidade também chegassem a Cristo. Quando eu me mudei para uma área diferente para começar em um emprego, eu aprendi que esse tipo de ensino era seriamente errado. Eu encontrei grande liberdade em finalmente expressar minha fé em Cristo de forma aberta. Então, ousadamente contei aos meus pais e à minha comunidade. Eu lhes contei sobre Jesus e a obra que ele tinha feito em minha vida. Apesar de ter sido rejeitada e ostracizada no início, depois de dez anos, minha família começou a respeitar minha decisão de seguir a Cristo. Eles até foram ao meu casamento com um cristão na igreja!

Líderes de igreja na Índia como eu e meus companheiros indianos chamam as pessoas a serem seguidores de Cristo abertos e comprometidos, e a se colocarem sob a autoridade e o discipulado de uma igreja local. Em resposta, os proponentes da “contextualização” nos condenam por praticar “evangelismo de extração” (tomando indivíduos de suas famílias e comunidades) e por não “estimular o crescimento do movimento de pessoas”. Mas se eu me lembro corretamente, foi Jesus quem declarou que aqueles que o seguem seriam odiados por todos por causa do nome dele e que encontrariam inimigos entre aqueles de sua própria casa. Ainda assim, deveriam abraçar a Jesus e segui-lo com o custo de tudo isso (Mateus 10.34-39). O Novo Testamento nos diz que os cristãos são “peregrinos e forasteiros” que foram “rejeitados pelos homens”, mas que são “eleitos e preciosos à vista de Deus” (1 Pedro 2.4-11). Os crentes são chamados a levar o vitupério de Cristo, saindo a ele “fora do arraial”.

iv. O que eles fazem quando isso não funciona

A ironia de tudo isso é que quando se trata de realmente ganhar pessoas para Cristo na Índia, os proponentes da “contextualização” falham drasticamente. Virtualmente, ninguém é ganho para Cristo, pois quando o evangelho não é claramente proclamado, não há poder para arrastar as pessoas das trevas para a luz. De fato, pouquíssimos indianos estão interessados em se unir a um movimento que parece, de todas as formas, o mesmo da própria religião deles, mas que simplesmente adere a um novo deus.  Um dos ocidentais que eu mencionei acima viveu na Índia por muitos anos e adotou todos esses costumes indianos, mas ninguém parece interessado em seu ensino.

E então, desesperados por algum tipo de sucesso, alguns desses grupos recorrem a táticas vergonhosas e duvidosas. Eles começam a entrar nas igrejas indianas estabelecidas que eles uma vez desprezaram. Dão alguma impressão de buscar comunhão com eles e tentam ganhar a confiança dos líderes da igreja nacional. E depois de abrirem seu caminho dentro da igreja estabelecida, eles começam a mirar em novos cristãos de um plano de fundo hindu, os quais recentemente abraçaram a Cristo – aqueles que são fracos e estão encarando perseguição e rejeição iminente, aqueles que estão aprendendo o custo de seguir a Cristo. Os proponentes da “contextualização”, então, começam a fazer uma lavagem cerebral nesses cristãos fracos e inexperientes, ensinando-os que eles estão sendo “ocidentalizados”. É dito a eles para não desistirem da sua identidade hindu: “Você não precisa ser um cristão – ao invés disso, seja um “hindu seguidor de Jesus”. É assim que muitos proponentes da “contextualização” encontram seus “convertidos”. Eu sei porque eu já vi isso acontecer várias e várias vezes. E eu conheço cristãos bebês na fé que caíram nessas armadilhas. Quando coisas assim acontecem, eu oro para que o Senhor venha a eliminar esses “ministérios”.

Seguindo em frente
Tudo bem. Talvez, ao ler esta postagem, vocês tenham sido levados a tratarem esse assunto mais seriamente. E agora? Como vocês podem prevenir o crescimento desses tipos de eninos falsos e destrutivos?

Por favor, sejam cuidadosos com quem vocês apoiam. A maioria desses obreiros ocidentais no campo tem sido financiados por igrejas ortodoxas, evangélicas e que creem na Bíblia. Elas ficariam completamente horrorizadas ao saber o que aqueles que elas apoiam estão fazendo no campo. Por favor, sejam cautelosos. Mantenham todos os missionários que vocês apoiam em uma rigorosa prestação de contas doutrinária e periodicamente chequem-nos para se assegurarem de que eles estão ensinando a verdade.
Sejam sempre cautelososos em revisar os valores e distintivos das agências missionárias e se recusem a apoiar qualquer agência missionária que advogue essas formas extremas de contextualização. A contextualização é necessária em qualquer esforço transcultural, mas cuidado com as formas de contextualização que ficam aquém do Cristianismo bíblico.
3. Se você está buscando ser um missionário, decida que você não irá ignorar as igrejas nacionais estabelecidas. Sempre que possível, faça parceria com líderes fiéis da igreja nacional para que você possa entender melhor a cultura e como o evangelho deve tomar forma naquela cultura. Eu sei que isso pode ser desafiador e, em muitos casos, as igrejas nacionais são corruptas, não saudáveis e não existentes. Mas se, de alguma forma, isso for possível, lute para achar irmãos nacionais fiéis e doutrinariamente sãos com os quais você possa fazer parceria. Posso lhe assegurar – eles existem. Se você está em um esforço pioneiro em que não há nenhuma igreja nacional, seja cauteloso em entender bem a cultura. Faça uma distinção entre aquelas formas de cultura que são religiosas e aquelas que não são. Não tenha receio de ensinar “todo o conselho de Deus” – o que significa ensinar as pessoas a abraçarem o Cristianismo como uma cosmovisão completa. Ensine-os a rejeitarem as práticas culturais que as Escrituras demandam e esteja certo de que toda a sua “contextualização” seja biblicamente amparada.


Por: Aubrey Sequeira

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