Por Bruce Ware
Hoje em dia, dentro da comunidade cristã, vemos uma tentativa de buscar nas Escrituras um suporte para a luta feminista. No entanto, quando o secularismo se adentra às portas de nossas igrejas, as Escrituras passam a ser manipuladas para afirmar aquilo que elas nunca querem dizer. No assunto do papel do homem e da mulher, há duas posições conhecidas e defendidas dentro da nossa comunidade cristã: o igualitarismo e o complementarismo. Basicamente, o igualitarismo defende que o homem e a mulher são iguais em todos os aspectos, sem distinção de papéis, enquanto o complementarismo reconhece as diferenças de desígnio entre homem e mulher na criação divina e seus papéis como complementares.
Temos visto nos Estados Unidos que as igrejas que cedem ao igualitarismo tendem a, posteriormente, ceder em suas posições quanto à liderança feminina e casamento homossexual, entre outras questões. Mas, como você irá perceber, o projeto divino para o homem e a mulher está não apenas no centro das nossas relações sociais, mas no centro do Evangelho e de nossa identidade. Acompanhe comigo enquanto estudamos como estas posições se definem e onde encontram suporte nas Escrituras.
IGUALITARISMO
Um Resumo Geral da Posição Igualitarista
Criação em Igualdade – Deus criou homem e mulher iguais em todos os aspectos. Gênesis 1.26,27 não faz distinção entre homem e mulher no fato de que ambos são feitos igualmente à Sua Imagem (i.e. igualdade ontológica), e a ambos é dada a responsabilidade de dominar Sua criação (i.e. igualdade funcional).
Desordem na Queda e Hierarquia – O pecado introduziu à ordem criada por Deus várias manifestações de desordem e relacionamentos corruptos. Entre os principais exemplos de corrupção está a introdução de uma hierarquia ilegítima entre homem e mulher. Gênesis 3.16 (a maldição da mulher) sugere que, por causa do pecado, a mulher teria uma disposição subserviente perante o homem, e o homem teria, na medida contrária, uma disposição à supremacia sobre a mulher. Assim, o relacionamento de igualdade entre o homem e a mulher, pretendido por Deus na criação, é agora degradado pela presença de uma tendência hierárquica pecaminosa e perigosa.
Igualdade Restaurada pela Redenção em Cristo – Gálatas 3.28 expressa a grande verdade de que, em Cristo, as bases falsas e pecaminosas da hierarquia entre o homem e a mulher foram abolidas; portanto, não há distinção legítima, no reino de Deus, entre homem e mulher. A igualdade entre o homem e a mulher é restaurada, a dignidade é dada de volta à mulher, e as atitudes servis são exigidas do homem e da mulher.
Razões Principais de Defesa da Posição Igualitarista
Evidência que o Desígnio do Criador Foi de Igualdade entre Homem e Mulher
Gênesis 1.26-27 – O homem e a mulher compartilham a mesma natureza humana, são feitos à imagem de Deus e recebem de Deus o mandado de dominarem a terra. Não apenas há igualdade de ser ou natureza entre o homem e a mulher, há também, mais importante ainda, igualdade de função ou tarefa: ambos devem dominar. Note que não é feita distinção para dar ao homem uma posição superior neste domínio.
Gênesis 2.18 – A mulher como “auxiliadora” é melhor entendida como uma que vem para completar (i.e. tornar completo algo que está incompleto). Então, longe de colocar a mulher como subordinada ao homem, ela mostra quanto o homem deve à mulher. Interessante notar que a palavra para “auxiladora” é usada mais frequentemente para se referir a Deus (que não é de maneira alguma subordinado a aqueles a quem ajuda) em Seu auxílio aos outros. O ponto aqui, então, é que o homem e a mulher precisam um do outro, e, por isso, são parceiros iguais no relacionamento, e não que a mulher esteja subordinada a ele.
Gênesis 2.22-24 – Eles são uma só carne, ou a mesma carne, indicando completa igualdade de pessoa
Gálatas 3.28 – Se o propósito de Deus através da redenção é o de abolir distinções falsas e pecaminosas que separem homem e mulher em classes ou em uma hierarquia, então este versículo deve ser entendido como um retorno ao que Ele havia desejado na criação, um desejo que foi distorcido pela Queda e pelo pecado, mas que agora é tornado real novamente em Cristo.
1 Coríntios 12.7-11 – Claramente, Deus distribui Seu dons ao Seu povo como Ele mesmo deseja, mas o gênero não é um fator determinante em Sua entrega de qualquer dom especial a uma pessoa. Homens e mulheres são igualmente recipientes de todos os dons de Deus (veja 1 Coríntios 11.5 para uma afirmação sobre uma mulher detentora do dom de profecia). Como a entrega dos dons espirituais de Deus é neutra, e já que Deus espera que Seus dons sejam usados na igreja, segue-se que homens e mulheres devem exercer igualmente seus dons na igreja.
Exemplos Bíblicos de Igualdade entre Homem e Mulher
Apesar da introdução da posição hierárquica entre os seres humanos com a Queda, há indicações de que Deus empenhava-se para destruir esta manifestação de pecado, e, no lugar disso, exibir relacionamentos igualitários neste mundo caído.
Liderança Feminina em Israel – Apesar de Israel ser largamente patriarcal (assim como a maioria das outras culturas do mundo atingidas pelo pecado na história e no tempo), Deus resolveu dar a Israel algumas expressões de liderança feminina. Exemplos: Miriã (Êxodo 15), Hulda (2 Reis 22) e Débora (Juízes 4-5), que foram profetizas, sendo Débora também juíza em Israel. Outros exemplos de mulheres que tiveram papéis proeminentes na formação espiritual e no desenvolvimento de Israel, mas não em papéis religiosos oficiais, foram Ester, Rute e Noemi.
A Mulher Ideal de Provérbios 31 – Este capítulo provê um elogio a esta mulher ideal que teme ao Senhor e que expressa serviço fiel a Ele por meio de negócios fora de casa, assim como provisão para o seu lar.
Participação Feminina no Ministério de Jesus – Há numerosos exemplos de mulheres que tiveram um papel significante no ministério de Jesus, papéis que, embora inaceitáveis na cultura da época, ainda assim demonstraram a completa aprovação da parte de Jesus por mulheres e seu desejo de ministrar. Alguns exemplos:
Lucas 8.1-3 – Mulheres que proviam financeiramente para o ministério de Jesus e até mesmo viajaram com ele, aprendendo dele enquanto ele ensinava de vila em vila, de cidade em cidade.
Lucas 10.38-42 – Maria foi elogiada por Jesus por assentar-se aos seus pés em vez de correr para ajudar a preocupada Marta com os cuidados da casa. Novamente, Jesus encoraja mulheres a vir aprender com ele tanto quanto a homens.
Mateus 15.21-28 e Lucas 7.36-50 – Mulheres a quem Jesus usou como exemplos de fé e amor.
João 4.39-42 – A mulher samaritana tornou-se a primeira evangelista entre os não discípulos de Jesus. Isso certamente indica que Jesus considerava mulheres capazes de ensinar a outros, pois um evangelista instrui os outros no ensino principal, o próprio evangelho de Cristo.
Mateus 28.1-10 e Marcos 16.1-8 – Certamente, Deus é capaz de escolher aqueles que Ele deseja que descubram primeiro e contem aos outros sobre a ressurreição de Jesus. Quem deveria ser este grupo privilegiado? Quem foram as primeiras testemunhas da ressurreição de Jesus? Os evangelhos de Mateus e Marcos dão nomes de mulheres (Maria Madalena, Maria, mãe de Tiago, e Salomé) que foram à tumba e a encontraram vazia, e receberam do anjo a ordem de ir e contar o que elas agora sabiam aos discípulos e a Pedro (Marcos 16.7). Deus escolheu mulheres, ao invés de Pedro ou qualquer um de seus discípulos, para ser as primeiras testemunhas da ressurreição de Jesus. Isso novamente indica a total confiança de Jesus no papel das mulheres de compartilhar com as pessoas a mensagem mais importante.
Mateus 28.18-20 e Atos 1.8 – Evangélicos universalmente compreendem a comissão cristã de dar testemunho do poder do Espírito e fazer discípulos como uma ordem que se aplica a todos os seguidores de Cristo. Logo, a proclamação do evangelho como ordenada por Cristo não é específica para um gênero.
Envolvimento Feminino na Igreja Primitiva
Atos 2 (especialmente v.17,18) – Homens e mulheres são recipientes do Espírito Santo.
1 Coríntios 12 – Como dito acima, homens e mulheres são recipientes dos dons do Espírito Santo e ordenados a usá-los na igreja (v.7).
1 Coríntios 11.5 – Aqui se faz menção de mulheres na igreja que estavam “profetizando”, claramente um dom de fala usado para instruir e edificar os participantes da igreja (de acordo com Atos 21.9).
Atos 18.26 – Priscila (mencionada primeiro) e Áquila tomaram Apolo consigo e, “com mais exatidão, lhe expuseram o caminho de Deus”. Priscila, então, estava exercendo um dom de ensino e instruindo um homem, que também era um professor (conforme Romanos 16.3-5).
Romanos 16.1-7 – Paulo recomenda duas outras mulheres (além de Prisca, no verso 3), Febe, que é uma serva, talvez diaconisa, na igreja, e Júnias, que (se de fato uma mulher) era considerada “notável entre os apóstolos”.
Objeções e Respostas à Posição Igualitarista
Objeção: A estrutura política e religiosa de Israel exibe uma liderança quase que exclusivamente masculina, e isto por ordem e chamado divinos. Por exemplo, Adão, Noé, Abraão, Isaque, Jacó, os doze filhos de Jacó como doze tribos de Israel, sacerdotes masculinos, com foco nos filhos primogênitos, reis homens (exceto Atalia, uma vil usurpadora do trono).
Resposta: Isso reflete, primariamente, a cultura patriarcal da época. Assim como Deus tolerava a poligamia e até mesmo introduziu leis que a regulassem, apesar de Seu propósito monogâmico na criação, ele tolerava o patriarcado, mostrando Sua desaprovação através das mulheres que foram levadas à posição de liderança em Israel apesar da supressão cultural das mulheres.
Objeção: Você diz que Jesus quebrou as expectativas e normas culturais ao permitir que mulheres participassem com Ele em seu ministério e no testemunho do evangelho. Por que, então, Ele não quebrou as mesmas convenções e chamou algumas mulheres como suas discípulas? Sua escolha de um grupo de discípulos totalmente masculino vai de acordo com a tradição de liderança masculina que encontramos por todo o Antigo Testamento.
Resposta: Jesus continuou com o processo de restauração da mulher ao seu lugar de igualdade plena, um processo que continuou na igreja primitiva (ver Gálatas 3.28 e 1 Coríntios 12). Jesus sabia que poderia quebrar com a tradição apenas até certo ponto, de maneira que lhe permitisse, ainda assim, a oportunidade de ensinar e viajar com a frequência que fazia. Um caso paralelo pode ser visto quando Paulo deixa de denunciar a escravidão, por mais que ele a visse como contraditória à liberdade do Evangelho.
Objeção: Paulo diz que as mulheres devem submeter-se aos seus maridos. Como ele pode fazer isso de maneira justa se, como você diz, ele havia declarado a hierarquia como resultante do pecado e abolida em Cristo?
Resposta: É interessante notar que o tratado completo de Paulo sobre maridos e esposas (Efésios 5.22-33) é introduzido com uma afirmação transicional em 5.21, que diz “Sujeitando-vos uns aos outros no temor de Cristo.” O que se segue a esse verso, então, não pode ser tomado como contraditório a este claro comando de que os cristãos devem se submeter uns aos outros. O que, então, ele quer dizer em 5.22? Ele dá este conselho como um exemplo do tipo de submissão que deve ocorrer de modo mais geral entre todos os cristãos. O propósito deste texto é ilustrativo, e não deve singularizar as mulheres como submissas aos seus maridos.
Objeção: Quando Paulo diz que o homem (1 Coríntios 11.3) ou o marido (Efésios 5.23) é o cabeça da mulher, ele não quer dizer que o homem tem a posição de autoridade e responsabilidade sobre a mulher?
Resposta: Não, e isso pode ser percebido ao olharmos para a palavra traduzida como “cabeça” (do grego: kephale). Este termo é largamente usado na literatura grega extra-testamentária como “origem” (assim como a cabeceira/origem de um rio). Logo, o que isso quer dizer, então, é que a mulher deve sua existência ao fato de que o homem foi criado primeiro, e, em seu estado incompleto, Deus fez a mulher a partir dele. Assim, a mulher é “originada” do homem. Desta maneira, a palavra não sugere, como muitos pensam, que o homem tem alguma autoridade justa sobre a mulher.
Objeção: Quando Paulo diz em 1 Timóteo 2.11-15 que as mulheres devem aprender em submissão e não ensinar ou exercer autoridade sobre o homem, e que isto deve ser assim por causa da ordem da criação e da Queda de Eva no pecado, não requer que mulheres devam estar em um relacionamento de subordinação na igreja, com apenas homens qualificados ensinando ou pregando?
Resposta: Esta compreensão tradicional erra porque trata uma instrução específica de Paulo a uma igreja em particular como instrução normativa para todas as igrejas em todas as épocas. Há evidência que a igreja de Éfeso, pastoreada por Timóteo, estava permeada de ensinos falsos, e que este ensino vinha primariamente de mulheres na igreja que usurpavam autoridade e ensinavam erroneamente a doutrina da criação e do pecado de Adão e Eva. Se este é o caso, então devemos ver este caso não como uma proibição de todo e qualquer ensino feminino na igreja, mas como uma proibição direta a estas certas mulheres na igreja de Éfeso que eram falsas mestres.
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