Por Paulo Ulisses
[…] levando cativo todo o entendimento à obediência de Cristo (2 Coríntios 10.5).
O uso do termo “cosmovisão” tem sido muito utilizado ultimamente, principalmente no meio cristão. A efervescência de assuntos que orbitam em torno de ideologias e filosofias trouxe a lume, ou pelo menos de volta à agenda das discussões, essa palavra que acreditamos ser altamente relevante. Porém, nossa observação do cenário atual também tem percebido a forma como as pessoas encaram o estabelecimento de uma cosmovisão cristã para a saúde da igreja e de cada individuo que professa a fé em Cristo.
É muito comum ouvir pessoas, em uma conversa, dizerem: “falando como pessoa, não como cristã”, ou: “vendo a coisa pela ótica secular…”. A grande pergunta é: existe de fato um espaço em que podemos nos “desfazer”, ainda que momentaneamente, de nossa concepção cristã quanto a observação do mundo ao nosso redor? Será que há uma forma de opinar sobre este ou aquele assunto sem que estejamos sendo influenciados pelo que fala a Escritura? Seria isto errado?
No texto em que destacamos, Paulo afirma que a forma de destruir “conselhos” e “fortalezas”, não é nos munindo de armas carnais, mas sim, levando todo o entendimento à obediência a Cristo. Quando Paulo usa a figura de fortalezas e conselhos, ele se vale de um exemplo esporádico, para mensurar o poder da ação de submissão à Cristo contra forças contrárias, embora saibamos que estas figuras possuem correlatos na realidade, por exemplo, quando pensamos no reino parasita (Satanás e seus anjos), que influenciam o mundo a pecarem e se manterem pecando e se rebelando contra Deus.
O apóstolo é enfático em estabelecer que os meios que temos para vencer esta guerra não são “carnais”. Aqui, este termo aponta não para a substância dessas armas, mas para o local de origem das mesmas. O que ele tem em mente é que os meios que o cristão possui para se opor ao sistema mundano anticristão não são deste mundo.
É válido agora perceber o que Paulo está combatendo especificamente. Tanto as fortalezas quanto os conselhos estão em oposição ao conhecimento de Deus, algo que para Paulo é profundamente relevante, pois, como vemos em outras passagens, é por conhecer a Deus que o pecador é salvo pela graça mediante a fé em Cristo Jesus. E essa informação se encaixa perfeitamente com o propósito das Escrituras, que são a autorrevelação de Deus; o enredo de história da redenção que conta os atos redentivos de Deus desde a antiguidade. Como dito, para o apóstolo, o único modo de fazer frente a essa tentativa infernal é levar o nosso entendimento cativo em obediência ao senhorio de Cristo, e é sobre isso que desejamos discorrer.
Como o próprio nome sugere, “cosmovisão” é o modo de ver o mundo, as lentes que, carregadas de nossos pressupostos, analisam o mundo e emitem um juízo de valor sobre determinadas coisas. Mesmo coisas universais como estética e ética, são coordenadas pelos pressupostos tanto de um grupo de pessoas (sociedade) quanto de um indivíduo. Os pressupostos da fé cristã são estabelecidos pela única regra de fé e prática que a igreja possui: a Bíblia Sagrada.
É dela que extraímos todo o bojo de informações que compõem nossa opinião acerca do mundo e tudo o que há nele. Quando falamos em informações, temos em mente que a Bíblia não é um livro meramente propositivo, ou seja, que contém apenas ordens quanto ao que se deve fazer e o que não se deve, mas que, embora haja partes propositivas, ela é composta (um terço) de histórias que apontam para o desenrolar da história da redenção. E também dessas, à luz de toda a revelação, podemos ver como o SENHOR agiu no passado, como age no presente, e como a história se concluirá no futuro, no estabelecimento do novo céu e da nova terra, além de que cada parte desta história escrita deve ser aplicada para nosso contexto, servindo assim de edificação para a igreja de Cristo.
Através do que a Bíblia nos diz, podemos construir opiniões sobre o que Cristo requer de nós como seus servos/filhos, e agir neste mundo de forma que possamos glorificar seu nome. A grande dificuldade dos crentes é confiar nos pressupostos construídos a partir da Escritura. Há uma tendência de sempre nos valermos de uma opinião dupla (cristã e secular) para emitir uma ideia ou juízo sobre determinada coisa.
Para que um cristão possa opinar sobre o que quer que seja, ele não precisa se desfazer ou abrir mão de seus princípios e valores, para que então aquela visão seja encarada ou pelo menos levada em consideração numa discussão. Quando o tema é aborto, não é preciso se esconder atrás de uma opinião secularizada (livre das influências da minha religião); pelo contrário, sabendo que os princípios estão baseados no que fala a Escritura, pode e deve opinar sobre tudo.
Quando titubeamos em afirmar que determinada coisa é errada por ser essa opinião pautada em princípios bíblicos, estamos declarando que a verdade contida nas Escrituras ou é questionável, ou não é abrangente o suficiente para gerir a questão.
Voltando ao texto do enunciado, o senhorio de Cristo rege todas as coisas. Como coloca a famosa frase do político, jornalista, estadista e teólogo holandês Abraham Kuyper: “Não há um único centímetro quadrado, em todos os domínios de nossa existência, sobre os quais Cristo, que é soberano sobre tudo, não clame: “É meu!“”.
Se o senhorio de Cristo está sobre tudo, sua palavra nos mune das armas necessárias para combater os princípios distorcidos e corrompidos que estão a todo momento sendo disseminados e propagados pelo mundo inteiro. O retrato disso é a mídia. Algumas emissoras de televisão são incisivas em defender e promover a agenda ideológica marxista/comunista, e fazem isso às vezes sútil e/ou grotescamente. O interessante é perceber que, por muitas vezes, os cristãos que deveriam retirar das Escrituras o modo como enxergam o mundo (cosmovisão) se deixarem enredar pelos valores mundanos e os defenderem com unhas e dentes, não sabendo que estão proclamando a bandeira do que Paulo colocou no texto como “fortalezas e conselhos” que se levantam contra o conhecimento de Deus.
Nas Escrituras, não há um meio termo entre o reinado de Cristo e a rebelião do mundo. Ou você está de um lado da trincheira ou está do outro, porém, saibamos que ambos os lados jamais entrarão em algum tipo de armistício ou trégua. Logo, ou militamos por um lado contra o outro, ou o contrário. Entretanto, se estivermos com Cristo, nosso entendimento e visão de mundo devem estar de acordo com as Escrituras.
O certo é o certo não porque o achamos certo, ou por nos terem dito que era certo, mas porque as Escritura nos mostra que é o certo. O errado não é errado porque alguém disse que era errado, mas porque é condenado pelas Escrituras. Se da palavra de Deus não extraímos nossa percepção de como as coisas são, pouco a pouco estaremos manifestando algum tipo de opinião diametralmente oposta aquilo que consta na Sagradas Letras, e por mais que achemos isso um exagero, o mundo é sútil e altamente astuto em causar esse efeito.
Perceba, por exemplo, o modo como séries e filmes tendem a distorcer nossa opinião sobre determinada coisa. Em determinado momento, um casal aparece no filme/série. Seu relacionamento não está muito bem, pois o marido parece não amar mais sua esposa, e não a trata muito bem. Nesse momento, um terceiro personagem surge na trama – um galã. Alto, bonito, educado, um perfeito gentleman, que se apaixona pela mulher. Poucos instantes depois, nós estamos torcendo para que a mulher fique com o galã; mas sem perceber, estamos torcendo por um adultério.
Nosso pensamento deve estar cativo à Cristo, pois Ele, como Rei e SENHOR de todas as coisas, estabelece seu reino sobre os princípios que refletem seu Ser: justiça, equidade, santidade, amor, retidão, etc. Como cristãos, nossa submissão à sua palavra é a base sobre a qual construiremos nossa cosmovisão. Dessa forma, estaremos aptos a testemunhar de Cristo no mundo, nos opondo a tudo aquilo que fere os valores bíblicos.
Assim, quando nossa ótica está alicerçada nas Escrituras, os juízos de valor que emitimos refletem o pensamento cristão com fidelidade, e passamos a agir como verdadeiros embaixadores de Cristo.
Não, não há um espaço onde possamos nos abster de proclamar os princípios de nossa fé, pois, como vimos, não há um espaço onde Cristo Jesus não reine. Se Cristo é o nosso SENHOR e Salvador, se temos a Escritura como Palavra de Deus, não há como pronunciar um juízo que não seja influenciado pela mesma, e jamais devemos ver isso como algo ruim, pois é exatamente desta forma que as coisas devem ser – devemos refletir todo o conselho de Deus em nossas ações e, principalmente, em nossa cosmovisão.
Que possamos nos nutrir das verdades contidas na Palavra de Deus, para que combatamos as fortalezas e conselhos que se levantam contra o conhecimento de Deus, e isso tendo nossa mente cativa à Cristo, certos de que nossos valores e princípios são os valores e princípios do Reino.
Cristo triunfa!
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