Semeando o Evangelho

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segunda-feira, 14 de janeiro de 2019

REDESCOBRINDO SANSÃO: DESFAZENDO UMA CARICATURA (PARTE 4)

A queda de Sansão (Juízes 16:4-21)

Conquanto a Escritura não forneça detalhes importantes do ministério de Sansão [exceto a vitória no massacre dos mil filisteus, com o maxilar de um jumento, e o episódio em Gaza, onde arrancou o portão da cidade], pela cronologia dos fatos inferimos que ele cumpriu fielmente sua gestão de 20 anos como juiz em Israel (para mais informações, veja Juízes 15:20; 3-19; 16:1-3). Foi neste tempo que Sansão manifestou a fé descrita em Hebreus 11:32-34.

Os dois últimos anos da vida de Sansão retratam sua queda (16:4-27). Porém, é um tempo relativamente curto, quando comparado ao período de sua obediência e restauração [que veremos na quinta parte], pouco antes da morte, com 52 anos (16:22-30).

Dalila, o amor de Sansão (v. 4-5)

Cerca de 9 anos depois do acontecimento em Gaza, a história informa que Sansão se envolveu amorosamente com uma mulher chamada Dalila, que residia no vale Soreque.

Quando souberam da conexão entre Dalila e Sansão, os líderes dos filisteus [cinco homens (3:3), os quais governavam as cinco maiores cidades filisteias] traçaram um esquema ardiloso: propuseram a Dalila que manipulasse Sansão na expectativa de que ele revelasse o segredo de sua força – e assim pudessem apanhá-lo. A recompensa oferecida a Dalila pelos chefes dos filisteus, em troca da informação, foi 1.100 moedas de prata, cerca de 65 quilos no total. Decerto, um valor consideravelmente generoso para um suborno, que deveria compensar o perigo que Dalila estava suscetível, caso o plano de traição falhasse.

Sansão tornou-se um homem “respeitado” pelos filisteus. Eles não ousavam mais se aproximar dele enquanto não descobrissem o segredo de sua força. Sansão, naquele momento, era considerado uma ameaça nacional. Por isso os cinco líderes filisteus interviram diretamente na situação.

Embora o redator de Juízes não mencione a nacionalidade de Dalila, isto é, se era ou não filisteia, muitos estudiosos têm assumido que sim. Outros, por causa do “contexto”, também afirmam que Dalila era uma prostituta “profissional”. Todavia, é provável que Dalila não fosse filisteia nem prostituta. Existem três fatos que contestam esta interpretação popular e demonstram que ela poderia ter sido uma israelita.

Dalila morava no vale de Soreque, que cruzava os planaltos rochosos de Sefelá, localizado entre Ascalom e Gaza, perto de Zorá, que ficava ao norte [onde a Tribo de Dã, Sansão e os pais residiam], e Timna, ao sudeste, perto da entrada do vale. Mesmo relutando, Sansão confiou em Dalila, ao revelar o “segredo” de sua força, que não estava necessariamente em seu cabelo, que não podia ser cortado, mas na observância das regras do seu nazireado (v. 6-17; Números 6:1-21; Juízes 13:2-5). O cabelo longo era apenas uma marca que destacava Sansão como um servo de Deus; sua força vinha do Espírito do Senhor.
Na festa de casamento, Sansão também resistiu [inicialmente] em contar à sua noiva o segredo do enigma que havia proposto. Traído pela “mulher”, dificilmente Sansão voltaria a confiar em outra “filisteia” (veja 14:10-20). Entretanto, se Dalila fosse israelita, compatriota de Sansão, alguém que “servisse” ao mesmo Deus que ele, o quadro seria diferente. A história ressalta, no versículo 4, que Sansão se apaixonou אָהַב (ahebh) por Dalila, mas não diz que ele também se apaixonou pela noiva; é mencionado que ele simplesmente “gostou” יָשַׁר (yasar) dela (14:3). Sansão “amou” Dalila profundamente. E o fato de ser uma israelita [“teoricamente confiável”] pode ter colaborado para que ele decidisse revelar seu maior segredo (16:17).

O território filisteu, composto pelas cidades de Asdode, Ascalom, Ecrom, Gaza e Gate, possuía uma economia bastante significativa. Foi um povo relativamente abastado. Em contraste, Israel, na época de Sansão, estava colapsada pelo relativismo (17:6; 21:25). Devido à sua apostasia, a nação ruiu em profunda decadência moral, social, política e econômica.
Presumindo que Dalila fosse uma israelita pobre, o valor [não muito alto, mas considerável] que os cinco governantes filisteus ofereceram pelo trabalho aleivoso seria bem mais “tentador”, caso ela não fosse uma mulher financeiramente estável.

Sansão já havia sido traído por sua noiva; os filisteus sabiam disso. E tentar descobrir o segredo de sua força, por meio de outra mulher filisteia, não seria algo muito fácil. A probabilidade deste plano fracassar era maior. Contudo, se Dalila fosse israelita, uma mulher que estava dentro do “círculo interno” de Sansão [como Judas Iscariotes esteve no de Jesus], os filisteus poderiam se aproveitar desta circunstância e usá-la para empreender o plano de traição. E foi exatamente o que aconteceu.
Afinal, esse argumento corrobora a interpretação de que Dalila podia ter sido uma israelita, talvez da tribo de Simeão, Aser, Dã ou Judá, ambas dominadas pelos filisteus. Se Dalila era uma israelita de nascimento, com efeito tornou-se uma filisteia de coração. Ao identificar-se com os filisteus, ela passou a ser contada como uma deles. Outrossim, mesmo que Dalila não fosse tecnicamente uma prostituta “profissional”, seu papel na lesiva trama contra Sansão a transformou em uma.

A conspiração dos filisteus desempenhada por Dalila (v. 6-14)

Por conta da brevidade do relato, não é possível sabermos com exatidão a qualidade do vínculo que Sansão e Dalila tiveram; possivelmente uma relação limitada ao sexo casual, intensa, que durou quase dois anos.

O plano de traição foi um processo relativamente “bem” executado por Dalila. Mesmo assim, foi difícil persuadir Sansão a revelar sua fraqueza. As investidas de Dalila contra Sansão [resumidas no texto] não fazem parte de uma mesma cena, e sim de quatro ocasiões distintas, que podem ter durado meses.

Todavia, a curiosidade plácida de Dalila não fez com que Sansão desconfiasse de que algo “errado” estava realmente acontecendo. Por quê? Seguem, abaixo, seis opções:

Sansão era ingênuo, de tal modo que não entendeu a circunstância.
Convencido de sua força, sem nenhum temor, Sansão era arrogante.
Sansão era ingênuo e concomitantemente arrogante.
Apaixonado e resoluto a não perder Dalila, Sansão “ignorou” o que estava nítido – uma cilada!
Talvez por ter sido uma israelita, Sansão confiava absolutamente em Dalila.
Como “namorados” ou “amantes”, Sansão pode ter interpretado as tentativas de Dalila como brincadeiras jocosas.
Pessoalmente, acredito que a primeira, a quinta e a sexta alternativa expressam o verdadeiro motivo de Sansão não ter suspeitado da intenção de Dalila. Ele foi tolo ao revelar seu maior segredo a uma mulher que não conhecia o bastante.

Em contrapartida, o episódio da queda de Sansão pode ser dividido em quatro etapas que são desenvolvidas progressivamente. Vejamos, pois:

Sutileza (v. 6-9)
Dalila pede a Sansão que lhe conte o inextricável segredo que o faz ser tão forte, e como poderia ser amarrado e dominado. Sansão responde que, se fosse amarrado com sete cordas de arco novas, ainda úmidas, perderia sua força, tornando-se, assim, um homem comum.

Tendo informado aos cinco governantes filisteus a suposta “fraqueza” de Sansão, alguns soldados levaram para Dalila sete cordas de arco novas e se esconderam no recôndito da casa, para, no momento oportuno, capturarem Sansão. Após Dalila o amarrar, grita que os filisteus estavam invadindo a residência para atacá-lo. Imediatamente, sem esforço algum, Sansão arrebenta as cordas e nulifica a primeira tentativa infame de Dalila. Portanto, os filisteus não conseguiram descobrir o segredo da força de Sansão.

A trama perniciosa de Dalila inicia-se com uma singeleza notável! A curiosidade liminar não esconde seu objetivo. Ela segue rigorosamente as instruções dos filisteus (v. 5). Mas, pela “ótica” de Sansão, a clareza de Dalila pareceu um mero gracejo. O erotismo e a ternura de Dalila confundiram o entendimento de Sansão.

Tenacidade (v. 10-12)
O fracasso do primeiro ato de Dalila no embuste contra Sansão produziu uma segunda tentativa. Algum tempo depois, em outra cena amorosa, Dalila insiste para que Sansão fale a verdade sobre como poderia ser amarrado. Ele diz que, se fosse amarrado firmemente, com cordas novas, enfraqueceria.

Os cúmplices de Dalila não sabiam ou tinham esquecido que os homens de Judá – no episódio que precedeu o massacre de mil homens com o maxilar de um jumento – tentaram amarrar Sansão da mesma forma, com cordas que nunca haviam sido usadas (veja 15:11-13). Pode ser que a lembrança deste acontecimento tenha influenciado a segunda fala de Sansão.

Por conseguinte, Dalila amarra Sansão outra vez. Como antes, soldados estavam escondidos no interior da casa. Então, Dalila grita que os filisteus estavam vindo para atacar Sansão. Porém, sem nenhuma dificuldade, ele arrebenta as cordas de seus braços e neutraliza a segunda ação de Dalila.

Exasperação (v.13-14)
Afoita para concluir o maléfico plano dos filisteus e receber o pagamento, Dalila se irrita, afirmando que Sansão foi debochado e mentiu para ela. Contudo, ele declara que, se Dalila entrelaçasse as sete tranças do seu cabelo sobre o pano de um tear [prática comum naquele tempo, e em várias nações], perderia sua força. Assim, Dalila esperou Sansão adormecer para “cruzar” suas tranças no pano do tear e prendê-las com um pino.

Mais uma vez, Dalila grita que os filisteus estavam invadindo sua residência para atacar Sansão. Despertando do sono, ele arranca o pino e o tear que prendia seus cabelos e anula a terceira tentativa de Dalila.

Sansão ainda pensava que as três investidas de Dalila eram simples “brincadeiras” chistosas. Não obstante, se ele tivesse visto os filisteus escondidos no recôndito da casa, entenderia que tudo aquilo fazia parte de uma armação.

Manipulação (v. 15-17a)
Via de regra, houve um lapso de tempo considerável desde o fracasso precedente. Dalila fez Sansão acreditar que o interesse em querer descobrir o segredo de sua força era algo trivial. Doravante, ela muda sua tática. Como Sansão estava inelutavelmente apaixonado, Dalila utiliza a chantagem sentimental como arma para coagi-lo a falar. Tendo sido atormentado por vários dias, com a mesma pergunta: “Como você pode dizer que me ama, se não é verdadeiro comigo?”, Sansão, extremamente angustiado, revela sua fraqueza a Dalila.

O segredo de Sansão é descoberto (v. 17b-20)

Sansão diz a Dalila que seu cabelo nunca havia sido cortado, pois era um nazireu, escolhido pelo Senhor antes mesmo de ser concebido. E, para que enfraquecesse, tornando-se um homem comum, seus cabelos precisavam ser cortados. Reiterando, a força de Sansão não estava no cabelo [que era apenas um símbolo que enfatizava sua posição de “servo”], mas em Deus.

Ao revelar o segredo de sua força a Dalila, Sansão não apenas foi desobediente, violando uma das regras do seu status de nazireu, mas rejeitou seu papel como servo de Deus.

Ora, percebendo que desta vez Sansão tinha falado a verdade, Dalila prossegue com o logro. Como os filisteus haviam desistido do plano [após três tentativas nulificadas] e se retiraram da casa, Dalila instou que eles voltassem para lhe pagar e concluir a trama.

Tendo feito Sansão dormir com a cabeça em seus joelhos, Dalila, sutilmente, chama um dos filisteus que estava escondido na residência para cortar suas sete tranças; consequentemente, Sansão enfraqueceu.

Finalmente, Dalila grita que os filisteus vieram atacar Sansão. Acordando, disse para si mesmo que se livraria deles como nas outras circunstâncias. Sansão, entretanto, não sabia que o Espírito do Senhor havia se retirado dele, porque abandonou o seu ministério de juiz e rompeu o seu voto com Deus, quando se envolveu numa relação pecaminosa com Dalila.

A ruína de Sansão (v. 21)

O preço que Sansão pagou por sua desobediência ao Senhor custou seus olhos e a humilhação de ser escravizado por seus inimigos, em Gaza. “Os filisteus cegaram Sansão para que, caso sua força voltasse, ele não seria capaz de lutar”.30 Destarte, com os pés e as mãos presos, Sansão trabalhou obrigado na fastidiosa tarefa de moer trigo, em um moinho manual. Esta ocupação era subserviente, doméstica e invariavelmente designada às mulheres e escravos.

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